Getting your Trinity Audio player ready...
|
Como sobreviver a uma crise empresarial em meio a uma recessão econômica prolongada? Destacamos nesta matéria alguns procedimentos e alternativas que podem ser aplicados pelos gestores de empresas em situação financeira delicada, com o objetivo de preservá-las da insolvência.
1) Diagnosticar a situação – Falta de percepção das lideranças sobre a gravidade da situação em que a companhia está inserida é um fator que leva muitas empresas a entrarem em situação de recuperação judicial, observa Sandro Benelli, sócio da consultoria de gestão Enéas Pestana & Associados.
“O executivo no comando demora a perceber que precisa reestruturar a empresa, e quando nota já é tarde. É como ir ao médico depois que a doença se agravou. Muitas vezes você já perdeu o timing para diagnosticar a situação”, explica o consultor.
Falta de caixa e geração de caixa insuficiente, de forma consistente, por exemplo, são “sintomas” graves de que a companhia está com sérios problemas e precisa se reestruturar.
Nesse cenário, fazer um diagnóstico e tomar medidas tempestivas para revertê-lo, mesmo quando não se tem todas as informações para tomar a decisão, é melhor do que esperar e obter 100% das informações depois que a empresa quebrou, alerta o especialista.
Tal problema pode atingir empresas de diferentes portes. Desde a grande organização que possui estrutura de controles, mas demora a identificar que estes não estão sendo feitos adequadamente, até o pequeno negócio em que o dono super estima sua capacidade de resolver tudo sozinho.
2) Agir rápido e de forma precisa – “Quando a companhia começa a ter problemas de liquidez já é o momento de consultar uma visão externa. O pior dos mundos é você procrastinar, pensar que amanhã vai melhorar”, reforça Rubens Batista Jr., secretário geral do IBEF SP e sócio da consultoria empresarial 2B Partners Consulting.
Quando o especialista externo é finalmente consultado, muitas vezes a empresa já está em quadro pré-falimentar, observam os especialistas. Portanto, quanto mais cedo for identificado o problema, rapidamente tomadas as decisões, e implementadas as ações necessárias para superá-lo, melhores as chances de recuperação.
O líder financeiro deve ter papel vigilante no dia a dia para prevenir que o agravamento da situação aconteça, observa Batista Jr.
O CFO deve influenciar para a implementação de uma governança que envolva resultados, processo de decisão para grandes gastos, e acompanhamento da gestão. Criar um fórum de discussão permanente na companhia – com a participação eventual de profissionais externos que possam agregar no nível do debate – também é uma sugestão válida.
Adicionalmente, a participação de lideranças da empresa em associações como o IBEF SP mostra-se muito benéfica, observa o secretário geral do Instituto. “Para as companhias que trafegam neste complexo ambiente, ter executivos engajados em um espaço de networking, troca de experiências e discussões de alto nível é importante para trazer inspiração, ideias inovadoras, e até mesmo de novos negócios”.
3) Buscar novas fontes de recursos – A palavra de ordem é “seletividade” para quem detém os recursos, destaca Thiago Giantomassi, sócio da área de mercado de capitais do escritório Demarest Advogados. Daí a importância de as empresas diversificarem seus mecanismos de captação, avaliando alternativas para além dos meios tradicionais de financiamento bancário e operações de dívida direta.
Uma opção que deve estar na mesa é o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), que une a flexibilidade de compra de qualquer tipo de ativo com a necessária regulação de mercado. Empresas que estão em grande stress ou já em fase de recuperação judicial podem recorrer ao FIDC-NP (não padronizado).
O FIDC-NP tem vocação específica para prover recursos em situações “não tradicionais” do mercado, observa Giantomassi, como, por exemplo, o caso de créditos de empresas que estejam em situação de insolvência. “Esse fundo pode servir como mecanismo de financiamento para essas companhias”.
4) Colocar na ponta do lápis – Contudo, ao avaliar essa opção de financiamento, assim como qualquer outra, é preciso estar atento ao “all-in cost”. Ou seja, o custo total do produto, incluindo juros, custos de estruturação, distribuição e taxas.
Com relação a outras possibilidades, Thiago Giantomassi destaca o crescimento na quantidade de operações de financiamento por meio de CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio), CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), debêntures de infraestrutura e fundos imobiliários – todas alternativas que contêm benefícios fiscais. “O benefício fiscal também é um fator importante na decisão de qual a melhor estrutura. Todas são boas, mas não dá para negar que o custo somado à complexidade são fatores determinantes”.
5) Mecanismos de recuperação – Reestruturação das dívidas (“recuperação branca”), recuperação extrajudicial e recuperação judicial. Todos esses são exemplos de procedimentos que têm por objetivo propiciar às empresas em situação econômico-financeira delicada a restauração das suas plenas condições operacionais, administrativas, econômicas e financeiras.
Esses tipos de rearranjo do endividamento podem ser basicamente classificados desde o ponto de vista de sua interação com o Poder Judiciário ou não, esclarece Fabio Braga, sócio na área de direito bancário e reestruturação do escritório Demarest Advogados.
A “recuperação branca”, por exemplo, prescinde de qualquer intervenção judicial, ocorrendo em um ambiente contratual privado. Consiste em uma reestruturação das dívidas da empresa realizada através de um processo de renegociação de cada linha de endividamento relevante da companhia com os respectivos credores.
Nesses processos, em geral, explica Fabio Braga, a empresa que se vê na iminência de situações de descumprimento contratual busca renegociar com seus credores condições mais favoráveis ao efetivo pagamento. O que pode incluir medidas como o alongamento de prazos de principal e juros, troca de indexadores, revisão de pacotes de garantias com ofertas de incremento de posições para os credores através de princípios de compartilhamento. “Esses processos podem, em algumas circunstâncias, até mesmo vir a contemplar propostas de descontos nos valores de principal devidos”, observa o advogado.
Já a recuperação judicial e a recuperação extrajudicial são mecanismos previstos na Lei 11.101/05, que rege esses procedimentos, além do procedimento da falência (Lei de Falências e Recuperação de Empresa – LRF). Ambas são validadas por intervenção judiciária, através de ato homologatório, esclarece Fabio Braga.
6) Distressed M&A – No contexto da recuperação judicial, com respaldo na própria LRF, as empresas podem buscar soluções para as restrições de acesso a crédito e capitais através das operações de fusão e aquisição e de vendas de ativos, destaca o especialista. “Por vezes, esta pode ser uma opção para a readequação de seu fluxo de recursos, seu capital de giro e o reencontro com as oportunidades de retomada gradual de atividades”.
A alienação de ativos pode ter por objeto tanto participações acionárias, passando por máquinas e equipamentos, quanto estabelecimentos, filiais ou unidades produtivas isoladas (UPI) da empresa recuperanda.
O sócio do Demarest Advogados acrescenta que as operações de distressed M&A podem ser consideradas no contexto do próprio planejamento estratégico da empresa em recuperação, assim como – da perspectiva de investidores – podem se tornar mais atraentes à vista da oscilação do real em relação a outras moedas.
Fabio Braga constata que há um forte interesse de investidores estrangeiros em participar de processos de aquisições. “O que, porém, requer em alguns casos maior detalhamento, em extensão e profundidade, a respeito da empresa geradora do ativo. E sobre as consequências que sua atuação em determinado ramo de atividade econômica seria capaz de ensejar”, conclui.
(Reportagem: Débora Soares/ Fotos: Mario Palhares/Divulgação)