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CFO tem papel relevante na promoção da cultura organizacional

Para que a cultura de uma organização seja disseminada pela companhia e tenha resultados efetivos, o C-Level possui um papel relevante. O tema “O papel do CFO na transformação cultural das organizações” foi discutido em webinar do Núcleo de Desenvolvimento CFO, uma iniciativa para educação continuada de CFOs certificados pelo IBEF SP, visando levar atualizações e conteúdo aos executivos financeiros. Karin Karay, líder da prática de CFOs da Spencer Stuart, mediou o painel.

Para entender melhor os desafios de alinhar a cultura organizacional aos objetivos estratégicos, missão, valores e propósito de uma empresa, Laura Menezes, Managing Partner da Spencer Stuart, explica que cultura é um elemento crítico na agenda organizacional, mas por sua natureza complexa e abstrata, é de difícil gestão. “Durante décadas o tema cultura vem sendo descrito como importante mas, em 2020, dado o cenário de mudanças de liderança e de modelo organizacional, volatilidade e disrupção, estamos vivendo a tempestade perfeita que faz com que a maioria das  organizações precise revisitar e rever a sua cultura organizacional”.

Nesse contexto, a diferença entre uma organização com cultura forte e alinhada e uma com cultura menos estabelecida pode ser percebida ao analisarmos indicadores de sucesso e performance. Laura explica que estudos mostram o grande impacto que a cultura tem em indicadores relevantes, como receita, empregabilidade e valor. “A definição de cultura contém premissas compartilhadas que determinam pensamento, comportamento e a ação dentro de uma organização, são regras não escritas”, diz, reiterando que cultura muitas vezes se confunde com missão, valores e propósito.

Laura diz ainda que no processo de transformação cultural das empresas, o Conselho, CEO e a liderança  executiva tem o papel de definir e disseminar a cultura para toda organização, e o papel do CFO nesse processo também é fundamental. “É preciso ter uma conexão clara entre cultura, estratégia e estrutura. Estamos falando sobre sistemas de compensação, métrica, como medir o sucesso, e isso pode estar na agenda dos CFOs. A cultura também tem que ser vista como um processo contínuo e não um evento ou programa”, destaca. 

Liderança – Frederico Oldani, CFO da Qualicorp, reitera que cultura é uma das principais responsabilidades de todo executivo. “Cultura tem muito a ver com o que não está escrito, com a forma que a companhia de fato funciona. Você pode ter uma cultura escrita, mas sem que na prática, as coisas funcionem exatamente da forma que se gostaria”. Segundo ele, o grande papel do CFO e de todo o C-Level é disseminar a cultura, que tem muito a ver não só com o que está escrito, mas principalmente em como você efetivamente age, a liderança pelo exemplo, o conceito de “walk the talk”. “Isso tem um papel fundamental sobre de como a cultura se propaga e acaba por impactar toda a organização”.

Em organizações que contam com um modelo de alinhamento cultural, há maior flexibilidade e estabilidade, segundo Laura, mas por outro lado, há organizações que valorizam a interdependência ou a independência. “Temos culturas efetivas, corretas e adequadas para todos. O mais importante é a cultura estar alinhada ao modelo de negócio à estratégia. Na prática, líderes e fundadores das organizações contam publicamente as suas percepções e sentimentos sobre cultura, de forma intencional ou não”, diz. 

O gestor deve garantir alinhamento com as metas da companhia, conforme comenta José Filippo, CFO da Natura. “Quem não está alinhado com isso, acaba sujeito a uma seleção natural. É difícil manter pessoas que não estão alinhadas, então, na medida em que a cultura é percebida e validada, ela acaba protegendo a companhia”, diz.

Do ponto de vista de finanças, Filippo diz que indicadores ajudam na determinação de metas de engajamento em determinados temas, como sustentabilidade. “Na área financeira, garantimos a aferição desses indicadores”. De maneira geral, Filippo destaca que a liderança deve oferecer apoio aos aspectos de cultura da organização. “A cultura é algo que você respira e vive. E a capacidade da liderança e da área financeira de promover isso é muito grande”.

Transformação cultural – Laura destaca que entre as alavancas fundamentais no processo de transformação cultural está a clareza. “O que se quer efetivamente. É preciso articular onde se quer chegar em termos de cultura e estratégias”. Ela cita também comunicação; os modelos de incentivo, ou seja, como premiar as pessoas e incentivá-las financeiramente e culturalmente; e liderança como pontos importantes nesse processo. “É super importante identificar influenciadores, pessoas em posições-chave que devem inspirar, pois aprender cultura é olhar para cima e ver como são os comportamentos. Essa inspiração que fomenta a cultura, principalmente, no longo prazo”.

Na Qualicorp, Frederico conta que há um processo de transformação organizacional baseado em três pilares: estratégia de negócios, governança e cultura, sendo a cultura o vetor de transformação do negócio a partir de um novo modelo de atuação. “Estamos saindo de um modelo de gestão verticalizado para um modelo bem mais horizontal, simples e ágil. As pessoas têm um papel chave nessa construção. Em relação ao papel do CFO, monitorar o desempenho organizacional a partir de indicadores é um dos principais objetivos da área financeira e, nesse sentido, a maioria das organizações já acompanha indicadores operacionais e financeiros tradicionais, mas o desafio é ir além e incorporar métricas de cultura, pessoas e clima organizacional como parte do rol de indicadores chaves de desempenho”. Frederico diz ainda que “qualquer processo de transformação do negócio precisa de um bom alinhamento entre os membros do C-Level e também aos valores e à cultura da companhia”.

Frederico fez sua transição para a Qualicorp em meio a pandemia, momento em que a empresa teve que readaptar seu modelo de trabalho para o modelo virtual via home office. “O ponto negativo é a falta do contato físico, de conhecer o time e interagir com as pessoas, principalmente em um momento de transição. Por outro lado, o modelo virtual trouxe algumas possibilidades interessantes que facilitaram alguns aspectos da integração e também acabam por ajudar bastante no processo de comunicação”, conta. “Por exemplo, deixamos de ter limitações em relação à presença física ou ao número de pessoas presentes em uma reunião. Hoje conseguimos fazer reuniões com todas as lideranças na companhia ao mesmo tempo, algo praticamente impossível no modelo tradicional, fazemos lives semanais com todos os funcionários o que ajuda muito na disseminação de informações, objetivos, além de valores e aspectos culturais”.  

Ele destaca que o onboarding virtual ajudou muito no sentido de permitir o relacionamento entre várias áreas, o que no presencial talvez não fosse possível. “A grande perda é na relação interpessoal”. Frederico diz, contudo, que o modelo de trabalho deve sofrer profundas mudanças e não deve voltar ao modelo tradicional, mas um meio termo combinando os melhores aspectos do modelo tradicional e o virtual. “Provavelmente, não será necessário estar 100% do tempo no escritório que deve passar a servir como ponto de encontro, de relacionamento entre as pessoas, mas com boa parte do trabalho podendo ser feito de forma remota. O desafio é achar o ponto ótimo”.

José Filippo também conta que passou pelo desafio de chegar na Natura já em meio a uma mudança de estrutura com a aquisição da The Body Shop e, posteriormente, a incorporação da Avon, o que levou a um salto no processo, combinando operações com culturas muito fortes. “Nessa situação, é preciso manter a geração de valor e garantir um alinhamento de cultura, que não é um manual escrito, mas tem que ser percebido. Trabalhamos muito isso na experiência do grupo. Tivemos um processo pré-conclusão do negócio da Avon, entrevistando lideranças onde um dos quesitos era alinhamento cultural. Buscávamos pessoas que pudessem gerar valor dentro do ambiente cultural”, relata.

Papel do C-Level junto ao Conselho – Filippo destaca que cada vez mais o conselho das empresas tem proximidade com a gestão, e que é preciso também trabalhar o alinhamento cultural com o board. “O conselho já se constrói dentro desse alinhamento e, desta forma, possibilita que se trabalhe com temas de cultura dentro da pauta das reuniões”, diz. Ele ressalta ainda que uma forma dos conselhos se relacionarem com a gestão é através de comitês, sejam eles financeiros, de pessoas, de estratégia, de governança, entre outros. “Essa é uma maneira de ter discussões sobre temas específicos”.

A determinação de indicadores que possam medir o desempenho de uma organização nos aspectos culturais, como diversidade, inclusão, etc., é um tema a ser trabalhado dentro dos conselhos das empresas e que deve ser apoiado pelo CFO. Filippo diz que não há conflito entre indicadores de cultura e indicadores econômicos e financeiros. “É mais uma questão de posicionamento e de visão. Cada vez mais, do ponto de vista externo às empresas, principalmente em companhias abertas, há um interesse e até uma exigência por parte do mercado, seja de fornecedores ou investidores, em se ter esse posicionamento cultural e sustentável. Isso gera uma natural mudança em aceitar outros aspectos e indicadores diferentes dos tradicionais”, diz.

Já Frederico complementa dizendo que para empresas que tem um modelo forte de gestão, a cultura é um grande direcionador dos resultados. “Acreditamos claramente que não chegaremos aos resultados desejados sem mudarmos nosso modelo de atuação. As empresas que não se adaptarem a essa realidade terão muitas dificuldades no futuro”, destaca.

Laura ressalta que o tema de cultura de fato têm subido para o conselho, mas que é preciso entender como medir esse indicador dentro das organizações. “A cultura é um facilitador, não é um KPI. É algo sistêmico e orgânico que vai fazendo com que se chegue aos resultados, e o próprio conselho percebe isso. E nos últimos anos, fazendo avaliações nas companhias, temos discutido a cultura do próprio conselho. É um tema que cada vez mais vem subindo e passa a ser uma métrica que o próprio conselho tem imposto no sentido de acompanhar e monitorar as organizações”.

Diante desse cenário, o CEO faz uma ponte entre o conselho e a gestão, levando a informação para as duas pontas, com um papel importante nesse alinhamento. “O CEO deve estar alinhado com o conselho buscando apoio e orientação para temas específicos”, diz Filippo.

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