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O processo de digitalização, acelerado nos últimos 8 meses, já é uma realidade para as empresas brasileiras, mas deve ser cada vez mais aprimorado para que todas as áreas de uma companhia possam ter uma visão conjunta sobre a estratégia, utilizando a tecnologia a seu favor. Isso não é diferente no caso da área financeira, na qual o CFO passa a ser cada vez mais estratégico, utilizando os meios digitais e um mindset disruptivo para ampliar sua capacidade de pensar no modelo de negócio de sua empresa. No webinar Certificação CFO(BR), promovida pelo IBEF SP no dia 4 de novembro, foi discutido o tema “Tecnologia: Digitalização ou Disrupção – Como o CFO trata essas questões dentro das suas responsabilidades”, com moderação de José Cláudio Securato, CEO da Saint Paul e idealizador do LIT.
A digitalização nas empresas começou a ganhar força na década de 1980, ampliando a partir de 1990, mas sempre muito distante do Brasil. Essa é a visão compartilhada por Diego Barreto, CFO do iFood, que destaca que o país tem uma cultura de importar muito mais tecnologia do que desenvolver, criando uma economia de mercado pouco competitiva. “Nos últimos anos, o processo de globalização se intensificou, reduzindo as barreiras de entrada nos países, mesmo no Brasil, e na prática, as cadeias de valor estão integradas. O resultado disso é que tudo que antes havia uma dificuldade para acessar e executar, hoje está resolvido. O Brasil passa por um momento de inflexão da curva”, avalia Diego.
A transformação digital que ocorreu nos últimos meses, por conta da pandemia, cria um sinal de alerta, segundo Diego, para subir a régua. “O Brasil, pelo menos há 15 anos, tem uma capacidade de digitalização de modelos de negócios e jornada de clientes que permitiria que a maioria das empresas brasileiras estivessem à frente dessa transformação, mas não estamos por conta da baixa competitividade, e isso faz com que empresas sejam pouco digitais, compradoras de tecnologias. Isso chega com atraso, em especial, nas áreas que não estão no front do negócio, como a área financeira”, diz.
Com essa questão na mesa, o CFO é co-criador da estratégia da empresa, olhando para um modelo de negócio que está caminhando para ser cada vez mais digital. “A tecnologia permite escalar muito mais rápido, entender de dados de forma mais poderosa do que que em uma lógica offline. O time financeiro tem um papel grande na escalabilidade. Negócios digitais são flexíveis, com capacidade de adaptação”, diz Diego.
João Paulo Faria, CFO da 99, corrobora da visão de que o olhar sobre a tecnologia deve ser muito mais amplo, indo além do home office, e destaca que o comportamento do profissional de finanças diante desse novo cenário é importante. “Inteligência pode ser desenvolvida. A gente se move de um desejo de parecer inteligente para um desejo de aprender. Tínhamos uma questão no passado de evitar os desafios e ver os fracassos como ruins, e hoje aceitamos os desafios e usamos a tecnologia para ajudar no desenvolvimento como pessoa”.
Segundo ele, é possível alavancar em cima da tecnologia, tendo maior previsibilidade, controle de risco e compliance. “Quando se tem a visão da estratégia, conhecimento do cliente e do produto, entendimento do mercado e seus riscos e, acima de tudo, capacidade de empoderar as pessoas de sua equipe, aí sim o CFO está preparado para assumir responsabilidades maiores”. Segundo ele, a tecnologia é acessível hoje a qualquer empresa.
Digitalização x Disrupção – O papel do CFO tendo a tecnologia como sua aliada é tornar os negócios cada vez mais disruptivos. José Securato destaca que aprendeu o conceito de disrupção como uma nova forma de inovação. “Existe a inovação disruptiva, onde você pega algo caro e complexo e ao fazer disrupção é possível tornar isso acessível, barato, e isso passa a ser um significado positivo”.
Diego Barreto complementa dizendo que o CFO, que antes era mais focado na liquidez da empresa, hoje tem uma capacidade muito maior de enxergar produtos e soluções financeiras no mercado. “O gerenciamento de capital deveria ser relativamente simples. O papel do CFO é ajudar na construção das decisões estratégicas de uma empresa”.
Para isso, as empresas precisam entender que, com a explosão de dados e de devices, é necessário ter uma capacidade computacional muito maior do que antes, com informação e cruzamento de dados para a tomada de decisões. “Conseguimos perceber uma mudança de mindset nas organizações, e isso precisa ser uma forma de competitividade e estratégia da empresa, e de como ela consegue analisar os dados que ela gera”, diz João Paulo.
Carla Leal, diretora de growth da Waycarbon, destaca que nesse cenário disruptivo, um dos desafios é a arquitetura de dados. “Chega uma hora que o número de uma área não conversa com o número de outra área, pois cada um usa sua fonte de dados. Essa questão de integração de sistemas ainda é um desafio para muitas organizações”. Ela ressalta ainda que, apesar de muitas atividades já serem executadas com inteligência artificial, é necessário ter a capacidade humana para extrair conteúdo e entender o contexto de análises. “Essa questão tecnológica exige profundidade de entendimento e discernimento para determinar o que pode ser feito pela máquina e o que ainda deve ser feito pelas pessoas”, diz.
Carla avalia ainda que o principal desafio é se preparar para poder exercer um papel mais estratégico. “Muitas vezes essa disrupção não vem necessariamente da tecnologia. Quais as competências que os profissionais devem desenvolver para entender da tecnologia e dos modelos de negócios?”, questionou.
Pessoas – Novas competências, com times capazes de abraçar soluções usando tecnologia, são cada vez mais valorizadas dentro das companhias. Diego reforça que questões técnicas são transferíveis, mas o que diferencia um profissional é o comportamento e a capacidade de aprender. “Quando se vai para um mundo mais digital, a criação de novas competências técnicas são mais rápidas, e a academia tem dificuldade de persegui-las. Sobra para você, na sua rotina, continuar aprendendo”.
Carla destaca que em termos de hard skills, ainda há um gap grande na parte de estatística, faltando base conceitual. “Estatística é fundamental para entender inteligência artificial. Em relação às soft skills, vejo como importante ter disciplina. É preciso que as entregas sejam consistentes e saiam de maneira mais rápida. Por essa razão, percebo que o uso de metodologias ágeis, como os rituais do scrum, ajudam a aprimorar essas competências e contribuem para fomentar a cultura de inovação”, pontua.
Há ainda uma preocupação das empresa com pessoas que tenham curiosidade no aprendizado e não tenham medo de errar. “As habilidades individuais fazem a diferença, a independência e a rapidez são skills que pode ser usadas. Mas dentro da cultura de uma empresa, de um ambiente de colaboração, é preciso ter pessoas com curiosidade, vontade de aprender”, diz João Paulo. Ele ressalta que as pessoas precisam entender que em algum momento devem se aprofundar em alguma coisa. “Quem se aprofunda em inovação terá um diferencial”.
Inovação – Para a capacidade de digitalização dentro de uma empresa ser ampliada, é preciso principalmente de um olhar do acionista da empresa sobre o tema. Segundo Diego Barreto, esse olhar abre caminhos para que se estruture uma companhia em cima de dados. “Se não estruturar a empresa como um todo, o poder fica limitado”. Ele acredita ainda que a arquitetura pode assumir diferentes modelos, mas o crucial é ter algo único para a empresa. “Se o acionista não tiver comprado a ideia, dificilmente isso vai ter sucesso”.
Carla reitera que inovação não é um departamento, é algo que permeia todas as áreas das empresas, e as companhias inovadoras têm uma questão cultural. “É um mindset que vem do board e passa por toda a organização. Se não tiver todas as pessoas compradas com essa ideia, isso acaba sendo uma questão pessoal ou uma atribuição específica da área de tecnologia, e não é com essa mentalidade que uma empresa se transforma. Ela se transforma efetivamente quando isso está incorporado dentro de sua cultura”, complementa.