Getting your Trinity Audio player ready...
|
¨Você só terá sucesso se trabalhar com o que te deixa feliz. Se não, esqueça qualquer recomendação depois dessa¨. O conselho, franco e direto, reflete bem o estilo de João Ribeiro, vice-presidente global de Contabilidade Estatutária da Dell. Ele foi o mentor convidado pelo IBEF Jovem para o encontro de mentoring realizado no dia 11 de junho.
Casado, pai de três filhos, e aos 53 anos de idade, Ribeiro explica porque esse é o seu conselho n° 1 para a carreira. ¨Vocês planejam se tornar executivos de alto nível – e essa vida não é fácil¨, advertiu. ¨Se não fizerem algo que dê vontade de levantar pela manhã e ir trabalhar, começarão a usar todas as desculpas do mundo: não gosto do meu chefe, não gosto do meu colega, não gosto da minha cadeira… Mas se trabalharem com o que gostam, encontrarão maneiras de chegar lá¨.
O currículo de Ribeiro falar por si. Antes de assumir a atual posição global na multinacional de computadores, ele foi CFO da Dell EMC Brasil, liderando uma equipe de mais de 180 pessoas. Também foi CFO da Phillips Consumer Eletronics para a América Latina, além de ter liderado a área de finanças na HP Brasil e na Itautec. Ele é membro da Diretoria Vogal do IBEF-SP, associado do IBEF-RS e Diretor da ONG Junior Achievement Brasil. É formado em Contabilidade pela Universidade Federal do Espírito Santo, com pós-graduação em Finanças pela Fundação Getúlio Vargas-SP e Executive MBA pela Business School São Paulo.
Leia a seguir um resumo dos principais conselhos do mentor:
1) Faça o que você gosta. Quem manda na sua carreira é você!
Ribeiro compara a trajetória profissional a uma caminhada. Para avançar rápido é preciso ter o objetivo claro desde o início. “Eu sou um sobrevivente. Poderia dar tudo errado: venho de uma família humilde, moramos em uma favela em Vitória (ES), tive todas as chances de me tornar um “cara da favela”. Mas consegui sair lá na frente porque estudei bastante, era um aluno muito dedicado”, conta o executivo.
Seu pai não dominava as letras, mas era um homem sábio e sempre incentivou o filho nos estudos. “Meu pai queria que eu fosse médico. Minha mãe, engenheiro. Parecia impossível, porque eu não tinha dinheiro”, lembra. “E quando fui fazer a escola de segundo grau, conheci e gostei da área de Contabilidade. E falei para mim: vou terminar o colegial e estudar no curso à noite na Universidade Federal do Espírito Santo. Vou trabalhar e estudar. Então, eu chequei e validei isso – descobri que é de finanças que eu gosto mesmo. E investi muito nessa carreira”.
O gosto pela área financeira embalou a ascensão meteórica: ele entrou na Philips em 1985, no menor nível da área administrativa, trabalhando na filial de vendas capixaba com outras seis pessoas. 23 anos depois, saiu da multinacional como CFO da área de consumer eletronics, o maior negócio da empresa no Brasil e na América Latina.
Sempre há tempo de corrigir o rumo, mas existe um preço – “Convivi com muita gente melhor do que eu. Olhava para alguns colegas e pensava: Eles irão longe! Mas eles ficaram pelo meio do caminho. Porque não haviam entendido que deveriam trabalhar com aquilo que gostavam. E eles não gostavam do que faziam”, conta Ribeiro.
Se você chegou no meio da caminhada e concluiu que está na direção errada, o melhor a fazer é corrigir, ressalta o mentor. “Mas lembre-se que pagará um belo preço: já perdeu tempo e vai ter que começar de novo. Esse é o grande risco de não definir bem o que você quer desde o início. Como chegar lá, você vê depois; o importante é ter certeza do seu objetivo”.
2) Seja o melhor naquilo que estiver fazendo agora, com o conjunto certo de valores.
Para Ribeiro, a melhor maneira de ser promovido é: seja o melhor. “Alguém vai perceber e falar: esse profissional faz tão bem esse trabalho, que ele pode assumir a próxima função¨. No passado, ser o melhor na função era algo muito associado ao conhecimento técnico (hard skills), lembra o executivo. Hoje em dia, não é só isso. “Conhecimento técnico continua muito importante, mas é só o ticket de entrada; se você não o tiver, nem está no jogo. O diferencial, a partir daí, é quando você começa a agregar um outro conjunto de características, que são os valores”.
Dentre esses valores, o mentor destaca: integridade, humildade e confiança. “O Brasil é um dos países mais corruptos do mundo, infelizmente. Se você não agir com integridade hoje, ser uma pessoa ética, você não terá espaço nas empresas sérias”.
Com relação à humildade, Ribeiro afirma que o profissional deve reconhecer seu limite e saber quando precisa da ajuda dos outros; bem como estar disposto a assistir quem precisa. “Um executivo na minha função tem o dever de ajudar quem está começando, sem pedir nada em troca. É natural”.
A confiança é outro valor essencial. “Hoje eu tenho gente na China, nos Estados Unidos, em vários países da Europa e da América Latina. Então, se eu não confiar nessas pessoas, e elas, por sua vez, olharem para mim e não sentirem confiança, não conseguiríamos fazer nada”.
Cada empresa tem seu próprio conjunto de valores, e o profissional também deve ter, enfatiza Ribeiro. “Assim você consegue discernir: essa companhia é para mim ou não é para mim. Esse chefe é para mim ou não é para mim”.
3) Defina o que você quer para o futuro e planeje os próximos passos.
Trabalhar cada etapa da carreira é necessário, observa Ribeiro, assim como estar aberto a mudanças. “Não adianta você se estressar hoje sobre o que acontecerá em dois anos. É perda de tempo. Até lá o mundo mudou, o cenário é outro¨, disse, reforçando que o importante é trabalhar pelo objetivo.
Sobre a experiência internacional, o executivo ressalta que a fronteira é imposta pelo profissional, e não pela empresa. “Já conversei com várias pessoas muito boas, que queriam crescer, mas não estavam dispostas a trabalhar em outro país. Não digo se é certo ou errado, mas eles se limitaram. Mesma coisa o idioma: você quer trabalhar numa multinacional, mas só fala português. Limitou-se de novo, e há um preço a pagar por isso”, completa Ribeiro, ao notar que saber falar o idioma nativo e inglês já não é mais diferencial no mercado – e os jovens devem considerar aprender mandarim, tendo em vista o potencial da China ser a próxima cultura dominante no mundo.
4) Invista tempo para fazer networking (dentro e fora da empresa).
Ribeiro destaca que boa parte de sua agenda é destinada a encontrar pessoas, especialmente agora, que tem times em vários países. ¨Falo com profissionais jovens e experientes, de diferentes regiões do mundo. Você tem que estar aberto para falar com as pessoas, conhecê-las e se expor”.
Para esses momentos, o executivo dá outra dica: preparar um bom elevator pitch ao fazer sua apresentação pessoal. “Muitas vezes uma pessoa entra na minha sala e pede para ter um one-on-one comigo. Reservo espaço na agenda e, quando nos reunimos, o ela não tem nada a dizer. Ela perdeu o tempo dela e eu perdi o meu. Não façam isso com os seus chefes, nem com seus líderes, nem com vocês mesmos: é exposição negativa. Você precisa ter algo interessante a dizer ”.
Ribeiro destaca que uma conversa de poucos minutos, dentro de um carro, com o CFO global da empresa, na qual comentou sobre um projeto inovador feito na filial do Brasil, gerou exposição positiva que o ajudou a chegar na cadeira global em que senta hoje. “Se eu não estivesse preparado, poderia ter falado alguma besteira e não conseguir essa oportunidade”.
Além de fazer networking dentro da empresa, o profissional deve também fazer networking fora dela. E, nesse sentido, João Ribeiro destaca: “Hoje, para CFOs, não há lugar melhor para se estar do que o IBEF”.
5) Gaste tempo de qualidade na sua educação e aprendizado.
Em uma época extremamente conectada, o simples acesso à informação já não é um diferencial, observa Ribeiro. Para manter-se relevante, o profissional deve investir em conhecimento e educação com foco no que é importante.
Ele destaca que um executivo dificilmente ocupará uma única função dentro da empresa, e precisará agregar novos conhecimentos à medida que sobe na hierarquia. “Se você é um executivo de alto nível terá que trabalhar e se relacionar com as outras áreas. Para isso, precisa entendê-las, ou não fará bem o seu trabalho. Hoje as coisas são muito conectadas”.
6) Tenha certeza de que você entende os impactos da transformação digital e da força de trabalho.
“Vocês sabem o que é RPA? Significa Robotic Process Automation. Isso simplesmente vai transformar em muito, por exemplo, as áreas de Contabilidade e de Impostos”, assinala o executivo da Dell. Ele estima que grande parte do trabalho feito por humanos em um escritório contábil será feito por robôs (sistemas) nos próximos anos. E qual será o papel do profissional? Programá-los.
A transformação na força de trabalho vem acompanhada da transformação digital, assinala Ribeiro. Os profissionais que crescerão mais rápido já estão pensando e se preparando para isso. “Tudo o que você estudou até agora terá um valor bem menor daqui para frente. Por exemplo, a primeira coisa que um estudante de Contabilidade terá que entender, no futuro, é de programação. É bom começar a estudar já essas linguagens”.
7) Balanceie sua vida profissional e pessoal.
Nada é sustentável sem um equilíbrio entre o tempo dedicado à carreira e à família, ressalta o mentor. “Na Dell, não valorizamos o fato de uma pessoa trabalhar que nem um maluco”, alerta o executivo. “Se você fala para um líder que trabalha 24 horas por dia, sete dias por semana, pode acabar gerando a impressão de que não consegue administrar sua rotina. Você deve ter tempo para si mesmo”, conta ele, que confessa já ter sido mais workaholic, mas busca o equilíbrio.
No entanto, é preciso ter a consciência de que algumas ocasiões exigirão aquele quilômetro extra. “Em uma determinada semana ou mês você terá que sacrificar algumas coisas, não tem jeito, é a opção a fazer. Mas isso não pode ser todo dia”, afirma Ribeiro. “Você deve ter uma relação saudável com o trabalho. Se não, não rola: vai chegar um momento em que você estará exausto, doente e sem amigos. Aí você entra em depressão e a sua produtividade cai. Isso não leva a lugar nenhum”.
Características que brilham aos olhos – Sobre as qualidades que encantam nos jovens profissionais, ele destaca a disposição em ajudar e levar soluções ao líder, em vez de problemas. “Problema é parte do jogo: você tem todo dia, toda hora, em todo lugar. Mas a pessoa que tem a característica de chegar em você, contar a situação e já apresentar algumas alternativas de solução, ela se destaca”, diz, ao observar que mesmo se as sugestões não forem corretas, o profissional terá demonstrado sua proatividade em gastar tempo pensando sobre o tema e tentar ajudar a empresa.
“Costumo dizer para a turma jovem da Dell: quando você está começando a carreira, não tem risco ao se expor. Porque se você estiver certo, alguém vai falar – esse cara é bom, anota o nome dele. E se você estiver errado, alguém vai te explicar o motivo e você aprenderá mais. Então, essa é a hora, e gosto de pessoas com iniciativa”, acrescenta o executivo global.
Outra habilidade valorizada é a capacidade de o profissional construir relações. Ao montar um time, Ribeiro leva em conta os mesmos princípios de um bom técnico de futebol: “Você deve ter pessoas na equipe com funções diferentes. No futebol, tem o cara que faz gol; na empresa, é o cara que traz o time junto. Ele cuida da equipe: se alguém se desgarrar ele coloca na direção certa, ele acredita no projeto. Você precisa ter um cara assim no grupo”.
Pessoas de amplo conhecimento cultural também se destacam. Ribeiro lembra de um colega da Dell, Lionel, que nasceu na África do Sul, estudou nos Estados Unidos e mora no Brasil. Em reuniões com executivos dos EUA, Lionel é chave, pois entende a cultura americana e consegue conversar sobre vários tópicos do dia a dia deles. “Quando você está em um evento com outros profissionais, você fala 5 minutos sobre a empresa. Mas depois tem que diversificar os temas, para não ficar entediante. Então, o conhecimento sobre cultura geral é importante”, ressalta o mentor.
E quais comportamentos deixam má impressão? Ribeiro aponta dois perfis indesejados: o profissional que enxerga tudo com negatividade e o que faz fofocas. “Irrita-me profundamente a pessoa que reclama demais. Fazendo um paralelo: eu sou o cara da infantaria, que está no campo de batalha, tentando convencer o time a lutar e tomar o risco de levar uma bala na cara, e a pessoa vem diz que não – que vai dar errado. Esse tipo de comportamento não ajuda”, completa.