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E-commerce: para de pé?

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José Rogério Luiz é senior advisor da Netshoes.

“Quer comprar barato, compra na internet”. Essa imagem de preço baixo refletia a realidade do e-commerce há cerca de três anos. E isso sempre me intrigou. Preço mais baixo que as lojas físicas, conveniência para o cliente, frete grátis e pagamento em 12 vezes sem juros. Como um negócio pode ser sustentável dessa maneira?

Não consegui resposta para essa minha pergunta no Brasil e, na busca por uma explicação sobre a sustentabilidade desse negócio, decidi fazer uma volta ao mundo e visitar as origens do e-commerce, para, a partir daí, elaborar uma estratégia de longo prazo para empresas do setor.

Era início de 2012. Minha primeira parada foi nos Estados Unidos. Lá foi onde nasceu o e-commerce e as empresas deste segmento recebiam altos investimentos dos fundos, chamavam a atenção da mídia e tinham algumas características em comum, como consequência de oferecerem preços inferiores aos das lojas físicas e frete grátis : crescimento acelerado, Ebitda negativo e prejuízo.

Ao resgatar a história do e-commerce, identifiquei que, em meados da década de 1990, algumas situações aconteceram naquele país derivadas de transformações em tecnologia e comunicações.  Com a evolução da internet, algumas grandes redes de varejo decidiram abrir “catálogos eletrônicos” para venda de produtos de coleções passadas (closeouts) ou com avarias. Ou seja, para a desova de produtos que estavam parados, portanto, com preços inferiores aos dos itens que ainda estavam em linha. Assim, quem queria uma barganha ia para esses sites. Essa é a real origem dos preços mais baixos do que nas lojas físicas.

Mas o que era para ser só um canal de venda específico logo passou a ser amado pelo consumidor, que não só ficou atraído pelo preço, mas também pela conveniência de poder comprar a qualquer hora, em qualquer lugar, e receber o produto em casa.

Ainda nos Estados Unidos, no mesmo período, dois outros marcos aconteceram e impulsionaram definitivamente o e-commerce: os nascimentos do Ebay e da Amazon.

O Ebay é um marketplace, ou seja, basicamente um local onde vendedores e compradores se encontram. Um modelo em que a empresa não tem estoques, assim ela é leve em ativos e a receita é ligada a um fee de cada transação.

No caso da Amazon, que revolucionou o e-commerce de várias maneiras, o que eu identifiquei como característica definitiva é que ela entendeu que o que fideliza consumidor não é o preço, e sim a qualidade de serviço.  A Amazon cresceu aceleradamente, com preços baixos, gerando ebitda negativo e prejuízo – tal qual as outras empresas do nascente e-commerce -, mas cativou uma legião de consumidores pela qualidade do serviço.

Nesse momento, eu já começava a entender alguns aspectos sobre a história do e-commerce, como a origem do preço baixo e a questão da conveniência. Mas como esse modelo vinha se sustentando nos EUA? A resposta aos leitores que são financistas e financeiros é muito simples: Ciclo de Capital de Giro (ou Working Capital Cycle).

Nos Estados Unidos, as empresas de e-commerce recebem à vista dos clientes e pagam os fornecedores num prazo médio “longo”, não raro superior a 120 dias. Assim, quanto mais rápido essas empresas crescem, mais caixa elas geram, mesmo tendo prejuízos constantes. Isso é sustentável em longo prazo? Não, mas é sustentável até que a empresa tenha uma marca estabelecida, um porte relevante e escala. A necessidade de busca por capital é limitada. Desta forma, os investidores adoram empresas de crescimento acelerado.

Cabe lembrar que o e-commerce nos Estados Unidos cresceu em um período de juros historicamente baixos, portanto isso barateou o “custo de carregamento” do contas a receber dos fornecedores em relação às empresas de e-commerce, permitindo que elas tivessem financiamento a custo praticamente zero para seu crescimento.

Então, parti para a Europa. Na Inglaterra e na Alemanha, o cenário era muito semelhante ao dos Estados Unidos, inclusive o Ciclo de Capital de Giro.

Fui para a Ásia. China e Índia são dois mercados impressionantes. Não só pelo tamanho da população, mas também por serem sociedades em um estágio de consumo mais atrasado do que nos Estados Unidos e na Europa.

De forma resumida, uma importante característica da Ásia é ligada a uma sigla: COD – Cash On Delivery ou pagamento contra entrega. Ou seja, o cliente compra via internet, mas paga no momento da entrega. Não é um modelo tão bom em termos de geração de caixa como nos Estados Unidos ou na Europa Ocidental, mas promove equilíbrio no fluxo de caixa.

Retornei ao Brasil. O e-commerce local nasceu de forma mais consistente no ano 2000, através de empresas formadas por egressos da bolha da internet e fundos de private equity brasileiros. Isto é, gente com pouca experiência de varejo e financistas.

Dessa forma, o modelo a ser copiado foi o americano, com preço mais baixo do que as lojas físicas, mas não para itens selecionados, e sim para o site todo e frete grátis universal. O grande mérito desse grupo de pioneiros foi o de ensinar ao brasileiro o que era comprar pela internet.

O crescimento veio de forma acelerada, assim como os resultados negativos, que foram agravados pelo fato de o ciclo de capital de giro no Brasil ser oposto ao existente nos Estados Unidos. Aqui, o fornecedor dá pouco prazo, em função da alta taxa de juros, e o consumidor quer prazo. Então, o e-commerce começou aí a sua história de resultados negativos e de grande consumidor de capitais.

Porém, no início da década passada, o que os investidores queriam eram histórias de crescimento e, assim, o e-commerce brasileiro teve os primeiros casos de empresas que fizeram abertura de capital/IPO.

Depois de 2006, já com o capital aberto, essas empresas de e-commerce passaram a sofrer a concorrência do varejo tradicional, que abriu seus sites, e para se diferenciarem criaram o “incrível” 12 vezes sem juros. Ou seja, você podia comprar para a sua filha de seis anos um DVD da “Pequena Sereia”, em 12 vezes sem juros, com frete grátis e custando menos do que na loja do shopping. Foi feita a aplicação do modelo americano de e-commerce com o “jeitinho” brasileiro de dar prazo ao cliente. O Ciclo de Capital de Giro era o oposto dos Estados Unidos.

Em meados de 2012, eu já tinha resposta para minha pergunta. No Brasil o modelo de e-commerce existente era insustentável em médio/longo prazo, e sustentável em curto prazo com massivos aportes de capital. Matematicamente, não para de pé. Mudanças precisavam ser feitas. Mas isso é tema para meu próximo artigo…

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