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O varejo passou por uma grande transformação nos últimos meses devido à pandemia, entre elas a de processos digitais, que já vinha ocorrendo, mas também a mudança nos hábitos de consumo, levando empresas do setor a buscarem soluções para melhor atender a um novo perfil de cliente. Para tratar do tema, o IBEF Varejo, nova iniciativa do IBEF-SP, realizou live no dia 20 de outubro, abordando essas tendências, os desafios e as oportunidades do setor. O webinar abre uma jornada de discussões acerca desse tema dentro do Instituto. Vivianne Valente, CFO do Grupo Tigre, moderou o evento online. “Essa é a primeira de uma série de webinars focados no varejo. Estamos vivendo uma transformação nesse setor, e diante de toda essa movimentação, o papel do financeiro é muito importante”, destacou Vivianne.
Essa transformação passa por uma reinvenção em tecnologia. Com a pandemia, a digitalização se acelerou, concretizando uma tendência que já estava em pauta, e impulsionando os varejistas a abrirem seus e-commerces ou trabalhar outras possibilidades de vendas. Essa é uma das mudanças apontadas por Rubens Batista, CFO da Martins e diretor executivo da Smart Supermercados, que destaca que a pandemia foi uma crise de saúde que sequenciou em uma crise econômica, impactando na experiência do consumidor. “Tivemos que voltar ao básico, ajudar os varejistas para que eles pudessem seguir operando. Quando falamos de digital e de sistemas, mesmo o pequeno varejo já começou a trabalhar e se informatizar. Já havia histórico de compra, artigos mais vendidos, mas isso foi afetado durante a pandemia, e tivemos que ajudar os clientes a comprarem o que de fato estava sendo vendido”.
Segundo Batista, isso decorre da mudança no hábito de compras, que acabou beneficiando o pequeno varejo, já que restaurantes e escolas acabaram fechando. Além disso, ele afirma que o pequeno varejista começou a ser abastecido em outras categorias fora alimentação. “O nosso maior desafio é abastecer os nossos clientes e garantir que as indústrias possam entregar as mercadorias”. Ele afirma ainda que, conforme há reabertura de lojas, as tendências anteriores devem voltar a ganhar força, mas o cliente cada vez mais terá na agenda o não presencial.
Digitalização – Nilton Mayrink, CIO e Head de Vendas Digitais B2B/B2C da Martins, complementa dizendo que a palavra de ordem é o uso de dados. Segundo ele, é necessário o uso intensivo de dados e de sistemas analíticos para otimizar a cadeia de abastecimento, beneficiando todos os elos. “Nosso objetivo é potencializar esse pequeno e médio varejista com tecnologia e informação”.
Stéphane Engelhard, VP de relações institucionais do Grupo Carrefour Brasil, ressalta que há uma aceleração forte das vendas online, que na parte de alimentos não estava tão consolidada, mas agora cresce cada vez mais. “Há uma participação dos alimentos online crescendo fortemente no consolidado. Estamos em um momento de aceleração”.
Marcos Gouvea, diretor geral e fundador da provedora de soluções para o mercado de consumo e varejo Gouvêa Ecosystem, destaca que o que ocorreu na pandemia foi uma aceleração exponencial de movimentos que já estavam ocorrendo, e alguns deles vieram pra ficar, sendo que o principal envolve o digital. “Isso está além do e-commerce e tem a ver com a agilidade que o consumidor ganhou com o uso dos instrumentos digitais”, afirma. Segundo ele, há um longo espaço para as lojas crescerem nesse quesito, mas de forma reconfigurada, e cada vez mais incorporando serviços, experiências e o próprio digital no ambiente da loja.
Transformação estrutural – Para Gouvea, também é muito claro que esse período no Brasil deixou toda estrutura do comércio e do varejo bastante desorganizada, com alimentação fora do lar, que é um setor que vinha crescendo muito, retroagindo e ainda em uma faixa perto de 30% abaixo do mesmo período do ano passado. “Tem uma reconfiguração forte ocorrendo nesses setores, incluindo vestuário, calçado, turismo”, diz. Gouvea destaca que ainda que haja um retorno de consumo na trilha anterior, o perfil será diferenciado.
Outro sinal de mudança na estrutura do setor de varejo são os IPOs envolvendo empresas de consumo e varejistas, aponta Gouvea. “É uma forma eloquente da perspectiva positiva do crescimento da indústria no Brasil. Ainda há espaço para crescimento ainda maior, representado pelo crédito ao consumo, que antes da pandemia representava 28% do PIB, enquanto em outras economias similares variava de 50% a mais de 100%. Agora, com taxa real de juros próxima a zero, temos outra configuração, e a iminência da plataforma Pix, com a possibilidade de pagamento agendado, pode contribuir para uma massificação que, por sua vez, estimulará o setor de consumo e varejo”.
O auxílio emergencial do governo também foi destacado como algo que ajudou a acelerar esse movimento de expansão do consumo e varejo. Julio Campos, VP Latam de customer development da Unilever, vê, contudo, certa preocupação caso o governo passe a não fornecer mais nenhum auxílio no futuro. “Pessoas que não tinham acesso ao consumo passaram a ter, e isso impactou o setor, mas minha dúvida será o efeito disso a partir de fevereiro do ano que vem”, destaca, enfatizando que apesar do alto nível de desemprego, a confiança do consumidor ainda está elevada devido a esses auxílios. “A dúvida é como reagirá o consumo com o fim desse auxílio”, reforça.
Dados e colaboração – Stéphane destaca que o movimento de mudança de hábito de consumo pode se estender, e a digitalização ajuda nessa questão. Por isso, a forma de uso do dados influencia em como esse crescimento se dará. “Para ganharmos velocidade, as parcerias serão uma tendência forte. Vamos buscar quem já tem experiência em tecnologia”, diz. “A regionalização também será cada vez mais importante, e faremos parcerias no físico”, complementa, reforçando que será necessária a busca por parceiros especializados no hábito de consumo de determinada região, por exemplo. “Vamos buscar esse know how para acelerar nosso movimento de crescimento”.
Julio Campos ressaltou que a parte de dados é essencial para as companhias varejistas se manterem em alta. “Esse reforço dentro de um novo ecossistema vai ser fundamental para o próprio abastecimento do país, permitindo que a gente possa reagir mais rápido à crise”, destaca. Ele explica que a Unilever se aproximou do varejo por meio de programas colaborativos para aprender a como navegar nesse novo período, entendendo tendências de produto e como apoiar o varejista na rota do mercado até o consumidor. “Se você começar a pensar nas grandes tendências, a digitalização traz junto o desafio da cultura de dados nas companhias: como começamos a capturar dados e, juntos, os usamos para melhor atender o consumidor”, destaca.
Segundo ele, um dos grandes desafios desse trabalho foi a reclassificação de portfólio. “Esse trabalho colaborativo é muito importante para entender qual a nova demanda do consumidor. Precisamos cuidar para que as fábricas possam se readequar em uma nova curva”, destaca, enfatizando que esse novo cenário exige convergência e colaboração. “Colaborar é fundamental para que a gente consiga superar o momento que estamos passando e entender essa volatilidade de mercado”. Julio diz ainda que a colaboração ocorre também no âmbito digital. “Redes de varejo podem se juntar para comprar um serviço de segurança digital. Temos que começar a pensar nessa forma de colaboração, construindo melhores oportunidades de negócio para todo mundo”.
Rubens Batista reforça que esse mundo novo da digitalização estimula essa colaboração ainda mais pelo fato de, muitas vezes, não se ter todo conhecimento e agilidade para construir as ferramentas necessárias no período correto para atender o consumidor. “A gente coopera para um fim, que é atender o cliente bem, proporcionando uma boa jornada ao cliente, e não podemos perder essa perspectiva de vista”.
Cultura organizacional – Devido a essa transformação, a mudança na cultura organizacional deixa de ser predadora e passa a ser mais colaboradora, com propósito. “As grandes corporações deveriam mostrar esse posicionamento”, diz Julio. “O consumidor vai exigir uma postura mais aberta, de compartilhamento”, reitera.
Gouvea destaca que hoje há uma demanda dos consumidores por propósito para além da excelência com produtos e serviços. “Hoje temos muito acesso a produtos, informações, lojas, etc. E a oferta é tanta que permite que o consumidor se torne mais seletivo, e ele quer das marcas compromisso, mais do que simplesmente o abastecimento de produtos certos na hora certa. Ou você agrega valor com propósito, ou será desconsiderado”, pontua.
Stéphane complementa dizendo que, de fato, o propósito se torna cada vez mais relevante e as redes sociais têm um papel de aceleração de mostrar caminhos acerca desses produtos. “Esse propósito é cobrado pelo consumidor de forma geral”. Rubens Batista destaca que a responsabilidade ambiental, social e de governança (ASG) faz parte dessa agenda. “O cliente tem voz e ele vai usar essa voz. Temos que oferecer não somente produto e preço, mas também propósito”, complementa.