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Fazer a gestão de aspectos ambientais, sociais e de governança requer investimentos, mas qual seria o custo de não investir em ESG? Essa foi uma das reflexões da live “CFO Trends – ESG: O que se espera do CFO”, patrocinada pela KPMG no Brasil.
O webinar, realizado no último dia 5 de novembro, abordou as responsabilidades e o que se espera do principal executivo financeiro das empresas, para a criação de valor do negócio a longo prazo à luz dos aspectos ESG.
A live teve como speakers Nelmara Arbex, sócia-líder de ESG Advisory da KPMG no Brasil, e Charles Krieck, presidente da KPMG no Brasil e na América do Sul. Mário Mafra, vice-presidente de Finanças do IBEF-SP, foi responsável pela moderação do evento.
Origens do movimento e seus marcos
Nelmara Arbex explicou que a agenda de sustentabilidade surgiu na década de 1940, quando a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada pela ONU e pelos países signatários, que, por sua vez, se comprometeram a garantir “qualidade de vida” aos seus cidadãos – iniciativa descrita detalhadamente nos 30 artigos que compõem a Declaração. Em 1962, Rachel Carson publicou a primeira obra para o público em geral – “A Primavera Silenciosa” – na qual descreve como os poluentes impactam a natureza, os ecossistemas e os humanos.
Dez anos depois, na publicação “Os Limites do Crescimento”, Donela e Dennis Meadows, Jorgen Rangers e William Behrens III abordaram os limites do planeta em contradição com nossos modelos de desenvolvimento, que o tratam como infinito. O Relatório Brundtland (Our Common Future), de 1983, afirmou que o modelo de desenvolvimento que adotamos e a pobreza reduziam a sustentabilidade ambiental e social, sendo necessário um equilíbrio entre economia e ecologia: “um modelo de desenvolvimento que atenda às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades”.
Essa discussão de especialistas e líderes governamentais migrou para o mundo dos negócios, por exemplo, no trabalho publicado em 1971 por Klaus Schwab, introduzindo a discussão sobre a empresa do futuro e utilizando o conceito de stakeholder. Depois, passou por John Elkington que, em 1998, escreveu “Cannibals with Forks: The Triple Bottom Line of 21st Century” alertando que as empresas não podem focar somente no lado financeiro. Enfim, em 2004, houve a publicação da ONU “Who Cares Wins”, relatório originado do Pacto Global que, de forma inédita, abordou os fatores ESG – fatores que os investidores deveriam levar em consideração ao avaliarem riscos e seus futuros investimentos.
“Uma agenda que fala de qualidade de vida e de limites do planeta se transformou em uma agenda para o mundo dos negócios, uma discussão sobre como os negócios vão lidar com esses desafios que estão colocados. Existe uma expectativa ou até uma necessidade de que as organizações ajudem a resolver os problemas da sociedade, ponto em que os negócios acontecem”, contextualizou Arbex.
Reputação e guerra por talentos – Charles Krieck salientou a importância atual e futura do ESG, afirmando ser necessário “internalizar o tema, pois ele é vital”. Na visão do CEO, o assunto sempre esteve presente na pauta dos executivos, mas está adquirindo maior permeabilidade no mercado e no consumidor.
O assunto pode afetar seriamente as empresas, a começar pela reputação, com o advento das mídias sociais que podem amplificar as ações corporativas que ferem os princípios ESG. “Ter uma estratégia vinculada ao tema está se tornando natural; não a possuir se tornará excludente e pode até manchar a reputação das organizações”, alertou. Outro ponto destacado por Krieck é acerca da “guerra de talentos”. Agravada pelos problemas educacionais brasileiros, a disponibilidade de talentos – tanto em qualidade quanto em quantidade – mostra-se um desafio para as empresas, que poderão se valer do ESG como fator de atração e de retenção dos profissionais mais talentosos.
Performance e prêmio financeiro – Com relação ao mercado, o presidente da KPMG relatou que a não observância dos princípios ESG pode afetar a aceitação de produtos das empresas por parte dos consumidores, além da organização ser penalizada em termos de valorização de suas ações e com maiores taxas de juros em eventuais operações financeiras. “Uma empresa que comprovadamente respeita o ESG terá acesso facilitado ao capital. Além disso, estudos apontam que no futuro o capital talvez não esteja disponível para empresas que não tenham tal responsabilidade”.
Segundo Arbex, desde 1992 é possível identificar um descolamento positivo – progressivamente maior – na performance das ações de empresas que atuam em conformidade com princípios de sustentabilidade. “O mercado está disposto a pagar mais pelas ações das organizações com gestão ESG e, além disso, os fundos com critérios de seleção relacionados ao tema tem tido melhor performance que a seleção S&P 500 nos Estados Unidos, principalmente durante a atual crise”, afirmou.
Gestão ESG – Nelmara Arbex chamou a atenção para a gestão ESG, afirmando que ela se refere aos aspectos ambientais, sociais e de governança em torno dos negócios. Eles podem ser exógenos, ou seja, aspectos externos que impactam a empresa ou endógenos, isto é, impactos ESG causados pela atividade da companhia. Segundo a especialista, “a forma de gestão dos princípios ESG se tornou uma forma de avaliar a qualidade da liderança e sua capacidade de adaptação ao novo contexto dos negócios.”
Confiança e expectativas – Arbex apresentou os resultados de uma pesquisa realizada pela Edelman Trust Barometer, a qual buscou identificar com a sociedade brasileira os problemas mais urgentes a serem enfrentados. Em ordem de importância, os entrevistados elegeram a saúde, a educação, a pobreza, as mudanças climáticas, as fakes news, as disparidades socioeconômicas, a proteção das liberdades individuais e o combate à discriminação como os temas mais relevantes.
Outro dado de destaque apontado pela pesquisa diz respeito à confiança da população e ao papel dos executivos. Segundo a enquete, no Brasil, as empresas são as instituições que apresentam maior índice de confiança – superando ONGs, mídia e governo – e 90% dos entrevistados esperam que os CEOs se manifestem publicamente sobre questões relevantes para a sociedade. “Espera-se que as organizações e os CEOs preencham o vazio deixado pelo governo. O valor das empresas está relacionado com os stakeholders. Então, se isso é tão importante, os líderes precisam entender as expectativas deles”, afirmou Arbex.
Estágios para geração de valor – A executiva destacou que as empresas apresentam respostas diversificadas à temática ESG. De modo geral, Arbex afirmou que existem quatro estágios vinculados a um aumento progressivo na geração de valor total da empresa: (i) compliance e eficiência, no qual se busca reduzir custos e mitigar multas; (ii) gestão ESG, com a qual a empresa procura novas metas e processos para acessar novos mercados, clientes, talentos etc.; (iii) visão ESG, que busca a geração de valor financeiro, social e ambiental em toda a cadeia de valor; (iv) por fim, o estágio do impacto positivo, quando a organização redesenha seu negócio e propósito, visando resultados positivos para a sociedade, a regeneração do meio ambiente e o tecido social.
Atuação do CFO – Arbex disse acreditar que o CFO deve “saber fazer as perguntas certas” e que a relação dos executivos com a agenda ESG é crucial: “Existe uma conexão consistente da agenda dos CFOs com essas questões que representam riscos financeiros para o negócio, mas também oportunidades. Por isso, as responsabilidades do CFO estão profundamente conectadas com a pauta ESG. O CFO deve entender quais são os principais riscos sociais, ambientais e de governança aos quais o negócio está exposto e quais são as oportunidades que podem se apresentar”.
Krieck complementou que o CFO, o CEO e os membros do conselho de administração devem ter clara qual é a estratégia ESG da empresa e, principalmente, se ela está adaptada ao negócio. Tendo esses aspectos, o próximo passo é estipular metas, pois “aquilo que não é mensurável, não será cumprido”.
Em seguida, o presidente da KPMG destacou ser fundamental que os executivos se questionem sobre os riscos de não cumprir as metas e quais as alternativas para gerenciar tais riscos. Por fim, ele ressaltou a importância da comunicação, seja externa (por meio de relatórios para o mercado), interna, “para que nossa força de trabalho entenda o que fizemos, o que é o ESG e se engaje. Se esses processos estiverem bem desenhados, a empresa estará bem posicionada”.
O vídeo da live será disponibilizado para acesso exclusivo dos associados do IBEF-SP.