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O Webinar Varejo: Ações em Tempo de Crise, realizado pelo IBEF-SP no dia 17 de abril, reuniu especialistas para debater as ações tomadas pelo setor no enfrentamento da crise do novo coronavírus (COVID-19). Tamara Dzule, head de finanças corporativa da Nouryon, mediou o evento e agradeceu, inicialmente, aos mantenedores, membros corporativos e associados do Instituto. “O IBEF-SP está promovendo diversos webinars como esse. O tema de hoje é varejo e vamos falar sobre as ações do setor, focando em abastecimento e logística”. Como convidados para o debate estiveram presentes Stéphane Engelhard, vice-presidente de assuntos institucionais do Grupo Carrefour Brasil, e Rubens Batista, CFO do Grupo Martins.
Por ser uma rede internacional, o Carrefour compartilhou a experiência de adoção de medidas de contingência em outros países mais avançados na crise, conseguindo se preparar antes da quarentena ser decretada em alguns estados brasileiros, conforme explicou Stéphane Engelhard. “Implementamos rapidamente uma iniciativa para proteger tanto o colaborador quanto o cliente nas nossas lojas, e elas estão cada vez melhores para evitar aglomeração”, disse. Por fazer parte do grupo de atividades essenciais, Engelhard reforçou que o Carrefour tem um papel importante em abastecer a população com alimentos. “Temos máscaras, equipamentos, luvas, uma série de processos no dia a dia de trabalho”, complementou.
Em relação aos consumidores, o grupo também implantou medidas como medir a temperatura dos clientes na porta de cada rede. “Acredito que isso deve acontecer no varejo todo. Temos também uma marcação no chão para sinalizar o espaço entre as pessoas em filas, instalamos o acrílico nos balcões para proteger o colaborador e o cliente, e estamos com um protocolo bem elaborado que está evoluindo aqui e fora do Brasil”. Engelhard reforçou que o grupo trabalha em modelo home office e colocou à disposição dos colaboradores que trabalham em casa um aplicativo para auxílio em caso de alguma necessidade.
O Grupo Martins, rede atacadista com sede em Uberlândia, possui um grande complexo de distribuição que atende quase todos os 5,5, mil municípios brasileiros, e para passar por essa crise, além das medidas de home office e teletrabalho, implementou ações de segurança para os seus motoristas. Rubens Batista, CFO do grupo, ressaltou que o contato com o cliente se dá via os motoristas de caminhão. “Por isso, trabalhamos primeiramente na identificação de grupo de risco, colocando os motoristas desse grupo em licença, e também oferecemos um kit de higienização para os caminhões a cada viagem. Temos grandes centrais distribuídas em seis estados, e além disso, 45 unidades são pontos de distribuição. Implementamos um protocolo de distanciamento e higienização que impactou a produtividade e a cadeia”, destacou.
Logística – Batista explicou que para cuidar da logística, é preciso cuidar dos motoristas, que hoje trabalham em um número mais reduzido. Mas os desafios nas entregas não são somente na escalação de caminhoneiros. “A parte da alimentação nas viagens não estava funcionando. Precisamos encontrar uma solução, e como temos mais de 4 mil representantes comerciais, essas pessoas acabaram se organizando para oferecer alimentação para os motoristas. O que nos preocupa também é o risco, mas vamos continuar rodando enquanto houver segurança. O número de incidentes não aumentou, mas se esse lockdown continuar por muito tempo, pode haver aumento de incidentes”. Batista destacou que cerca de 55% das vendas do Grupo Martins são feitas em cidades com menos de 100 mil habitantes.
Já no Carrefour, a frota é quase toda terceirizada, tendo uma parte própria no atacadão. Engelhard explicou que no caso dos terceirizados, a orientação é que adotem os mesmos critérios de higiene e segurança. “Antes da crise, já tínhamos um problema com a infraestrutura, e tivemos um questionamento em relação às decisões de governadores de fechar as fronteiras dos estados. Isso não aconteceu, portanto, não tivemos problemas com circulação de mercadorias, que chegam nas lojas. Mas a nossa visão é que a situação não vai melhorar nos próximos 60 dias. Sabemos que a quarentena pode se estender para meados de maio, no melhor dos casos”, complementou.
Abastecimento – A questão do abastecimento de alimentos em municípios é incerta e preocupante em caso de uma extensão muito grande da crise. Engelhard destacou que em caso de endurecimento da situação, haverá uma consequência no abastecimento de populações mais desfavorecidas. “O que pode ocorrer é uma crise social forte”, disse. Rubens Batista ressaltou que, de fato, ainda não existe desabastecimento, mas o varejo estava preparado para um nível de vendas que mudou, bem como as categorias de produtos mais vendidos. “Com isso, passamos a fazer ajustes. Temos uma indústria que, com implantação de protocolos de higiene, se tornou menos produtiva, e o varejo deixou de usar pedidos automáticos, pois o giro mudou e estamos construindo uma nova realidade”
Stéphane Engelhard ressaltou que, até o momento, não há um pânico generalizado da população em estocar alimentos, o que facilita na continuidade do abastecimento. “As pessoas viram que não teria esse risco de desabastecimento. Agora, falta infraestrutura, há uma ruptura, e se a crise continuar, corremos o risco de realmente ter alguma questão nesse sentido. Além disso, o transporte público em muitos municípios está parado. Se não tiver como transportar nossos colaboradores, não poderemos abrir as lojas. Isso dependerá muito de como a crise será administrada pela federação e pelos estados e municípios”, complementou.
Ofertas – Em termos de vendas, as ofertas ainda são muito importantes no Brasil, e no caso Carrefour, o preço foi congelado em produtos com marca própria por 60 dias, podendo se estender por mais tempo, visando atender a pessoas mais carentes. “Não teremos mais promoções, com alguma exceções, para evitar aglomerações”, disse Engelhard. No caso do Grupo Martins, no B2B ainda há um programa de fidelidade em curso, premiando com um cashback. “Temos uma rede de supermercados com lojas pequenas em que acabamos com promoções”, ressaltou Batista.
E-commerce – No Grupo Martins, já havia em funcionamento um canal digital de e-commerce B2B, que hoje beira 30% das vendas devido a uma migração durante a crise. Batista explicou que os representantes comerciais acabaram explorando mais a venda via e-commerce por estarem com problema de recepção, por serem parte do grupo de risco, ou até porque o cliente não poderia atendê-los. “Quando falamos em conexão com fornecedor, temos plataformas de marketplace atendendo pessoa jurídica e pessoa física. Vemos a tendência dos pedidos à indústria migrarem via marketplace. Também temos um e-commerce com delivery para pessoa física em nossa rede associativa de supermercados (smartemcasa.com.br), que teve um crescimento substancial”, ressaltou.
No caso do Carrefour, o atacarejo não estava vendendo via e-commerce, mas acabou sendo implementado um site durante a crise, que já está no ar. “No varejo, que é a bandeira Carrefour, o e-commerce alimentar aumentou muito, cerca de 300% no mercado em geral. As pessoas não querem ir na loja com medo e acabam fazendo mais pedidos on-line. Isso é uma mudança que vai ficar, uma tendência que vai se ampliar e não tem volta”, disse Engelhard, ressaltando a parceria com o aplicativos de delivery, o que ajuda no aumento das vendas on-line.
Investimento – Na parte financeira, Stéphane Engelhard ressaltou que quem tem caixa atravessa melhor a crise. “Na revisão de investimentos, as empresas estão reduzindo OPEX e revendo prazos de investimento, pois não se sabe quando vai acabar a crise. O Carrefour está nesse país há 45 anos e já passamos por inúmeras crises. Eu diria que o empresário brasileiro aprendeu e sabe como ninguém lidar com esses momentos. Quando olhamos esse país com 200 milhões de habitantes, é um mercado muito importante, que vai sofrer, mas olhamos sempre o longo prazo”, reforçou.
No Grupo Martins, Rubens Batista enfatizou que esse é o momento e perseverar caixa. “Suspendemos projetos, à exceção daqueles que estavam próximos da conclusão e que os valores já tinham sido praticamente todo investido, e cancelamos a substituição de frota”, disse em relação às medidas implementadas para conter os gastos. Os especialistas falaram ainda sobre o aumento de preços em alguns produtos, e a constante conversa e negociação com fornecedores para tentar amenizar o impacto na cadeia.
Retomada – Na visão de Stéphane Engelhard, a retomada ainda levará consigo as atuais restrições e protocolos aplicados nas lojas, mesmo após o fim do lockdown. “Olhamos que até meados de 2021 deveremos ter essa mesma forma de trabalhar nas lojas”. Ele também falou sobre uma reflexão de reabertura do comércio de maneira segura. “O varejo deve ajudar o comércio a reabrir com protocolos claros, rígidos, para que não seja uma catástrofe econômica”, complementou.
Rubens Batista ressaltou que grande parte dos clientes do Grupo Martins são varejistas alimentares, enquadrados como essenciais, mas quem está no grupo não alimentar, como lojas de informática, estão sofrendo muito. “O processo de reabertura desse grupo será gradual, com limitação no número de pessoas nas lojas, distanciamento e equipamentos de proteção para os atendentes. Sabemos que essa abertura será gradual, mas o que nos preocupa é qual vai ser o novo padrão de consumo”.
Oportunidades – A forma de trabalho do dia a dia está mudando, e não somente no varejo. Stéphane Engelhard destacou que no grupo Carrefour são feitas reuniões virtuais o tempo todo. “A digitalização é um processo que vai acelerar bastante. Estamos aprendendo que o home office funciona e podemos imaginar uma sede menor, com uma rotatividade maior de pessoas durante a semana e alguns funcionários em casa. Estamos aprendendo e no início dessa nova fase”, disse.
Apesar do momento ser complicado e não ter fim certo, Stéphane Engelhard acredita que a crise trará aprendizados sobre como trabalhar de forma diferente, com uma visão dos negócios diferente. “Sou otimista. Acho que é um momento de reflexão que ajudará a sociedade a se transformar’’, disse. “Temos essa oportunidade e estou muito positivo nesse sentido”.
Rubens Batista ressaltou que entre as oportunidade identificadas com esse novo modelo de trabalho está a integração de canais digitais com não digitais, o que era algo que demorava para ocorrer e hoje é uma realidade. “Também reavaliamos o mix de produtos vendidos, o e-commerce pessoa física, que foi uma grata surpresa, e simplificamos contatos e estruturas. No futuro, podemos economizar em custo de espaço, ou seja, são aprendizados, e as empresas vão trabalhar de maneira diferente”, reforçou.
Batista complementou dizendo que é preciso serenidade para atravessar a crise. “Não tem solução pronta, de prateleira. Além disso, é necessário preservar caixa e preparar para uma saída, que será lenta”. Manter os negócios, pensar em como o consumidor vai mudar, se preparar para isso e enxergar as mudanças como oportunidades foram as dica dadas pelo CFO. “Nós não seremos os mesmos. O consumo será diferente, e a maneira de se relacionar também”.
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