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O Seminário da Comissão Técnica de Tributos, realizado no dia 24 de setembro, levou aos participantes um debate sobre desafios e perspectivas para o Brasil em 2020, fazendo um paralelo entre uma visão tributária e a macroeconomia do país. O evento foi conduzido pela líder da comissão, Meily Franco, que também é head de TAX LATAM da ContourGlobal. “O objetivo do IBEF-SP é promover conteúdo e networking. Para isso, a gente realiza esses eventos”, disse, repassando os próximos eventos a serem realizados pelo Instituto, além de destacar o 16º Prêmio Revelação, que ocorre no dia 4 de novembro, e para a 36ª edição do Prêmio Equilibrista, que será realizada em 11 de dezembro.
Em seguida, as convidadas para o seminário, Ana Claudia Ballei Ferreira, diretora tributária do grupo Maersk, e Tatiana Pinheiro, economista-chefe do BNP Paribas Asset Management, iniciaram os debates apresentando suas visões a respeito da retrospectiva tributária e macroeconômica do Brasil nos últimos anos. “Nesse novo governo, tínhamos uma série de expectativas que estavam altas no início do ano passado. Para o terceiro trimestre, havia uma série de projeções favoráveis. Sinto que ainda existe grande otimismo, mas as coisas desaceleraram, passando de uma fase mais exaltada para um compasso de espera”, disse Ana Claudia no início da apresentação.
Ela destacou que a expectativa para o cenário tributário estava mais otimista no primeiro trimestre, e fez uma revisão de discussões que ocorreram na época. Entre elas, o tema da Reforma Tributária e algumas outras medidas de governo, além da insegurança do judiciário e da Receita Federal, foram destacadas. “No final do segundo e início do terceiro trimestre, a carga tributária atingiu o pico histórico de 34%. Há um relacionamento ruidoso entre contribuinte e fisco e a saga da Reforma Tributária iniciou”, ressaltou.
Visão macro — Já Tatiana Pinheiro destacou o cenário econômico, cujos resultados não têm sido dentro das expectativas, apesar de andarem devagar. “A economia se esforça para crescer em torno de 1% nos últimos anos. Isso não é por conta de atitudes erradas, mas sim pela insegurança jurídica e imprevisibilidade”. Por outro lado, Tatiana disse que o Brasil fez algumas lições de casa, resolvendo desequilíbrios e reduzindo a inflação consistentemente. “A questão fiscal foi resolvida há custo da exposição de uma dívida maior. Estamos no processo de resolver as amarras. Tivemos o momento de arrumação da casa, de 2015 até agora, o que deve ser concluído com a Reforma da Previdência, que sana a iminência da insolvência fiscal”, ressaltou.
Reforma Tributária — A batalha da Reforma Tributária, por outro lado, será grande no Congresso Nacional, na visão de Tatiana, mas traz uma esperança que as coisas fluam melhor para as pessoas. “O que ela oferece, no final das contas, para o indivíduo, é um dia a dia melhor”. Para ela, a economia chegou num ponto que deixa essa discussão inevitável. “Precisamos repensar a carga tributária de 34%, mas estamos longe de se chegar num consenso, então essa reforma não deve encerrar este ano, havendo muita discussão em 2020. Soluções estão no longo prazo”, complementou.
Ana Claudia, por sua vez, falou sobre o impacto que a Reforma Tributária terá no setor de serviços. “Hoje, tudo é arcado pelo cliente, que no fim das contas absorve todo o impacto de qualquer aumento de tributação”. Com a nova administração tributária, Ana Claudia acredita que tudo será construído do zero e o Brasil será revisto com cuidado. Para destravar o atual crescimento cauteloso do país, contudo, ela acredita que é preciso mostrar medidas mais efetivas. “Nas questões tributárias há um ponto de insegurança jurídica. Não temos um ambiente no Brasil em que o empresário possa falar seguramente que as decisões se perpetuam. Essa insegurança jurídica permeia todas as discussões de reforma”, ressaltou.
Entre os itens mais importantes da Reforma Tributária para desanuviar o atual ambiente complexo, Ana Claudia citou a tributação sobre consumo. “Temos que diminui-la e aumentar o tributo sobre a renda. O problema em relação às propostas que estão na mesa é que cada uma tem suas especificidades, mas na hora dos detalhamentos para implementação é que veremos os efetivos problemas. O ICMS por exemplo, precisa entrar na reforma e ser resolvido”, alertou.
Impacto das reformas no ambiente de negócios — A Reforma Tributária é essencial, e pela primeira vez há indicações que o país está dando passos em um ambiente em que se conjugam interesses, na visão de Ana Claudia. Mas quais os reais impactos que tanto essa quanto a Reforma da Previdência e demais reformas realizadas devem causar no Brasil? “O mercado de trabalho talvez estivesse pior se não fossem as medidas de flexibilização da Reforma Trabalhista”, disse Tatiana. “Isso indica que já temos uma evolução, e no novo governo temos a nova previdência sendo aprovada, mas essa reforma faz com que os gastos fiquem estáveis, e não necessariamente traz uma relação positiva entre arrecadação e despesa”.
Para Tatiana, a pressão sobre os gastos do país hoje terá um alívio, mas para que o Brasil tenha superávit são necessárias outras reformas, como a administrativa, repensando a carreira pública, que deve ser mais longa. “Essa reforma é extremamente necessária, pois vendo o resultado primário das despesas mais altas que a arrecadação, quase 50% dos gastos são com folha de pagamento, somente no governo federal. Metade dos estados gastam mais 80% da receita corrente líquida com folha de pagamento. Somente com a reforma administrativa conseguiremos ver o resultado primário virando superavitário e a dívida se estabilizando”, destacou.
Direcionamento do CFO — Em um ambiente de constante mudança com um governo implementando diversas reformas, o CFO fica com a tarefa de conduzir seus negócios e muitas vezes explicar para executivos de diferentes países como está a situação da economia brasileira. Tatiana destacou que nesse momento, o executivo à frente das finanças das organizações deve ter muita cautela ao reportar para suas matrizes a atual situação do país. “Ser transparente e passar visões realistas é o caminho. O que temos no curto e médio prazo é uma economia crescendo ao redor de 2% ao ano. O pano de fundo do Brasil é o que deve ser passado para matrizes. O nosso país não tem problema de pressão inflacionária por conta da fraca atividade econômica e pretende endereçar assuntos interessantes, com uma agenda de reformas, por exemplo, mas não são medidas com resultados de curto prazo, então as apostas no Brasil devem ser renovadas, pois não veremos um super resultado nos próximos anos”, disse.
Do ponto de vista tributário, Ana Claudia, falou sobre continuar equilibrando os pratos. O que ela vê que dá resultado é tentar simplificar discursos na comunicação com as matrizes. “A ideia é tornar muito simples as coisas que ocorrem no Brasil da maneira mais transparente e singela possível. Pegar situações complexas e explicar esses casos para os executivos estrangeiros é um talento a ser desenvolvido. Isso gera aliados na matriz e consegue elementos necessários para resolver assuntos, ou pelo menos mitigá-los”, ressaltou.
O CFO e os diretores tributários já conseguem fazer as matrizes entenderem a lógica brasileira, evitando surpresas, disse Ana Claudia. “Comunique o que está acontecendo em relatórios ou nas reuniões para que não se tenha surpresas. Pequenos cuidados que às vezes escapam são essenciais para conseguir obter aliados na matriz e, nos momentos delicados, evitar impactos negativos. Os CFOs brasileiros têm essa responsabilidade de proteção aos seus negócios”, complementou.
(Reportagem: Bruna Chieco)