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Como a estratégia equivocada destrói a riqueza do acionista

O aprendizado que o caso da Sadia traz tem sido perigosamente ignorado por muitas empresas tradicionais consideradas sólidas, mas que podem se desmanchar no ar ao primeiro sopro dos ventos de uma crise. Lucros no curto prazo, como os trimestrais, vêm e vão; sustentáveis são aqueles com foco em geração de valor com visão de longo prazo e perenidade.

O que cria valor ao acionista, assim, é a correta e consistente orientação na formulação estratégica com decisões focadas em geração de valor. Implica em uma dedicação operacional incessante para aumentar a produtividade dos ativos, gerenciando com excelência cada uma das operações por meio da remuneração variável da gestão, vinculando-a não ao lucro de um simples trimestre, mas ao mérito dos resultados econômicos, ou seja, geração de valor a longo prazo.

A punição para quem não adota formalmente a geração de valor ao acionista pode demorar, mas aparece. Soluções fáceis e resultados ilusórios são possíveis de obter, mas podem deixar a empresa vulnerável e ser engolida.

Vamos à análise dos fatos e seu histórico: o que aconteceu com a riqueza dos acionistas da Sadia? Em 1º de setembro de 2008, seu valor de mercado era de R$ 7,1 bilhões. Com a notícia dos derivativos divulgada pela empresa em 25 de setembro de 2008, seu valor despencou, chegando, em 30 de dezembro de 2008 (ou seja, em apenas três meses), a R$ 2,7 bilhões, equivalentes a 38% do valor original. Diante dessa situação, procura-se responder a questões como:

• Quais os motivos para essa expressiva destruição de riqueza? Eles são devidos às decisões internas da empresa ou a fatores externos?

• Qual é o nível ideal de liquidez que uma empresa deve manter? Ela deve procurar ser conservadora ou deve adotar políticas mais agressivas ou especulativas?

• Adotar estratégias diferentes às do mercado faz a empresa ser mais competitiva e contribui eficazmente para o crescimento de suas operações?

• Os resultados de uma política agressiva visando ganhos financeiros expressivos criam valor ao acionista ou podem destruir sua riqueza?

• É uma estratégia de sucesso a empresa manter, por um período superior a 12 anos, valores investidos no mercado financeiro que equivalem a 36% do valor do seu capital empregado?

• É sustentável manter somente 64% do capital nas suas atividades operacionais e, ao mesmo tempo, adotar níveis superiores de alavancagem financeira?

• Será que obter receitas financeiras expressivas é a melhor alternativa de ganhos, quando comparado aos resultados das atividades operacionais, as atividades core?

• São os ganhos financeiros ou os resultados operacionais (foco no core business) que criam valor ao acionista?

O nível de informações da estrutura das demonstrações financeiras

Respostas às perguntas podem ser obtidas pela análise criteriosa do comportamento das demonstrações financeiras pela estrutura dos seus ativos, passivos e resultados da Sadia publicados no período de 1996 a 2007.

Avaliados com base na análise financeira tradicional, podem ser considerados adequados os resultados, entretanto, quando se decompõem os lucros totais da Sadia, identifica-se que as receitas financeiras contribuíram em média com 43% e os resultados das atividades operacionais, somente com 57%1.

Pode-se concluir que o direcionamento estratégico da Sadia foi alocar, de maneira mais significativa do que a média das empresas, seus recursos para aplicações financeiras. Este viés foi ainda mais expressivo no período de 1996 a 2000.

Comportamento da alavancagem financeira e do capital empregado

Observa-se, no período de 1996 a 2007, que a estrutura de financiamento da Sadia possuía um nível de alavancagem financeira com características mais agressivas em relação ao mercado, dado que seu comportamento apresentou as seguintes proporções (conforme a Tabela 6):

• 46% para o patrimônio líquido (PL);

• 26% para os financiamentos de longo prazo (FLP);

• 28% para os financiamentos de curto prazo (FCP).

Se compararmos que naquele período a Sadia tinha 64% do capital empregado investido nas atividades operacionais (Tabela 2) em contraste com a estrutura de capital de 72% (PL + FLP), é possível concluir que a Sadia dispunha de recursos mais do que suficientes para bancar os investimentos necessários do capital operacional.

Portanto, será que havia necessidade de manter e ainda assim buscar empréstimos de curto prazo no nível de 28% das obrigações totais e, ao mesmo tempo (vide Tabela 6), aplicar no mercado financeiro, mantendo ativos financeiros no valor equivalente a 36% dos ativos totais? (Tabela 2.)

Diante dessas relações, percebe-se que alavancar financeiramente a empresa visando obter receitas financeiras a qualquer custo foi um objetivo desejado. Esse fato ficou demonstrado pela excessiva atenção dada aos resultados das operações financeiras (conforme a Tabela 3). Assim, pode-se também inferir que houve maior direcionamento ao financeiro em detrimento das atividades operacionais.

Assim sendo, será que a vocação da empresa ficou dividida?

Qual foi a importância dada às atividades operacionais em face do impacto recorrente dos resultados financeiros obtidos?

Será que os gestores imaginaram que poderiam criar valor ao acionista se dedicando a outras atividades que não o seu core business?

tabela-2

Sabe-se que empresas competitivas mantêm-se atentas a estratégias inovadoras que garantam sucesso com sustentabilidade em suas atividades core business. Vendem-se aquelas não core, obtendo como consequência aumento na riqueza aos acionistas, herdeiros e stakeholders.
Analisando-se o comportamento histórico das demonstrações financeiras publicadas (Balanço Patrimonial,
Resultados e Fluxo de Caixa), parece que a Sadia, na realidade, acabou por montar uma armadilha, que foi imperceptível para ela própria.

Como isso foi possível? Será que ocorreu algo totalmente inesperado? Todos sabem que, em negócios, as relações entre os níveis de risco-retorno são indissolúveis. Sua análise, controle, definição e formas de mitigar o nível de exposição da empresa aos diversos riscos são opções dos gestores de cada empresa.

A notícia divulgada pela Sadia nos jornais em 25 de setembro de 2008 comunicando sua exposição nas operações em derivativos “tóxicos” e relatando, na oportunidade, um prejuízo financeiro na ordem de R$ 760 milhões surpreendeu tanto os analistas quanto os investidores menos informados sobre os fundamentos da Sadia.

Sinalizou uma situação delicada, uma imensa perda originada no risco de suas atividades financeiras que, até então, não tinham sido percebidas por não estarem transparentes nas demonstrações financeiras, nem mesmo em suas notas explicativas2. Também apontou que a estratégia adotada pela gestão da Sadia estava focada no financeiro, entendendo-se que seus resultados poderiam estar sub judice, uma vez que naquele comunicado estava exposto um potencial de risco financeiro que já estava assumindo, enfim, a vocação financeira em contraste com as atividades core.

As informações obtidas das demonstrações financeiras das empresas apresentam evidências de comportamento

O desfecho e a abertura das informações das demonstrações financeiras publicadas poderão ser entendidos com maior profundidade por meio dos dados históricos atualizados, compreendendo o período de 1996 até 2007, de acordo com a análise das Tabelas de 1 a 7, em que se demonstram as evoluções, as composições, os contrastes e seu comportamento econômico-financeiro no tempo.

Assim, considerando-se o ocorrido, pode-se inferir que houve uma excessiva confiança nos resultados históricos obtidos pelas operações financeiras. Esse fato não deve ter sido captado pelos modelos de riscos utilizados ou mesmo pelo nível de governança corporativa da empresa, instrumentos que no seu conjunto se revelaram falhos e inseguros, tendo como resultado perdas financeiras muito expressivas e, por consequência, destruição relevante da riqueza do acionista.

Percebe-se, inclusive, que as complexidades dos instrumentos financeiros se intensificaram mais do que a capacidade técnica e operacional dos seus gestores em administrá-los.

A fragilidade e o risco financeiro incorrido em suas decisões financeiras em meio às turbulências dos mercados levaram a Sadia a um nível inesperado de endividamento no curto prazo, um excessivo e perigoso nível de alavancagem financeira. Esse endividamento surgiu das expressivas perdas financeiras dos contratos de derivativos “tóxicos”, ocasionando progressiva perda do valor de mercado da companhia, uma vez que, em 30 de dezembro de 2008, a Sadia valia somente 38% do seu valor de três meses antes (1º de setembro de 2008).

Embora anteriormente a Sadia tenha crescido em suas atividades operacionais, observa-se que, no período de 2000 a 2005, ela não conseguiu crescer em vendas líquidas mais que a sua concorrente, a Perdigão. Nessa fase, a Sadia perdeu 15% do crescimento das vendas.

Entretanto, quando se analisa o comportamento do crescimento de vendas, essa distância fica ainda maior no período de 2006 a 2008, quando a Perdigão reage com sua estratégia, obtendo um crescimento operacional de suas vendas líquidas 73% superior ao da Sadia.

Dessa forma, o comportamento e o crescimento operacional comparados entre as duas empresas expõem o direcionamento e a estratégia adotada pela Sadia, uma vez que as atividades financeiras historicamente sempre tiveram participação relevante nos seus negócios. Essa situação deve ter proporcionado tanto aos gestores quanto aos acionistas o entendimento de que a empresa sabia ganhar dinheiro com o financeiro, ou seja, contabilmente ganhavam mais dinheiro nas atividades financeiras que na própria atividade operacional.

Analisando-se as evidências empíricas constantes do banco de dados3 e comparando-as com as da Sadia, foi possível identificar algumas informações relevantes e de comportamentos distintos. Assim, as informações da Sadia podem ser comparadas e contrastadas com as das 35 empresas do estudo atualizado para o ano de 2007, como pode ser observado nas tabelas comparativas a seguir, em que se decompõem a análise e o comportamento das empresas em quatro períodos distintos, iniciando-se em 1996.

A primeira comparação está demonstrada na Tabela 1. Refere-se ao comportamento dos recursos aplicados pelas empresas da amostra e na Tabela 2 pela Sadia. O capital operacional refere-se ao capital de giro operacional mais os ativos não circulantes e os “ativos financeiros” ao valor das disponibilidades e aplicações financeiras.

Nessa tabela, observa-se que, entre 1996 a 2000, logo após o Plano Real, as empresas tinham, em média, do capital total empregado, 14% dos seus recursos em ativos financeiros e 86% nas suas atividades operacionais, tendo, no período de análise de 2000/2007, diminuído a proporção de ativos financeiros para 11%, aumentando a proporção dos capitais operacionais para 89% do capital investido.

Assim, comparando o comportamento médio das empresas com o da Sadia da Tabela 2, observa-se que, historicamente, a Sadia esteve sempre exposta com índices de aplicação de recursos em ativos financeiros expressivamente altos, variando de 32% a 37% e com índices de aplicação de recursos nas suas atividades operacionais oscilando de 68% a 63%, somente.

Contrastando-se o comportamento da Sadia com o da média das empresas, verifica-se a expressiva diferença nos índices de aplicação de recursos em ativos financeiros e sua preferência e opção estratégica pelas aplicações financeiras em detrimento do investimento em ativos operacionais. Essa diferença representa um índice 226% superior em ativos financeiros.

Assim, avaliando-se os percentuais destinados à produção com a aplicação financeira e o desempenho que esses capitais trouxeram aos resultados, é possível demonstrar que não houve sustentabilidade econômico-financeira da empresa e que houve sim destruição da riqueza acionista.

A Tabela 3 demonstra o comportamento histórico dos resultados totais da Sadia e as proporções, em cada período, entre o lucro operacional e as receitas financeiras obtidas.

No período de 1996 a 2000, constata-se que as receitas financeiras da Sadia chegaram a representar 56% do total dos seus lucros, em comparação aos 34% nas médias das empresas, diminuindo para 40% no período de 2000 a 2007.

Fica evidente que esse comportamento sempre foi excessivamente superior e distante das médias das empresas, porque, nelas, as receitas financeiras estiveram em 18% no período de 1996 a 2007, caindo, no último período, para 14%, de acordo com a Tabela 4.

Constata-se que os resultados da Tabela 4 estão alinhados com o comportamento dos recursos aplicados pelas médias das empresas observados na Tabela 1, na qual se verifica que os capitais operacionais corresponderam a 89% e os ativos financeiros, a 11% no período de 2000 a 2007.

Assim, os níveis observados de lucro operacional e das receitas financeiras denotam a grande diferença entre o comportamento da Sadia e o das empresas. Percebe-se que as empresas deixam claro a consistência das suas políticas e estratégias, estando apropriadas e em consonância com a política de investimentos em ativos voltados às atividades operacionais, somadas a níveis mais conservadores em aplicações de curto prazo em ativos financeiros.

Sabe-se que o uso da alavancagem financeira mais agressiva ou conservadora e suas relações risco-retorno são definidos pelos gestores da companhia, portanto, define-se a política e são determinados os níveis de recursos próprios e de terceiros.

Na Tabela 5, se observa que a média das empresas apresenta um comportamento apropriado e constante nos períodos analisados, indicando a importância e a coerência da política de alavancagem financeira e o equilíbrio da estrutura de capital, dadas as relações risco-retorno assumidas.

Já na Tabela 6, os dados demonstram que a Sadia possuía uma alavancagem financeira mais agressiva e uma estrutura de capital em que a composição do P. L. era inferior, em torno de um terço do mesmo índice, quando comparada com as médias das empresas (Tabela 5).

 

Entre 1996 e 2000, o P. L. da Sadia representava 44%, os financiamentos de L. P., 19% e os financiamentos de C. P., 37%, embora os recursos aplicados nos ativos financeiros equivalessem a 32% do capital (vide a Tabela 2).
É possível verificar uma mudança no perfil e na composição dos financiamentos da Sadia (2000/2007), a qual, embora alavancada e agressiva, apresenta a seguinte estrutura: o P. L. foi para 46%, os financiamentos de L. P., para 28% e os de C. P. diminuíram, passando a representar 26%, apesar de que os recursos investidos nos ativos financeiros terem aumentado para 37%.

Nota-se que o endividamento de curto prazo da Sadia sempre foi o dobro da média das empresas, apontando um diferencial expressivo de risco e relevante diferença no nível da alavancagem financeira.

Diante desses dados, cabe questionar: como seriam os ganhos efetivamente líquidos das receitas financeiras da Sadia se eles fossem reanalisados com o foco na metodologia de Criação de Valor ao Acionista ou VEC®? Será que eles seriam iguais aos divulgados pelas demonstrações financeiras publicadas quando se usa a análise tradicional de indicadores financeiros?

Com os dados publicados, pode-se verificar que o montante das receitas financeiras acumuladas durante o período de 2000/2008 foi mais que suficiente para suportar as perdas em 2008. Numa análise simples comparando a soma das receitas financeiras acumuladas e o valor das perdas financeiras com as operações dos derivativos “tóxicos”, haveria um ganho contábil de aproximadamente R$ 1,5 bilhão. Mas cabe salientar que esse cálculo é somente uma expressão contábil que não representa o verdadeiro lucro econômico.

Com certeza, essa não é a melhor ou a mais correta forma técnica de se apurar o resultado econômico de uma operação, tanto é que ela mostra um resultado enganoso, falso e ilusório.

Quando se adotam conceitos contemporâneos de finanças corporativas, uma das melhores opções disponíveis de mensuração é a aplicação da metodologia da Criação de Valor ao Acionista4.

Dessa maneira, os resultados gerados serão muito diferentes daqueles publicados pelas demonstrações financeiras (Tabela 3), uma vez que o método sugerido proporciona uma mensuração verdadeira, eficiente e transparente do que realmente acontece com o resultado econômico da empresa.

Quando se aplica a Criação de Valor ao Acionista, apura-se o valor efetivo dos resultados operacionais, ou seja, o verdadeiro lucro econômico de uma empresa.

Buscam-se respostas claras para perguntas como:

• As receitas financeiras líquidas obtidas pela aplicação dos ativos financeiros conseguem remunerar o custo do capital (WACC) da empresa, criam ou destroem valor?

• As receitas financeiras obtidas suportam os impostos sobre a receita e o Imposto de Renda?

• Os resultados financeiros encontrados são os contábeis ou são efetivamente econômicos, Criam Valor ao Acionista?

Portanto, conclui-se que o impacto das receitas financeiras nos resultados da Sadia destruiu de forma expressiva o valor e a riqueza do acionista.

Agora, comparando-se as informações anteriores com as mais recentes publicadas pela companhia (12/2007, 3° Trim./2008 e 12/2008), percebe-se, no item “a” da Tabela 7, a relevante transformação que houve no comportamento quanto aos resultados operacionais quanto nas receitas financeiras, em que novamente ela cresceu significativamente no 3º trimestre de 2008 e em dezembro de 2008, mas em detrimento dos respectivos resultados core, que diminuíram ao invés de aumentar.

Mas a grande transformação da perda da Sadia com os derivativos “tóxicos” está na nova estrutura de financiamento. Conforme o item “b” da Tabela 7, o P. L. caiu de 54% em 2007 para somente 17% em 2008, ao mesmo tempo em que houve um expressivo crescimento no endividamento de curto prazo, de 14% para 49%.

Quando se analisa esse mesmo impacto em termos monetários, nota-se que o endividamento de L. P. da Sadia cresceu em R$ 6,6 bilhões, saindo de R$ 3,9 bilhões em 2007 para R$ 10,5 bilhões em 2008; já o endividamento de C. P. foi responsável por R$ 5,0 bilhões deste crescimento.

Já o montante de R$ 4,7 bilhões de despesas financeiras do ano de 2008 representou o equivalente a quatro anos de geração futura do Ebitda.

Portanto, o reflexo da estratégia adotada pela Sadia se traduziu rapidamente em uma alavancagem financeira de curto prazo sem precedentes e uma destruição de riqueza do acionista enorme espelhada no seu novo valor de mercado em dezembro de 2008.

Assim, o reflexo da fragilidade financeira percebida pelo mercado e demonstrada pela Sadia com a publicação das demonstrações financeiras de dezembro de 2008 pode ser avaliada observando-se o comportamento de algumas contas como:

a) Tinha um P. L. de R$ 3,2 bilhões em dezembro de 2007, caiu para R$ 411 milhões em função do elevadíssimo prejuízo de 2008;

b) O endividamento financeiro em 2007 era de R$ 3,7 bilhões, cresceu de forma vertiginosa para R$ 11,3 bilhões, principalmente em função das operações dos derivativos em 2008;

c) O resultado financeiro era positivo em R$ 132 milhões em 2007, cresceu expressivamente para R$ 3,9 bilhões de despesas financeiras líquidas em 2008;

d) O lucro líquido foi de R$ 768 milhões em 2007, representando um lucro por ação de R$ 1,14, entretanto, o prejuízo de 2008 alcançou o expressivo valor negativo de R$ 2,5 bilhões ou um prejuízo por ação de R$ 3,69.

A operação de associação da Perdigão com a Sadia

Assim, após muitas negociações, surge o fato relevante publicado no dia 20 de maio de 2009 comunicando a associação entre a Perdigão e a Sadia, resultando na nova empresa, a BRF – Brasil Foods S.A., com negociação das ações no Novo Mercado da Bovespa.

Como resultado da operação, efetuou-se a incorporação das ações da Sadia pela BRF, com uma relação de substituição de ações correspondente a 0,132998 ação ordinária de emissão da BRF para cada ação ordinária ou preferencial de emissão da Sadia.

Com a troca de ações definidas e efetuadas entre as companhias, restou para a Sadia ser minoritária com somente 32% do capital na nova BRF e os acionistas da Perdigão ficaram com a ampla maioria, ou 68% das ações ordinárias.

Analisadas essas informações e dada a operação concretizada, faz-se necessário refletir sobre qual é o conhecimento e aprendizado que o caso da Sadia traz.
Conclui-se que somente com a análise do comportamento histórico estruturado e criterioso foi possível desvendar as decisões e avaliar o impacto que ocasionaram na destruição da riqueza dos acionistas.

Análises com consistência estratégica em finanças corporativas exigem conhecimento, atualização, profundidade técnica e períodos longos de avaliação, em vez de lucros no curto prazo, como os trimestrais, que vêm e vão.

É pré-condição para enfrentar os crescentes desafios decisões estratégicas com um processo estruturado e organizado na busca incessante de crescimento sustentado, com inovação diferenciada, avaliando o risco, a alavancagem operacional e financeira, aliados a uma forte cultura de gestão orientada para valor e não a meros lucros ou Ebitda.

Assim, governança corporativa5, a dura disciplina no bom gerenciamento das atividades operacionais, com pessoas treinadas e motivadas, com decisões focadas em geração de valor, deverão se traduzir na busca da excelência em produtividade dos ativos e dos capitais empregados.

Entretanto, é condição relevante o direcionamento e mudança da cultura para a remuneração com mérito, ou seja, a remuneração variável aos gestores vinculada não ao lucro de um mero trimestre, mas à geração de valor a longo prazo, fatores primordiais que, se bem definidos e orientados, podem garantir a sustentabilidade, a perenidade e o sucesso de uma empresa.

O risco e a provável perda de valor da empresa no mercado para aqueles que desconsideram os fundamentos econômicos da Criação de Valor ao Acionista e não tomam providências em tempo são latentes. Empresas consideradas extraordinárias também tropeçam e podem tomar decisões equivocadas, levando-as ao declínio.

Assim, a punição para aqueles que desconsiderarem a Criação de Valor ao Acionista pode demorar, mas o desenrolar dos fatos comprovam essa necessidade.

Notas

1 Todos os valores e percentuais apresentados neste texto estão atualizados para moeda constante. Foram estruturados com a abordagem conceitual do lucro econômico, foco na metodologia VEC® – Valor Econômico Criado ou Criação de Valor ao Acionista.

VEC® é marca registrada da Oscar Malvessi Consultoria em Valor.

2 Somente após o ocorrido, as demonstrações financeiras de dezembro de 2008 revelaram nas notas explicativas a situação dos contratos de derivativos e os respectivos registros das obrigações e suas perdas financeiras de maneira transparente, agora evidenciando e qualificando os tipos de operações envolvidas.

3 O banco de dados utilizado foi a quinta atualização da Tese de Doutorado de Oscar Malvessi (FGV-Eaesp-2001), sobre o tema “Criação de Valor ao Acionista – A Experiência das Empresas de Capital Aberto no Brasil”.

4 Ou Valor Econômico Criado (VEC®). Denominação utilizada na Tese de Doutorado (FGV-Eaesp-2001) de Oscar Malvessi, em artigos, reportagens publicadas e trabalhos, visando expressar o uso da metodologia de Criação de Valor ao Acionista. Esse conceito é conhecido por Economic Profit ou Lucro Econômico e pela sigla EVA™ (Economic Value Added ou Valor Econômico Adicionado).

5 Governança corporativa: o tema é amplamente tratado no novo código de melhores práticas de governança corporativa do IBGC, em www.ibgc.org.br.

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