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As crises econômica e política enfrentadas pelo Brasil nos últimos dois anos impactaram também a carreira dos executivos. Temas como conduta ética e aderência a valores organizacionais ganharam ainda mais força dentro e fora das salas de entrevista, durante a avaliação de propostas de emprego.
Este fato foi destacado pelos especialistas da Talenses na segunda edição do bate-papo com headhunter, evento realizado pelo IBEF Mulher neste mês. Confira aqui a cobertura da primeira edição do evento!
As revelações de investigações da Operação Lava Jato sobre práticas ilícitas mantidas por empresas prestigiadas, algumas listadas na Bolsa, com agentes públicos têm sacudido o mercado nos últimos anos.
Segundo Alexandre Benedetti, diretor executivo da Talenses, tais fatos geraram uma postura ainda mais cautelosa por parte dos executivos e das empresas para contratações. “A tomada de risco é muito baixa dos dois lados: tanto do candidato como de quem contrata. A avaliação sobre a conduta ética e a aderência aos valores ganhou ainda mais peso”.
Competências mais desejadas – O cenário também impactou as competências mais requeridas pelas empresas na hora de contratar executivos. Segundo pesquisa da Talenses, no topo das características mais desejadas estão experiência em situação de crise (85,8%), conhecimento em finanças (43,2%) e em técnicas de produtividade (42%).
Outro movimento que ganhou força nos últimos dois anos foi o de substituições. Na área de finanças, segundo Felipe Brunieri, cerca de 60% das recolocações feitas pela Talenses foram realizadas com este propósito.
“Em cerca de 70% das substituições, o motivo para a troca de executivo foi a performance profissional”, observou Brunieri. Segundo o headhunter, a substituição muitas vezes ocorre não pela capacidade de entrega do profissional, mas principalmente por ele não ter mais o perfil esperado e adequado ao desafio enfrentado pela empresa naquele momento.
Dentre as áreas financeiras que mais contrataram nos últimos anos, os grandes destaques foram planejamento financeiro e novos negócios.
Remuneração em finanças – Em 2016, acrescentou Felipe Brunieri, o aumento do pacote total de benefícios para executivos financeiros foi de 10% a 20%. Com relação a quem estava desempregado antes de ser contratado, o decréscimo do pacote foi de apenas 5% a 10%.
“Observamos que a queda do pacote de benefícios não foi tão grande com relação a quem estava desempregado. Isso porque as empresas estão preocupadas com a retenção dos profissionais. Elas não querem contratar alguém que aceite uma remuneração muito abaixo e logo depois vá embora”, ressaltou o gerente da divisão de finanças da Talenses.
Contudo, de forma geral, complementou Alexandre Benedetti, os bônus dos executivos reduziu consideravelmente e há retração no pacote de remuneração em empresas multinacionais e nacionais de grande porte. Isso porque, com a diminuição de seus faturamentos, muitas companhias estão buscando altos executivos com um custo menor.
Mulheres no mercado de trabalho
Dentre os dados que chamam a atenção, está o fato de as mulheres representarem ainda a minoria contratada para cargos de diretoria (18%) e gerência sênior (31%). A equidade na contratação de homens e mulheres também não foi alcançada em nível de gerência e coordenação, onde elas representam 40%.
Rodrigo Vianna, sócio-fundador da Talenses e membro da Aliança pelo Empoderamento das Mulheres, destacou que as decisões de recrutamento são majoritariamente tomadas por homens. E, de forma geral, ainda existe predileção pelo sexo masculino para o preenchimento de cargos de nível sênior.
Contudo, os últimos anos têm apontado uma mudança no perfil das contratações feitas por homens. De acordo com os dados da Talenses, em 2013, os recrutadores homens contrataram em média 74% de homens e 26% de mulheres. Já em 2017, o quadro se inverteu: os recrutadores passaram a contratar 56% de profissionais do sexo feminino e 44% do sexo masculino. Ou seja, eles agora recrutam mais mulheres do que homens.
Por outro lado, os recrutamentos feitos por mulheres demonstram que elas ainda contratam mais profissionais do sexo masculino do que feminino. Em 2017, as recrutadoras contrataram 57% de homens e 43% de mulheres.
Vianna destacou que a influência para uma maior contratação de mulheres nas organizações geralmente vem do alto escalão. “As empresas que tiveram sucesso em políticas de empoderamento feminino contavam com CEOs que tinham interesse genuíno por esta causa”.
Transformações em curso – Rodrigo Vianna observou que a mulher ingressou tardiamente no mercado de trabalho, um dos motivos para que os homens ainda sejam a maioria nos cargos de alto escalão. “Mas constatamos que nos primeiros níveis já está acontecendo um processo de transformação: a base que está sendo formada é igualitária na proporção de homens e mulheres contratados”.
Para o sócio da Talenses, a expectativa é que em 10 anos a quantidade de homens e mulheres em posições de alta gestão será mais equilibrada. “É um processo. Os movimentos de equidade de gênero estão cada vez mais fortes e tendem a se tornar consenso”.
Vianna destacou que o objetivo da Aliança para Empoderamento da Mulher é apresentar práticas bem-sucedidas nesta área para as organizações. A meta é influenciar cada vez mais empresas de que as políticas de empoderamento feminino podem ser uma ferramenta de performance e produtividade fora da curva.
Alta performance x alto potencial – O sócio-fundador da Talenses citou que as mulheres normalmente fazem parte da maioria do grupo de alto potencial de colaboradores de uma empresa, mas não do grupo alta performance. E isso se dá as vezes pelo fato de não encontrarem apoio da organização para continuarem seu desenvolvimento em linha com as mudanças no campo pessoal.
Dentre os estudos que estão em andamento pela Aliança, está a pesquisa sobre desligamento de mulheres em organizações, realizado em parceria com a Fundação Getúlio Vargas. Para este estudo, o especialista já entrevistou cerca de 25 executivas.
Ele apresentou o resultado da primeira etapa da pesquisa, que consistiu em entrevistas com 15 mulheres que ocuparam cargos de alta gestão em grandes empresas, realizadas quatro ou cinco anos após a data de seu desligamento.
Os principais motivos para a saída da empresa, segundo as entrevistadas, foram o conflito com: vida pessoal (9), crescimento profissional (3), qualidade de vida (2) e remuneração (1).
Para mais da metade das respondentes (8), o fato de ser uma mulher em um cargo de alto escalão teve alguma ligação com seu pedido de demissão.
Questionadas se a empresa em que trabalharam tinha ou apoiava políticas de empoderamento feminino, 10 responderam que sim, a organização tinha essa bandeira, mas não havia incentivo real. “Ou seja, faltava o walk the talk, a empresa realizar ações efetivas, em linha com o seu discurso de empoderamento”, observou Vianna.
Com relação às práticas recomendadas para as empresas que desejam começar a trilhar esse caminho, o sócio da Talenses destacou a importância de começar a ouvir.
“É importante que as altas lideranças, em especial o CEO, tenham interesse e abram suas agendas para escutar as pessoas. Sugestões de práticas temos inúmeras, mas vemos que o interesse genuíno do presidente é o que fez a diferença para o sucesso dessas políticas”, concluiu Rodrigo Vianna.
Durante o debate, a associada Cida Hess citou também alguns exemplos de políticas sugeridas pela KPMG Network of Woman (KNOW) para o empoderamento: implantar um comitê de diversidade, colocar em prática os seis meses de licença maternidade, e promover reuniões mensais para discussão do tema, com o patrocínio da alta administração da empresa.
(Reportagem: Débora Soares / Fotos: IBEF SP)