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O ano começa com otimismo cauteloso. CFOs e CEOs de grandes companhias do País, que integram a Diretoria Vogal do IBEF SP, compartilharam suas experiências e projeções para os próximos meses em reunião virtual realizada no dia 26 de fevereiro. O evento foi patrocinado pela empresa Accountfy.
Esse foi o último encontro da Diretoria Vogal da gestão 2018-2021, que passará por renovação com início de novo mandato no IBEF (2021-2023) a partir deste mês de março.
“2020 foi um ano muito importante para nós. Conseguimos colocar a Diretoria Vogal em formato online, quando todos passamos por essa pandemia e os CFOs precisavam trocar experiências”, destacou Luciana Medeiros, 1ª vice-presidente da gestão que se despede da função, ao agradecer todos os membros da Diretoria Vogal. Ela assume o posto de primeira mulher presidente, na história do IBEF SP, nesta gestão que se inicia.
Forte preservação do caixa é lição de casa – CFOs de diversos setores relataram que, face à queda dos mercados na fase mais aguda da pandemia em 2020, foram tomadas diversas medidas para preservação do caixa, como campanhas de cobrança, downsizing e reestruturação.
No setor de saúde, por exemplo, os custos diretos explodiram com o impacto cambial e a alta demanda por equipamentos diretamente ligados ao combate da pandemia. “Foi um ano de muito foco no caixa”, observou Magali Leite, CFO da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, ressaltando que as medidas de austeridade implementadas, somadas ao trabalho de reperfilamento da dívida, possibilitaram à companhia fechar 2020 com Ebitda positivo e ter liquidez para acelerar seus projetos de expansão em 2021.
O setor de aviação, outro fortemente impactado pela pandemia, registrou retomada no último trimestre de 2020 e início de 2021. Com o agravamento da pandemia e a sazonalidade do mercado, a expectativa é de alguma desaceleração à frente. “Vivemos um momento híbrido: de olho na retomada, prontos para aumentar a capacidade e, ao mesmo tempo, prontos para o modo de crise, de preservação de caixa”, observou Alexandre Malfitani, CFO da Azul Linhas Aérea, ressaltando que a empresa conseguiu sair mais forte do primeiro ano de crise.
Indústrias lidam com escassez de estoques – A “lição de casa” de redução de custos, somada à forte injeção de liquidez na economia proporcionada pelo auxílio emergencial pago pelo governo e o aumento da poupança das famílias, contribuíram para que várias indústrias registrassem recuperação vigorosa no segundo semestre de 2020, abrindo espaço para um clima de otimismo “moderado” no 1º trimestre de 2021.
Impulsionado pelo consumo, o setor de eletrodomésticos deve registrar crescimento em torno de 12% em 2020. “Tivemos estoques baixos, tanto na indústria quanto nos clientes, ao longo do 2º semestre, e eles ainda estão em recomposição neste momento”, observou Adolpho Neto, CFO da Whirpool. O executivo ressalta que a companhia tem trabalhado junto à cadeia de fornecedores para assegurar os suprimentos em 2021.
O setor automotivo, que recalibrou a produção durante a fase mais dura da pandemia, também registrou escassez de veículos no último trimestre. “Se a média era ter 40 mil carros em estoque, fechamos com menos de 1000 unidades em dezembro. Isso nunca aconteceu na história, em quase 70 anos de empresa. E apesar de toda a crise, fechamos 2020 com resultado financeiro que não tínhamos há muitos anos em caixa e resultado.”, observou Ciro Possobom, da Volkswagen, acrescentando que em 2021 já são sentidos desafios para o fornecimento e aumento de custos de matérias-primas diversas.
Desarranjo na cadeia global persiste – A acentuação dos desafios ligados à cadeia de suprimentos para recomposição dos estoques, somados à pressão cambial, também marcam este início de 2021. Há aceleração grande dos preços de matérias-primas básicas importantes, como aço e resinas, e também componentes eletrônicos. O custo do frete internacional disparou, impulsionando a necessidade de recomposição de preços na ponta.
Melissa Tsutsumi, CFO da Solvay, destacou que o setor químico, que registrou forte recuperação no final do ano, vê o 1º trimestre de 2021 ainda bastante forte, pois a demanda continua aquecida. “Hoje o grande risco é a capacidade do setor atender o aumento de demanda por escassez de produto”, notou. Eventos recentes, como a crise de energia gerada pela onda de frio que assolou o estado do Texas (EUA), paralisando diversas petroquímicas da região, devem contribuir para o delay no envio de matérias-primas para o Brasil.
Transformação digital se aprofunda nos setores – O uso da tecnologia digital para solucionar problemas, automatizar tarefas repetitivas e extrair mais inteligência da massa de dados disponíveis dentro e fora das organizações ganhou velocidade e prioridade em 2020. Essa tendência continua firme para 2021.
O setor do agronegócio tem sentido pouco os efeitos da pandemia e deve continuar a ser um dos carros-chefes da economia em 2021, com maior foco na digitalização. Rosana de Pádua, da Lavoro Agro, ressaltou o grande crescimento do e-commerce nesse mercado. “O agricultor está descobrindo uma nova forma de fazer negócios”.
Frente à virtualização dos negócios, CFOs ainda enfrentam desafios para a colaboração virtual em seus processos, sejam de Tesouraria ou Controladoria, e a tomada de decisão mais ágil, com melhores informações. Os líderes financeiros ainda gastam em média mais de 2 horas por dia trabalhando em planilhas, suscetíveis a riscos de segurança e erros manuais, alertou Goldwasser Neto, CEO da empresa Accountfy, plataforma SaaS que possibilita a automatização de demonstrações e análises financeiras.
Financeiros e cientistas de dados trabalhando juntos – Eduardo Guimarães, Diretor Financeiro da Unilever Brasil, observou que a empresa possui um programa de transformação digital na área financeira, envolvendo automatização e análise de dados. “Contratamos vários cientistas de dados para trabalhar conosco, para tornar a organização mais data-driven. Já vemos grandes benefícios e estamos encorajados em manter isso”. O time de finanças também está sendo capacitado para a linguagem do e-commerce, cada vez mais estratégico para o negócio.
As vendas pelo comércio eletrônico cresceram 75% em 2020, destacou Mauricio Fernandes, CFO da Mastercard Brasil, ao citar dados do índice Mastercard SpendingPulse. Essa expansão veio acompanhada da maior preocupação das empresas com a segurança nas transações não presenciais com cartões, com tokenização e novas formas de autenticação. O mercado de cartões cresceu 8,2% no ano. A Mastercard tem diversificado seus negócios para além dos meios de pagamento com cartões, investindo em produtos de inteligência artificial, biometria comportamental e análise de dados. “Nossa capacidade de gerar ferramentas para análise de dados torna-se cada vez mais relevante”, observou o CFO.
José Cláudio Securato, CEO da Saint Paul Escola de Negócios, ressalta que o ano de 2020 possibilitou uma grande experiência por parte de professores, alunos e escolas com a educação online, especialmente na iniciativa privada. A plataforma LIT de EAD Onlearning da Saint Paul, por exemplo, ganhou 130 mil novos alunos no período. “Estamos desenvolvendo uma empresa com cultura data-driven verdadeiramente, onde não só os cientistas de dados podem trabalhar, mas para que todos possam, dentro da sua capacidade, fazer análise de dados, teste de hipóteses e sair daquele conceito de intuição, baseado apenas em suas experiências”.
Cenário econômico – A maioria dos CFOs projetaram uma visão de otimismo moderado para o 1º e 2º trimestre do ano, dado que alguns setores já observam alguma desaceleração no consumo e incertezas no campo político e econômico prejudicam projeções de mais longo prazo.
Questões sobre a continuidade do auxílio emergencial e seus efeitos sobre os setores, o ritmo de vacinação da população, novas restrições de mobilidade para controle da pandemia e a evolução do cenário macroeconômico permanecem em aberto.
José Cláudio Securato observou que o País precisará encomendar mais PIB para 2021, o que deverá partir principalmente da iniciativa privada. O cenário para os próximos meses considera elementos como: alto índice de desemprego da população, pressões inflacionárias – face a necessidade de repasse do aumento de custos pelas indústrias e um possível novo impulso ao consumo com a prorrogação do auxílio emergencial. Posto isso, a previsão é de elevação da taxa de juros pelo Banco Central e a questão fiscal ainda preocupa, além de consequências do ruído político sobre os mercados.
“Temos um otimismo bastante cauteloso, sempre com olhar de curto prazo, pois não dá para enxergar muito à frente. É um movimento de recálculo de rota constante, o que dá mais trabalho para todos. Mas esse pedaço do Brasil (executivos financeiros) vai conseguir contribuir para o crescimento”, concluiu Securato, que assume a presidência do Conselho de Administração do IBEF SP neste mês de março.