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País é muito promissor para a entrada de investidores, mas créditos carecem de regulação mais apropriada, mercado secundário maior e mudanças em operações
A capacidade de liquidez do mercado financeiro brasileiro, os caminhos para a colocação de títulos que atraiam o apetite de investidores e a evolução do crédito local centralizaram a atenção da plateia que compareceu ao evento “Marchas e Contramarchas na Evolução do Mercado de Crédito Brasileiro”, realizado em 19 de março pela Comissão de Tesouraria e Riscos do IBEF-SP. Para o debate, foram convocados especialistas de áreas complementares de crédito de renomadas instituições voltadas para investidores pessoas físicas e investidores institucionais. O evento foi patrocinado pela Market 2 Market – M2M, consultoria especializada em gestão de tesouraria.
O encontro também trouxe à tona um dos fatores que atuam como um freio à entrada de novos investidores estrangeiros no país, como a taxação da variação cambial, um tema que está no topo das discussões do setor do agronegócio.
Interpelado pelo moderador Rodrigo Amato, sócio da M2M, que deu início às discussões sobre o impacto dos títulos incentivados na economia brasileira, Alberto Zoffmann, sócio da área de infraestrutura da XP Investimentos, descreveu os benefícios do produto para o público pessoa física. “O principal ponto positivo, na minha visão, foi a inclusão que o produto incentivado permitiu quando deu a oportunidade para o público participar do mercado de capitais que, até então, era preenchido somente por investidores sofisticados. O outro benefício diz respeito ao aumento do mercado secundário. Quando você vai olhar o trading diário, a empresa que represento é a maior atuante deste mercado secundário, pois os títulos incentivados têm um trade quatro vezes maior que os papéis não incentivados. Especialmente as debêntures de infraestrutura, por conta do prazo longo”, afirmou.
Zoffmann defendeu a importância de se ter um mercado secundário maior no País a fim de se ampliar a liquidez dos títulos. “O mercado secundário se torna muito relevante. Os títulos são longos e você tem que oferecer esse produto. Devemos deter, mais ou menos, 60% do mercado secundário. Gostaríamos de ter 30% em um mercado muito maior. Nossa participação de 60% no secundário é uma necessidade porque o meu cliente na ponta precisa ter acesso a ele”, reconhece.
Ao ser sondado sobre o papel do agente regulador no mercado, Zoffmann chamou a atenção para a necessidade de um mercado mais aberto. “Costuma-se dizer que o mercado de capitais evoluiu muito rapidamente nos últimos anos. E a Instrução CVM 476 não acompanhou essa progressão. E legislação boa é aquela que anda junto com o mercado. Isso está sendo discutido no setor e o nosso grupo de trabalho fez contribuições. O principal tema dessas regulações está na mudança visando um mercado mais aberto. Fora isso, há a lei 12.431/2011 que também está sendo discutida em alguns pontos”.
Mencionando, ainda, o aumento de instrumentos de captação como as debêntures, no caso, a colocação do BNDES de R$ 23 milhões em 2018, acrescentou: “Essa operação foi praticamente o dobro dos R$ 9 milhões de debêntures emitidas em 2017. Mas precisamos lembrar que o Brasil investe em infraestrutura em torno de R$ 125 bilhões ao ano, o equivalente a 1.7% do PIB. Ora, os especialistas dizem que deveríamos investir algo como 4%, 6% do PIB para repor a depreciação dos artigos de infraestrutura, o equivalente a uns R$ 400 bilhões. Então, sempre me perguntam qual é o tamanho deste mercado e eu respondo: R$ 20 milhões, 30 milhões”.
Moacir Teixeira, sócio da Ecoagro, que se notabilizou no mercado com produtos inovadores voltados ao agronegócio, relatou a sua trajetória e as barreiras para poder dar vida à primeira operação com CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) do mercado brasileiro. Para levar a cabo a sua grande façanha, ele apresentou as similaridades do título do agronegócio com os CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários). “A CVM foi entendendo que o CRA é igual ao CRI. E eu estava com dificuldades para vender o CRA. Então, concluí que o mundo queria o CRI “caipira” porque o investidor imobiliário tem a alienação fiduciária como base na garantia. Fui em um investidor que gosta do setor imobiliário e falei: eu quero te vender um CRI “caipira”. E posso te oferecer um penhor de safra que monetiza os recursos. E deu certo”.
Teixeira também defendeu a melhoria regulatória como uma condição para aproximar investidores de grande envergadura como os fundos de pensão, por exemplo. “A evolução anda junto com a melhoria regulatória. A pessoa física precisa ser muito bem defendida na essência do processo e acho que está chegando a hora do mercado institucional, dos fundos de pensão. Eles detêm 95% dos títulos públicos em carteiras. No mundo inteiro, são vistos como investimentos que conferem crescimento”, observa.
Ele próprio dá a receita para alcançar seu intento junto a investidores de porte. “Precisamos desenvolver uma operação via instrução CVM 476 bem montadinha a 130, 140 do DI. Então há possibilidade de desenvolvermos mercados secundários. Aí vamos crescer”.
Membro do comitê de crédito da ARX, Pierre Jadoul aposta no mercado secundário como um destino para os CRIs e CRAs. “Na parte de ativos securitizados, acho que tanto o CRI como o CRA encontrariam muitas restrições nos fundos, seriam mais para o mercado secundário. O fundo tem limites de composição de carteira e respeita limites percentuais de posição”, afirmou.
Dando seguimento, Moacir Teixeira, da Ecoagro, destacou o potencial do mercado de agronegócios. “O agronegócio é hedge. O que eu produzo é exportado. 80% da comida que temos nas nossas mesas vem da agricultura familiar, do pequeno produtor. O grande produtor é monocultor e exportador. Ele não sofre os riscos de desaquecimento de economia, ele não é atingido por nada. Ele só tem um problema com “São Pedro” que é o clima, com o preço e intervenções fiscais. E o mercado todo quer aplicar no Brasil, mas não dá para vir porque é dinheiro de renda fixa”.
O próprio Teixeira apresentou uma solução para o imbróglio. Sua sugestão implica na retirada da taxação da variação cambial. “O investidor aplica dinheiro na variação cambial mais 10%. Aí ele vai embora com a variação mais 20% e não é isso que ele quer, não é isso que ele pode. O que propomos ao governo é a taxação somente sobre o juro”, explica.
O executivo acredita que a nova equipe econômica, juntamente com o Ministério da Agricultura, poderá oferecer melhores condições para o avanço na agricultura se derem ouvidos às reivindicações do setor agrícola, permitindo que investidores externos possam aproveitar o potencial do agronegócio nacional. “Semana que vem, vou estar em Brasília. Eu acredito que, com a visão da ministra da Agricultura, e o entendimento do ministro Paulo Guedes e com a abertura do mercado mundial que está pedindo: ‘por favor, deixa eu investir em vocês’, conseguiremos avanços. Afinal, o agronegócio é longo prazo, é dinheiro de hedge natural. Nós temos um problema crônico no Brasil de falta de recursos e a coisa poderia ser bem melhor. E o pagador de prêmio é o produtor rural. São os investidores que vão colocar recursos de prazo, respeitando o ciclo de produção e uma série de fatores que possibilitarão o nosso crescimento”, arremata.
Camila Abel Correia da Silva, líder da Comissão Técnica de Tesouraria e Riscos do IBEF-SP, observa que o cenário para o segmento é promissor. “Enfim, temos muitas oportunidades de melhoria, então é ótimo que estamos discutindo sobre toda essa evolução e crescimento de mercado”.
(Reportagem: Rosa Symanski)