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O Webinar “Oportunidades na crise: O papel da área tributária”, realizado na quarta-feira, 22 de abril, reuniu especialistas do setor para discutir as medidas que o governo e as empresas estão tomando no setor de tributos diante da crise do novo coronavírus (COVID-19). O evento on-line foi organizado pela Comissão Técnica de Tributos do IBEF-SP e teve como moderadora Camila Abel, líder da Comissão Técnica de Tesouraria e Riscos do IBEF-SP e diretora de Tesouraria, Gestão de Riscos, Previdência e Seguros da AES Brasil. “É extremamente importante ver que a crise diferencia quem é quem no mundo corporativo. É o comportamento das empresas nos aspectos ESG, impactos no meio ambiente, sociais e de governança, empresas se posicionando sobre redução de salários, demissões, tudo isso faz muita diferença nesse contexto todo”, disse Camila na abertura do painel.
Em seguida, a dinâmica foi conduzida com base em perguntas feitas aos participantes Meily Franco, Tax Director South Latam na Alstom Transporte e líder da CT de Tributos do IBEF-SP; Luiz Peroba, sócio da área tributária no Pinheiro Neto Advogados; e Durval Portela, sócio líder da área de consultoria tributária e societária da PwC.
Quais são as principais medidas adotadas pela União, estados e municípios em razão da COVID-19?
Luiz Peroba, sócio da área tributária no Pinheiro Neto Advogados, destacou que do ponto de vista Federal, houve umas série de medidas de prorrogação de tributos em relação a empresas optantes pelo Simples. “Logo depois, o governo incluiu outras empresas, principalmente em relação a prorrogação e prazos para cumprimento de obrigações acessórias. Para tributos, temos prorrogação para PIS/Cofins, fundos de garantia, contribuição previdenciária, e redução da alíquota de IOF para empréstimos feitos entre 30 de abril e 3 de julho”. Além disso, Peroba mencionou a prorrogação da declaração de Imposto de Renda Pessoa Física, e também das entregas da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF), da Escrituração Fiscal Digital (EFD), e das certidões negativas de tributos federais. “Uma série de empresas precisam de certidão para receber de órgãos públicos, e logo em seguida vieram as prorrogações, inicialmente, por 90 dias”.
No âmbito estadual, Durval Portela, sócio líder da área de consultoria tributária e societária da PwC, falou sobre as medidas adotadas para suspensão de procedimentos administrativos, especialmente em São Paulo e Rio de Janeiro, reiterando que não diferem muito dos demais estados da União. “Não houve, na esfera estadual, medidas prorrogando recolhimento de tributos em si ou dando maiores isenções. Temos suspensão de procedimentos administrativos em relação a julgamentos na esfera administrativa estadual, prorrogação da validade de certidões negativas, e também suspensão do procedimentos de inscrição de dívida ativa, ou protesto de valores já inscritos na dívida ativa estadual”.
Portela disse ainda que não houve, até o momento, uma flexibilização mais contundente em relação a pagamento de tributos. “O único estado da União que teve medidas nesse sentido foi o Ceará, concedendo isenção do Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) em relação a doações relacionadas à pandemia”. Na sua visão, as medidas são muito tímidas em um contexto de acúmulo de crédito de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). “Poderia, por exemplo, haver medidas que trouxessem mais liquidez e flexibilidade na negociação desses créditos acumulados por parte do contribuinte. No estado de São Paulo, o instrumento de crédito acumulado e-CredAc poderia ter um incentivo a sua comercialização e transferência de forma mais célere”, complementou.
Na esfera municipal, as medidas são de natureza administrativa, em sua grande maioria. “Há postergação de validade de certidões negativas, suspensão de processos de cobrança de dívidas já inscritas na dívida ativa dos municípios, mas não há nenhuma medida de postergação de recolhimento do Imposto Sobre Serviços (ISS), ou redução do valor do ISS, por exemplo, para municípios que estão mais afetados pela pandemia. Não há nenhuma flexibilização desse encargo tributário”.
Quais as medidas que empresas deveriam adotam para monetizar créditos tributários?
No que diz respeito à monetização de créditos, Meily Franco, Tax Director South Latam na Alstom Transporte, destacou a importância de focar no caixa imediato durante a crise, para, na retomada, manter o mindset de caixa contínuo e a eficiência operacional e fiscal no modelo de negócios. “O segundo ponto é tomar decisões de forma responsável. Existem várias teses no mercado, várias possibilidade de monetização de quick wins que já são pacificadas, e muitas vezes as empresas não aproveitam por não ter a melhor assessoria, ou por não ter time adequado”, destacou Meily.
Além de focar no caixa imediato e nas medidas de cash protection, Meily aconselhou as empresas a atuarem de maneira responsável para não atrair mais riscos fiscais. “Pensando em caixa imediato, é possível fazer a varredura das teses existentes, avaliar e confirmar as aplicáveis ao seu negócio, desenhar uma matriz de ganho e custo, levantar valores e discutir estratégias com os tax advisors, apresentando ao top management para validação e aprovação”. Meily disse ainda que há vários exemplos de quick wins. “E-CredAc muitas vezes é dinheiro na mesa e as empresas não aproveitam. Dá um certo trabalho e tem o tempo da administração pública deferir, homologar, aprovar. Além disso, a Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo não tem regras de em quantas parcelas a empresa pode receber os créditos vendidos, o que facilitaria na gestão de caixa das empresas”, complementou.
Ela citou ainda as teses relacionadas a contribuições previdenciárias e oportunidades já pacificadas nos tribunais superiores. “Acredito que agora é o momento de fazer uma avaliação dessas teses, avaliar junto com tax advisors as que têm retorno certo, de forma responsável, e ainda que esbarre na questão do orçamento, é sempre negociável com consultores tributários como se pode pagar por esses trabalhos”, complementou. Camila Abel reiterou que a consolidação de informações tem sido feita de maneira muito próxima entre as áreas de Tributos e Tesouraria das empresas, ressaltando a importância da interação entre todos, buscando de que forma se pode chegar em quick wins.
Já Durval Portela falou sobre como se estabelecer um processo para levantar essas oportunidades e monetizar créditos fiscais. “Nunca como antes a função fiscal da empresa teve que trabalhar junto com a Tesouraria de forma fluida e combinada. Queria adicionar a exploração de créditos fiscais acumulados, que por qualquer razão não se consegue dar vazão no contexto da operação, para lastrear operações de captação de recursos. É outra modalidade de monetização cada vez mais utilizada”, disse. “Existe uma série de fundos dedicados à aquisição e utilização desses créditos de forma a estruturar instrumentos de captação de recursos e operações que consideram esse crédito como lastro”.
Em que pode favorecer a aprovação da transação tributária e sua regulamentação pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN)?
Luiz Peroba destacou que a Medida Provisória 899/2019, que virou Lei 13.988/2020, aprovada 14 de abril e que estabeleceu os requisitos para que a União, as suas autarquias e fundações, e os devedores ou as partes adversas realizem transação tributária, ainda teve avanços tímidos. “Mas é uma questão histórica, temos esse dispositivo no código tributário nacional há mais de 50 anos e nunca havia sido regulamentado”, disse. A PGFN lançou duas portarias para regulamentar essa Lei. Uma delas determina um prazo mais alongado para pagamento de tributos, com parcelamento, concentrado no período da COVID-19. “A adesão a essas regras pode ser feita até 30 de junho, sendo que pessoas jurídicas podem prorrogar por até 81 meses, e pessoas físicas, até 142 meses”, explicou Peroba. “Outra portaria regulamenta as condições necessárias para a transação na cobrança da dívida ativa, muito relacionada a crédito de difícil recuperação ou empresas em recuperação judicial. Essas empresas recebem concessões no débito total”, destacou.
Durval Portela ressaltou que houve um movimento positivo com essas medidas, mas a expectativa é que o processo de negociação tributária não se dê exclusivamente por adesão e permita também que o contribuinte proponha para entes tributantes outras formas de negociar a dívida. “Espero que isso ocorra rapidamente. Isso daria capacidade de arrecadação muito maior por parte dos governos, e uma flexibilidade importante ao contribuinte em relação aos encargos tributários”, complementou.
Como está a adoção, pelas empresas, das medidas emergenciais apresentadas para postergação de tributos?
Todas as medidas de cash protection estão na ordem do dia em todas as empresas, disse Meily Franco. “Na questão da prorrogação de tributos, algumas empresas têm dificuldade de caixa para cumprir compromissos e pagar funcionários, e correm risco de não pagar tributos aproveitando a Selic baixa. Algumas ainda tratam pagamento de tributos como parte de sua responsabilidade social, para financiar atividades do estado. Isso não quer dizer que a função fiscal não deva fazer seu papel de gerir o caixa da companhia de forma eficiente e aproveitar as oportunidades tributárias possíveis”, ressaltou. Ela ressaltou as benesses, principalmente no campo previdenciário e trabalhista, ressaltando que a adoção deve ser feita após avaliação junto ao RH.
Luiz Peroba disse ainda que cada empresa tem uma característica, e as organizações reagiram de maneira muito distinta às medidas. “Algumas escolheram o caminho de parcelamento. Outras querem a prorrogação. Há algumas medidas ajuizadas, uma delas relacionada a uma portaria da procuradoria que diz respeito à prorrogação de prazo de pagamento em função de uma situação de calamidade pública. Outra está relacionada aos impactos da crise na empresa. Um último movimento que tenho visto é das empresas que importam. Não saíram muitas regras postergando prazo de recolhimentos de tributos na importação, então empresas importadoras ajuízam ações nesse sentido”.
Qual a visão sobre a possibilidade de troca de garantia nos processos judiciais e quais seriam os pontos de atenção para buscar agilidade e ter segurança?
Segundo Peroba, um dos movimentos para se buscar liquidez no caixa está relacionado à substituição de depósitos judiciais feitos em juízo para troca de garantias. “Queria dar duas dicas práticas: para quem não quer sair gastando nenhum fee relacionando a seguro-garantia ou carta de fiança, sugiro apresentação de minuta. Outra dica é entender que tipo de ação está no depósito judicial e em que fase ela está”. Peroba ressaltou que a PGFN tem tentado executar provisoriamente as garantias com antecipação, então é preciso tomar cuidado para não fazer a execução da garantia num momento processual inadequado.
Quais são as teses e oportunidades tributárias na indústria para aplicação imediata com foco em caixa?
Peroba ressaltou que as oportunidades tributárias dependem do setor da companhia e de suas características. “Várias associações de setores estão dando dicas concretas sobre temas da indústria que podem ser objeto de disputa, e os temas discutidos no Supremo Tribunal Federal (STF) são considerados pelas empresas para fazer algum tipo de aplicação imediata”. Outro ponto abordado foi a oportunidade do momento em relação ao PIS/Cofins. “Algumas despesas não seriam classificadas como creditadas, mas com o gasto feito com remoção das pessoas para trabalhar remotamente e as medidas emergenciais aplicadas, agora são consideradas”. Meily Franco complementou dizendo que é possível pedir aos advogados uma lista de quick wins, fazer análises e negociar os fees.
Qual o papel da tecnologia na geração de liquidez em tributos?
Meily Franco reforçou que a tecnologia é o tecido que permeia toda a função fiscal, “Não há como ser um bom gestor tributário sem usar os recursos tecnológicos, e a aderência ao compliance tributário é essencial para mitigar riscos fiscais. Para isso, o gestor precisa conhecer bem a sua operação e seus processos e treinar sua equipe, confiar na tecnologia, investir em ferramentas e saber o que o mercado tem a oferecer que pode ser aplicável à sua função fiscal”, ressaltou. Ela citou alguns questionamentos que o gestor deve fazer para ter certeza que a área de tributos está utilizando seu melhor potencial tecnológico. “Sua área de tax usa o que há de melhor disponível no mercado? Seu ERP está com a versão mais atualizada? Você usa todos os aplicativos, os produtos, softwares atrelados a um ERP, para melhorar sua função fiscal? Seus processos estão totalmente automatizados? Seus controles são efetivos? Sua área fiscal tem mindset de inovação e transformação?”.
Como andarão os projetos de Reforma Tributária?
Na visão de Meily Franco, o governo está debruçado nas medidas necessárias para conter a crise, o que deve deixar a Reforma Tributária para um segundo momento. “Estávamos em um contexto de desencontros das teses da reforma, e agora o governo precisa ser mais ágil em responder à crise para depois lançar as bases para uma discussão de reformas tributária e administrativa. Não acredito que teremos Reforma Tributária este ano, mas podemos aproveitar o momento para fortalecer as propostas e facilitar a discussão. Como gestores, essa é a nossa contribuição”, disse.
Luiz Peroba reiterou que a reforma sempre foi avaliada de maneira a impulsionar a economia do país. “Agora estamos vendo como um sistema mais simples poderia ajudar a combater crises no âmbito financeiro. Se tivesse um comitê único olhando, facilitaria. A crise ajudou a consolidar essa ideia de simplificação para ajudar empresas e o governo em momentos de crise aguda, pois hoje tem que alinhar cada estado, cada prefeitura, cada regime em que as empresas estão caracterizadas, dificultando o desenvolvimento nesse momento”, complementou.
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