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Por Flávio Calife, economista da Boa Vista SCPC
Apesar das dúvidas em relação à retomada mais robusta da atividade econômica, já é bem claro que o mercado de crédito assumiu uma dinâmica de crescimento própria desde meados do ano passado, principalmente quando falamos de pessoas físicas. E já podemos também observar melhoras importantes para o crédito às empresas.
Mas de fato, o que diferencia o mercado de crédito no início de 2018 do mercado de crédito em 2017?
Olhando com detalhes o indicador de demanda por crédito do consumidor elaborado pela Boa Vista SCPC, medido a partir da quantidade de consultas de CPFs pelas empresas à base de dados da Boa Vista, percebemos que a inversão do movimento de queda na demanda já vem ocorrendo sistematicamente há quase um ano. A demanda do consumidor por crédito chegou a recuar 15% em dezembro de 2016 na comparação com os 12 meses anteriores, mas começou a reverter a queda no primeiro trimestre de 2017. A recuperação foi gradual e contínua, e o indicador já aponta crescimento de 2,7% em março de 2018.
Levando em conta somente os dados do início de 2018, a demanda por crédito do consumidor cresceu 4,3% no primeiro trimestre na comparação com o mesmo período do ano anterior. Quando dividimos o indicador pelos segmentos que o compõem, financeiro (inclui bancos e financeiras) e não financeiro (majoritariamente varejo, mas conta também com telecom e outros), vemos uma retomada mais clara na demanda por crédito no segmento financeiro, 9.8% de crescimento no primeiro trimestre (contra o mesmo período do ano anterior) e 0,5% de crescimento do segmento não financeiro.
O aumento na tomada de crédito reflete o aumento no consumo nos últimos meses. O indicador de movimento do comércio da Boa Vista mostra um crescimento de 5,3% no primeiro trimestre do ano na comparação com o ano passado. Em 2017 o resultado no mesmo período tinha sido negativo em 4,2%.
A boa notícia é que esse aumento na demanda por crédito tem obtido respaldo na oferta de crédito dos concedentes. Os bancos que se tornaram altamente restritivos e criteriosos em relação aos empréstimos nos últimos anos já dão sinais claros de expansão das linhas de crédito e da redução do rigor das operações. Para os consumidores estas decisões de afrouxamento já vêm sendo sentidas há meses. A novidade é que agora o crédito começa a fluir com mais intensidade também para as empresas.
As concessões de crédito livres para as pessoas físicas, levando-se em consideração a comparação acumulada de 12 meses contra os 12 meses anteriores já atingem um crescimento de 10,2%, e são positivas desde março de 2017.
As concessões para as empresas por sua vez, só começaram a entrar em território positivo, na mesma base de comparação a partir de janeiro de 2018, refletindo os riscos muito maiores associados aos empréstimos para as empresas, já que a inadimplência dessa modalidade vinha em crescente crescimento.
Mas talvez mais importante do que a retomada das concessões, seja o fato de que elas venham acompanhadas de uma significativa queda na inadimplência do sistema financeiro.
Se a inadimplência das pessoas físicas segue trajetória de queda desde pelo menos o final de 2015 e atingiu a mínima histórica da série em março de 2018 (5,1%), a inadimplência das empresas seguiu rumo diferente e subiu quase ininterruptamente nesse mesmo período, passando de 4,5% em dezembro de 2015 para 5,96% em maio de 2017, ultrapassando pela primeira vez a inadimplência dos consumidores. Mas de lá para cá engatou uma saudável tendência de baixa e recuou fortemente nos últimos meses, chegando a 4,4% em março de 2018.
O que temos afinal é um novo cenário de crédito, com concessões em alta e inadimplência em baixa. É claro que o que mais se espera é que esse cenário ajude a derrubar os spreads bancários, velha luta do sistema financeiro e preocupação central da agenda atual do Banco Central. Os juros e os spreads já caíram bastante nos últimos anos, mas ainda permanecem em patamares elevados. Com a melhora da saúde interna do mercado de crédito, e a recente queda da taxa Selic, a influência sobre os determinantes dos spreads deve aumentar e permitir uma redução mais rápida dos juros aos consumidores e empresas.