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CT de Mercado Financeiro e de Capitais discute fusões e aquisições em tempos de pandemia

A Comissão Técnica de Mercado Financeiro e de Capitais do IBEF-SP se reuniu no dia 16 de abril para discutir o impacto da crise do novo coronavírus (COVID-19) no mercado, abordando especialmente fusões e aquisições (M&A) em tempos de pandemia. Durante a reunião, Rosangela Santos, líder da comissão, destacou que havia uma expectativa de maior movimento de M&A este ano; contudo, o contexto era outro. “O cenário mudou significativamente, mas há várias operações em andamento e novas oportunidades que irão emergir da crise”, disse.

Nestor Casado, CEO da Capital Invest M&A Advisors, e especialista na área de M&A, foi convidado para fazer uma apresentação aos membros da CT sobre as perspectivas do mercado de fusões e aquisições perante a crise, abordando o impacto da crise de COVID-19 na economia e como ele se estende ao M&A. Segundo dados da KPMG, em 2019, 1.231 transações de fusões e aquisições foram realizadas no Brasil, o recorde de toda a série histórica, assim como 2018 e 2017 também foram anos recordes. “O país estava em uma situação de aumento de M&A, e esperávamos que 2020 fosse superar a série histórica mais uma vez. Entretanto, no início do ano, os mercados foram surpreendidos pela pandemia de COVID-19”.

Casado analisou ainda dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre como, apesar da relativa baixa letalidade da doença (quando comparada com epidemias passadas tais como Ebola, MERS e SARS), o seu altíssimo nível de contágio e consequente crescimento exponencial pode arrasar o sistema de saúde. “Portanto, são necessárias medidas para que o sistema de saúde não entre em colapso, sendo que de todas as opções possíveis, o fechamento dos serviços não essenciais é a medida que acaba gerando maior impacto econômico”. Ele ressaltou, entretanto, o exemplo da China, que ao controlar a epidemia, apresenta uma rápida retomada na sua produção.

Para os países emergentes, incluindo o Brasil, a saída de capitais tem sido expressiva, muito maior e mais rápida do que em crises anteriores, por exemplo 2008, ressaltou, enfatizando que a crise já impactou fortemente o PIB e o câmbio do Brasil e de países vizinhos. “O Brasil estava com previsão inicial de crescer em PIB 2% está com agora com uma perspectiva de queda de 4,4%. A crise está aí e o impacto é muito grande”. O índice de confiança empresarial e do consumidor brasileiro também teve uma queda substancial.

Casado ainda ressaltou que a crise terá efeitos diferentes dependendo dos setores da economia. “Saúde, tecnologia, venda online e agronegócio serão menos impactados do que turismo e transporte. Ainda assim, o impacto econômico dependerá principalmente da duração das medidas mais drásticas, tais como fechamento de serviços não essenciais, e do resultado dos estímulos do governo”. Ele deu exemplo de países como Taiwan, Hong Kong e Coreia do Sul, que conseguiram evitar fechar serviços não essenciais, tomando medidas de detecção e isolamento vertical do grupo de risco e dos contagiados a partir de testes massivos e apps de contact tracing, enquanto em outros, como Espanha e Itália, que demoraram para agir e não tomaram medidas de detecção e isolamento vertical, tiveram que impor estritos e prolongados confinamentos com grande impacto sobre o PIB.

M&A – O número de transações de fusões e aquisições no Brasil reduziram entre 10% e 32% durante as últimas crises (2001, 2008 e 2015), mas nos últimos anos, a partir de 2017, vinha apresentando crescimento, ano a ano. “Segundo estudo da TTR, em 2020, o número de transações já diminuiu 26% no primeiro trimestre, comparado a 2019, com um total de 239 operações contra 324”, disse Nestor Casado. Rosangela Santos destacou a preocupação com a precificação das operações, dado o nível de incerteza no futuro da atividade econômica. “Teremos menos transações, as coisas vão demorar mais, mas existem boas oportunidades. Fica difícil considerar números do ano passado como referência, então há uma discussão de cenários e qual o potencial de crescimento. Os fundos de private equity, com atuação relevante nas operações, e investidores estratégicos, estarão atentos às opções de compra”, destacou.

Para as operações em andamento, outro ponto abordado na reunião foi o enquadramento do COVID-19, enquanto acontecimento extraordinário e imprevisível, em hipóteses de caso fortuito e força maior, de onerosidade excessiva e de alterações ou efeitos adversos relevantes (cláusulas MAC – material adverse change). Essa análise deve ser considerada em concreto, caso a caso, e não de forma irrestrita a todo e qualquer contrato, atividade ou setor. Crisleine Yamaji, advogada no Lefosse Advogados, destacou que é difícil olhar efeitos adversos da crise de modo único, pois em setor teve impactos diferentes, e sua aplicabilidade visa reconsideração das premissas para reequilíbrio econômico que existia no momento que cada contrato foi assinado.

O impacto do distanciamento social nas operações de mercado de fusões e aquisições, ressaltou Nestor Casado, não impede a concretização das transações, porém estas acabam sofrendo atrasos. “Um claro exemplo são as visitas que investidores interessados costumam fazer à empresa que pretendem adquirir antes de apresentar uma oferta não vinculante, que podem demorar mais do habitual em serem agendadas, assim como as due diligences operacionais. Já as due diligences jurídica e financeira não foram afetadas por conta dos data rooms virtuais”.

Crisleine disse ainda que algumas operações não estão com uma visualização de prazo para fechamento. “Não temos muita visibilidade do próximo semestre. Não conseguimos enxergar o mercado e a perspectiva de melhora neste momento. E notamos um apoio do regulador para extensão e suspensão de prazos. Sem uma perspectiva econômica clara, do ponto de vista jurídico, muitas operações estão em revisão”.

Casado mostrou ainda que nos Estados Unidos as empresas estão aproveitando esse momento para fazer aquisições. “Quando se adquire empresas em momentos de dificuldade, o retorno acaba sendo mais alto futuramente, conforme comprova uma análise da BCG na qual foram analisadas 10.000 transações entre 1980 e 2018”, ressaltou. Ainda Nestor Casado e Crisleine Yamaji concordam que o uso de cláusulas de earn out, já bastante comuns nas transações de M&A, será ainda maior; uma boa saída para a conclusão das operações, para conciliar expectativas e mitigar o atual nível de incerteza.

Roundtable – Ao final da reunião, os membros fizeram uma mesa redonda para destacar a visão e experiência de cada um sobre o mercado nesse período de crise. Foi abordado o tema de financiamento mezanino, que ainda é uma estrutura muito minoritária no Brasil, e o crescimento no movimento de ativos distressed. Rosangela Santos enfatizou que essas operações ainda possuem um nível de complexidade e risco, ficando restrita a poucos participantes. Os membros lembraram o aumento de apetite de fundos dessa natureza percebido em 2019.

Os membros discutiram também a negociação em recuperação judicial, que pode ser mais uma oportunidade dentro do mercado de M&A. Crisleine destacou que são feitas algumas operações de M&A ligadas a um reequilíbrio da estrutura de capital, à reestruturação e à liquidação de débitos para evitar que empresas cheguem a uma recuperação judicial. “Há uma separação do ativos bons nas operações de M&A, e isso ajuda a manter empregos e a operação em funcionamento”.

“Acredito que muitas dessas operações vão acontecer, pois empresas precisarão de entrada de capital, e aí entra o investidor estratégico ou private equity”, complementou Rosangela. O custo mais baixo das empresas também ajudará a estimular essas operações, dizem os membro da CT, e além disso, deve haver consolidação de setores que ainda são muito pulverizados. “Já as operações de IPO tendem a seguir em quarentena, dadas as condições desfavoráveis para ir a mercado agora”, disse Rosangela, sendo que uma operação de M&A pode ser uma alternativa para obtenção de equity a ser reconsiderada pelas empresas, dependendo da duração da crise. A conclusão dos membros da CT é que as oportunidades são boas para empresas que tiverem liquidez para comprar, mas é preciso ter apetite ao risco também.

Próximo evento – Ao final, Rosangela Santos comentou que o próximo evento da CT de Mercado Financeiro e de Capitais tratará da situação de crédito e do impacto nas empresas e nos bancos diante do atual cenário. A ideia é refletir sobre soluções para esse momento de maior necessidade liquidez e aumento no custo das operações. “A colaboração de todas as partes é o que vai ajudar a gente a sair dessa crise”, destacou Rosangela.

 

 

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