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Taxa Selic de 13,75% ao ano no Brasil. Juros em alta na Europa e nos Estados Unidos. Expectativa de baixo crescimento do PIB, inflação global pressionada, guerra na Ucrânia e tensões geopolíticas. Todos esses elementos contribuem para o cenário de imprevisibilidade da economia, afetando as operações e o planejamento de empresas que buscam recuperação, principalmente após as dificuldades geradas pela pandemia.
Estes desafios foram debatidos no painel “Insights em cenários desafiadores: oportunidades e gerenciamento de riscos na volatilidade” promovido pelo IBEF-SP, no último dia 20 de abril. O evento foi realizado na sede do Bank of America, em São Paulo, e contou com as participações do chefe de economia para o Brasil e de estratégia para a América Latina do Bank of America, David Beker, do CEO da Saint Paul Escola de Negócios, José Cláudio Securato, e do presidente do Conselho de Administração do IBEF-SP e CFO da Suzano, Marcelo Bacci. A mediação foi de Annali Duarte, diretora executiva de Produtos Transacionais do Bank of America.
Um dos destaques do debate foi a preocupação dos CFOs com o cenário internacional, se sobrepondo inclusive às discussões do mercado doméstico. Para José Cláudio Securato, esse fenômeno se deve ao compasso de espera no Brasil, em relação às reformas, à tramitação do arcabouço fiscal e às definições sobre a taxa de juros. Esse contexto leva as empresas a concentrarem atenções nas principais economias do mundo, Estados Unidos e China, que, de acordo com ele, afetam o país de formas diferentes.
“Quando pensamos na relação Brasil e Estados Unidos, o principal driver é referente aos juros. Se a taxa de juros aumenta um ponto nos EUA, o impacto é gigantesco. O CFO quando olha para esse cenário está pensando se os juros cairão ou não, e isso está relacionado a questão inflacionária, ainda muito resiliente. Quando pensamos em China, o PIB é o mais impactante, pois os seus desdobramentos são importantes aqui”, afirmou o CEO da Saint Paul Escola de Negócios.
Juros nos Estados Unidos
Neste contexto, David Beker alertou para a alta probabilidade de que o aperto monetário continue nos Estados Unidos. “O mundo fica mais complicado com juros mais altos e o mercado quer apostar em queda de juros, mas a verdade é que não vemos a economia americana tendo desacelerado o suficiente para trazer a inflação para baixo, o que permitiria a redução da taxa de juros ao longo do segundo semestre. A nossa visão é de persistência inflacionária e não só nos Estados Unidos”, afirmou.
O executivo do Bank of America apontou outros fatores que devem dificultar o controle inflacionário, como as crises geopolíticas e a busca por alternativas para conseguir insumos de outras fontes, reduzindo a dependência de China. Beker ainda reforçou a tendência de desaceleração da economia, principalmente nos EUA e na Europa. Em contrapartida, há um otimismo em relação à China, com um crescimento acima de 5,5% previsto para este ano. “Provavelmente a China deve segurar este crescimento global”.
Impacto dos juros nas empresas
Trazendo a visão do CFO, Marcelo Bacci analisou os efeitos escalonados da alta taxa de juros na economia e o seu impacto em toda a cadeia. De acordo com o presidente do Conselho de Administração do IBEF-SP e CFO da Suzano, este cenário de alto risco faz com que a concessão de crédito fique concentrada nas grandes empresas, afetando fornecedores e clientes, movimento chamado de “flight to quality”, ou fuga (voo) para a qualidade.
“Esse fenômeno do ‘flight do quality’, que acontece nos bancos, ocorre nas demais empresas também, porque o dinheiro sai dos bancos pequenos para os bancos grandes. As grandes instituições financeiras querem emprestar para empresas grandes, pois não estão dispostas a aumentar o seu nível de risco. Então, a oferta para as grandes empresas é muito grande, até maior do que precisamos”, explicou Bacci.
O CFO acrescentou que este “empoçamento de crédito” afeta a atividade econômica e gera condições desfavoráveis para a rolagem da dívida das empresas menores ou em dificuldades. “Todo mundo está preocupado com o nível de crédito do sistema e há um maior aperto com fornecedores e clientes. As empresas não estão dispostas a fazer o papel dos bancos e irrigar crédito na economia. Esse empoçamento continuará acontecendo e será difícil fazer o dinheiro fluir e chegar aonde tem que chegar”, completou.
Perspectivas para as reformas
Os painelistas também abordaram a importância das reformas estruturais para melhorar o ambiente de negócios no Brasil. David Beker destacou o cenário favorável para a aprovação do novo arcabouço fiscal, que deve pavimentar o caminho para a discussão da Reforma Tributária.
José Cláudio Securato aproveitou o tema para evidenciar o fato de as reformas surgirem apenas em casos emergenciais, o que afeta uma discussão mais profunda em busca de propostas completas. “O Brasil nunca fez reformas de forma prospectiva. O problema é que quando queremos fazer reformas, queremos fazer todas de uma vez e as melhores possíveis. Depois da Tributária, ainda temos discussões sobre Reforma Administrativa, a Reforma Política, entre outras. Não conseguimos fazer essas reformas de maneira estruturada. Creio que teremos a reforma que for possível conseguirmos ter”, analisou.
Papel das empresas nas “minirreformas”
O final do painel trouxe uma discussão sobre pequenas alterações na legislação que podem melhorar o ambiente de negócios, as chamadas “minirreformas”. Para Marcelo Bacci, é vital que essas mudanças sejam apresentadas de forma proativa pelas empresas.
“Pela minha experiência com o Congresso, essas coisas dependem muito mais de alguém da sociedade ir até lá e explicar por que é importante do que do próprio governo. Tem muitas coisas que ninguém é contra, mas também ninguém descobriu que é importante. Então o nosso papel é levar esses assuntos para agenda”, afirmou o presidente do CA do IBEF-SP.
José Cláudio Securato, por sua vez, reforçou a importância de apresentar propostas de maneira organizada, com a união de diversas entidades. “Escolham temas, desenhem e vão para comissões econômicas do Congresso, pois eles vão apreciar as ideias. E se juntarmos muitas associações temos muita força. Um tema aprovado pode salvar um grupo grande de empresas e pessoas”, finalizou o CEO da Saint Paul Escola de Negócios.
IBEF-SP é caminho para buscar soluções conjuntas
Mais do que detalhar o cenário desafiador para as empresas, o painel foi uma oportunidade de ilustrar os desafios e problemas em comum de diversas organizações, independentemente do seu tamanho ou área de atuação.
“A realidade dos CFOs é muito parecida. Por isso, é extremamente importante termos esta comunidade no IBEF-SP para debater em alto nível a solução dos nossos problemas. Os desafios estão colocados de maneira muito clara. Eu saio daqui com a visão de que este empoçamento de crédito nas empresas maiores é um problema que precisa ser equacionado e a solução é trazer mais renda para a população. É um cenário extremamente complexo”, opinou Cynthia Hobbs, CFO da GetNinjas.
Sérgio Diniz, CEO da Triple A, destacou a importância de promover o encontro entre os associados para estruturar propostas de melhorias que podem ser direcionadas aos poderes executivos e legislativos em nível federal e nos estados.
“O IBEF-SP já tem todos os elementos, pois já conhecemos as dificuldades. O CFO conhece a realidade da sua cadeia de produção. Se vende ou compra de empresas menores ele entende as dificuldades. Temos os melhores CFOs do Brasil no Instituto e se nos juntarmos e dedicarmos um pouco do tempo para os problemas que precisam ser resolvidos, tenho certeza de que conseguiremos trazer soluções viáveis, de curto prazo, realistas e implementáveis de maneira simples”, argumentou.