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A pandemia de COVID-19 acelerou inovações em diversos departamentos, e no contas a receber não foi diferente. Conhecimento sobre o cliente, novos meios de pagamento eletrônico e terceirização da cobrança ganham força.
A live “Melhores práticas do contas a receber e perspectivas 2021”, realizada em 24 de fevereiro, apresentou casos práticos vividos por executivos financeiros e a visão de um economista sobre as macrotendências que influenciarão o cenário econômico. O evento foi patrocinado pela Global Estratégias Financeiras.
A live inaugurou a programação de eventos do IBEF SP no ano. O Instituto reúne mais de 1.000 associados e conta com quatro Comissões Técnicas focadas na discussão de temas ligados a Controladoria e Contabilidade, Tributos, Tesouraria, Mercado Financeiro e Mercado de Capitais. Somam-se ainda as iniciativas IBEF Mulher, IBEF Jovem e IBEF Global, que enriquecem a gama de conteúdo para os associados.
“O Instituto realiza eventos muito interessantes não só para os executivos de finanças, mas também para os profissionais que se relacionam com a área financeira”, destacou Maria José Cury, Vice-Presidente IBEF Mulher e sócia da PwC, responsável pela apresentação do evento.
Mudanças e inovações no contas a receber
Silvano Boing, diretor executivo da Global Estratégias Financeiras, companhia focada em soluções financeiras e especialista em análise de crédito e cobrança B2C e B2B, comandou o debate sobre as ações tomadas pelas empresas para preservar caixa e inovar no contas a receber durante a pandemia.
Conhecimento do cliente – A CFO da Wickbold, Keila Gobbi, ressaltou que a companhia do ramo alimentício focou seus esforços em três pilares: conhecimento sobre o cliente e estabelecimento de políticas claras; conhecimento do mercado para tomada de decisão estratégica sobre crédito; e transformação digital.
Essas iniciativas, somadas à segmentação de crédito, contribuíram para manter baixa a PDD – Provisão para Devedores Duvidosos. Com visão de parceria, a companhia buscou apoiar clientes em dificuldades, com aumento da concessão de crédito e até a criação de um fundo de reserva nos três primeiros meses da crise.
Com o agravamento da pandemia no início de 2021 e rumores de possível estouro da bolha de liquidez e alto consumo devido à retirada do auxílio emergencial, essas iniciativas devem se manter. “Não adianta trazer um ganho para a mesa hoje e não conseguir reconquistar o cliente amanhã”, ressaltou a CFO da Wickbold. “Temos trabalhado e nos preparado para dar suporte aos clientes de setores mais atingidos, para que continuem conosco”.
Campanhas de cobrança – Ressaltando a importância da agilidade e da postura de parceria da área financeira,João Paulo Machione, gerente de “order to cash” na Philip Morris Brasil, contou que a empresa dividiu suas iniciativas entre ações imediatas e inovações com visão de longo prazo.
No primeiro momento da pandemia, a empresa do setor de tabaco criou uma campanha de cobrança com isenção de multa e juros, possibilitando o parcelamento da dívida ao valor principal. A iniciativa durou três meses e teve o objetivo de auxiliar os pequenos varejistas a atravessarem o período agudo da crise. Para 2021, já está no pipeline a estruturação de uma nova campanha, mais robusta, engajando o time comercial junto aos parceiros de cobrança.
Meios de pagamento digitais – Na ponta da inovação, a companhia expandiu o experimento de negociação de títulos em aberto no cartão de crédito, estendendo a possibilidade a alguns clientes inadimplentes que enfrentaram dificuldades. “Hoje vemos o cartão de crédito como um capacitador para pavimentarmos uma nova via na empresa e conectarmos meios de pagamento digitais”, acrescentou João Paulo, observando que o canal criado poderá ter integrações com e-Wallet e Pix.
Análise preditiva – A Philip Morris também se movimenta em direção ao trabalho de análise preditiva de crédito, para ir além das informações disponíveis em seu histórico interno. O objetivo é ter maior previsibilidade sobre o risco de inadimplência, agregando dados externos de “bureaus” e outros parceiros sobre o comportamento dos pontos de venda, de forma a auxiliar as decisões sobre crédito.
Terceirização da cobrança – Silvano Boing, da Global, chamou atenção para o movimento de terceirização da cobrança, comum no segmento B2C, e que ganha força no contas a receber de empresas B2B. “Busca-se antecipar ações e, com isso, melhorar o fluxo de caixa, liberar o cliente para novas vendas e evitar o aumento da PDD”.
Keila Gobbi observou que a terceirização da cobrança pode trazer benefícios não apenas em momentos de crise, mas também para maior foco em projetos que exigem dedicação extraordinária, como uma implementação sistêmica. “Por muitas vezes a Wickbold recorreu a essa atividade. São ações que nos tornam até mais resistentes a essa crise, quando precisamos ser mais ágeis, estratégicos e atentos ao mercado”.
A especialização do parceiro pode ser decisiva para o resultado, acrescentou o executivo da Philip Morris. A falta de agilidade na cobrança pode deixar o ponto de venda muito tempo sem o produto, a ponto de este não ser mais necessário. E em cenário de crise, quando muitas vezes há competição pelo dinheiro do pagamento, ser ágil é fundamental. “Antecipar esse contato e trazê-lo da melhor forma, com especialização e tecnologia, enriquece o processo e ajuda na manutenção da PDD”.
Brasil vive combinação perigosa
Em palestra sobre as perspectivas para 2021, o economista Maurício Molan ressaltou que o País tem cenário bastante difícil à frente.
Molan citou três macrotendências determinantes: a pandemia de COVID-19 passando para a fase de endemia; a economia global caracterizada por expansão monetária e fiscal nas nações mais desenvolvidas, e economias emergentes acabarão pagando maior preço pela incerteza fiscal; e a perigosa combinação de fatores políticos, econômicos e sanitários no Brasil.
Ruídos políticos – Apesar de o País ter apresentado rápida recuperação no final de 2020, a projeção é de certa estagnação para o primeiro e segundo trimestres de 2021. “A combinação perigosa é a popularidade do governo em baixa, ritmo de vacinação lento, o que vai mostrar a mortalidade persistindo mais elevada por algum tempo, e o abismo econômico: você tem a queda do auxílio emergencial, possibilidade de recessão no 1º trimestre e abismo de emprego”, resumiu Molan.
Essa combinação gera a intensificação de ruídos políticos, acrescentou o economista, a exemplo da recente manifestação do presidente Jair Bolsonaro sobre a troca de comando na Petrobras. “Um governo que está pressionado, porque está vendo que o crescimento não vem, a pandemia não vai embora, e ainda há riscos inflacionários que podem exigir a elevação da taxa de juros. Então, é uma combinação muito ruim para este início do ano e desafiadora para as empresas”.
Crescimento assimétrico – Diferente de recessões e estagnações anteriores, nesta crise o tema do crescimento está caracterizado por uma assimetria muito intensa, observou o economista. Enquanto há setores explodindo, como agronegócio, tecnologia e saúde, outros têm performance precária, como shopping centers, aluguel de escritórios, varejo de rua, eventos e turismo.
Essa assimetria impõe desafios e oportunidades nos aspectos de crédito e cobrança. “Como já foi comentado, um dos componentes importantes da estratégia é conhecer o cliente. Porque você terá aquele cliente ou setor que está muito bem e aquele cliente que está muito mal. E os que estão mal demorarão para se recuperar”, notou Molan.
Para a pessoa física, o cenário de inadimplência tende a ser mais grave, em função da queda da massa salarial das famílias provocada pela retirada do auxílio emergencial.
A evolução das condições de crédito, ao longo do ano, terá como determinante a habilidade do mercado financeiro em conseguir proporcionar mais espaço de respiro para os clientes/setores que estão com mais dificuldades. E, ao mesmo tempo, compensar resultados com os setores em situação melhor, acrescentou o economista.
O crescimento do crédito para as empresas foi acelerado em 2020 com as medidas implementadas pelo Banco Central, ainda que a oferta tenha sido desigual para empresas de diferentes portes e setores. “Acredito que a liquidez e o crédito persistirão, mas de forma não tão intensa, e ainda bastante assimétrica”, avaliou Molan.