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As alterações tributárias com efeitos mais relevantes para as empresas, neste ano, foram temas da reunião técnica da Comissão de Tributos, realizada em 9 de março, na sede do IBEF SP. A apresentação foi conduzida pela advogada Valdirene Franhani, sócia do escritório Braga & Moreno e membro da Comissão.
Entre elas, a reforma do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) é um caminho sem volta, observou a advogada. Essas duas contribuições federais incidem sobre a receita bruta auferida pelas empresas e, por possuírem regras extremamente complexas sobre o cálculo do crédito tributário, estão ligadas a 80% dos litígios no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), segundo estimativa do governo.
A intenção de reformular as contribuições, manifestada publicamente por autoridades públicas, vem no contexto de duas decisões recentes em tribunais superiores que representam vitória para as empresas contribuintes – e significativa perda para a arrecadação federal.
ICMS não compõe a base de cálculo de PIS/Cofins – Em 15 de março de 2017, o Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento do Recurso Especial – RE nº 574.706, repercussão geral admitida, com decisão favorável aos contribuintes, ao confirmar que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins. A decisão encerrou uma discussão que se arrastava há décadas, com uma vitória para os contribuintes brasileiros, pois o STF reconheceu a inconstitucionalidade da cobrança de valores feitos pelo Fisco. O acórdão foi publicado no dia 2 de outubro de 2017.
Em resposta, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) apresentou recurso solicitando a modulação dos efeitos dessa decisão, de modo a limitar o número de ações que possam ser ajuizadas por empresas, requerendo restituição de valores pagos nos últimos cinco anos. “A postura da PGFN é restringir isso ao máximo, com a alegação de que haveria dificuldades para operacionalizar esses créditos”, notou Valdirene.
Vale notar que a 6ª Vara Cível Federal de São Paulo permitiu recentemente a exclusão do Imposto sobre Serviços (ISS) da base de cálculo do PIS e da Cofins, em liminar que atendeu pedido da empresa de consultoria Ernest&Young. A decisão segue o entendimento do STF sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo de PIS/Cofins (RE nº 1.221.17), e foi tomada aplicando-se o conceito de similaridade. A discussão sobre a possibilidade de também excluir o ISS da base de cálculo do PIS e da Cofins já chegou ao STF, mas os ministros ainda não decidiram pela exclusão do tributo.
Visão menos restritiva sobre insumos – Outra decisão que irá repercutir em 2018 foi a tomada no último dia 22 de fevereiro, pela 1a. Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que deliberou que insumos, para fins de aproveitamento de créditos de PIS e Cofins, são bens e serviços essenciais para a atividade de uma empresa (RE nº 1.221.17).
Assim, o STJ declarou ilegais as duas instruções normativas da Receita Federal sobre o assunto, por entender que o Fisco acabou violando o princípio da não cumulatividade ao restringir o conceito de insumo. A não cumulatividade permite a apropriação de créditos com o montante cobrado na operação anterior. No PIS e na Cofins, essa apropriação de crédito deve ser segregada item a item, separando qual produto é tributado e qual não é, ao invés de já apropriar-se do total da operação.
Essa visão menos restritiva do conceito de insumos beneficia os contribuintes – e já teve repercussão no Carf. Contudo, empresas que já pleitearam o crédito com base na decisão recente do STJ ainda não tiveram o direito reconhecido no Carf, sob a justificativa de alguns conselheiros do tribunal de que tal precedente só pode ser utilizado após a publicação do acórdão.
“Esse julgamento foi importante porque foi dado em sede de recurso repetitivo, o que tem força enorme. Isso obriga o juiz de 1a. instância e os tribunais de 2a. instância a aplicarem a decisão”, explicou Valdirene.
Caminho sem volta – Após essas duas derrotas do governo, o caminho para a reforma do PIS e da Cofins parece ser inevitável, avalia a advogada. A proposta em estudo pelo governo é sair do cenário atual de se ter dois sistemas (um cumulativo com alíquota menor e sem direito a crédito, e outro não cumulativo com alíquota maior com direito a crédito) para um sistema único, com ampliação de créditos e alíquotas de acordo com o ramo de atividade.
“O interesse e o caminho para a reforma deve ser o da objetividade na apuração, simplificação e celeridade dos processos administrativos de compensação e ressarcimento. Se não, o risco é dar um tiro no pé. Não adianta criar mais artifícios, um sistema ruim, e depois gerar novos contenciosos”, alertou Valdirene.
Assim, ainda existem dilemas a serem solucionados, dentre eles: garantir isonomia entre os setores (comercial, industrial e prestadores de serviços) e não aumentar a carga tributária – que parece inevitável, sobretudo para os setores com poucos créditos, como serviços. O teste do governo para a reforma começaria por mudanças graduais, primeiro com o PIS, e depois a Cofins.
Reforma do ISS – Outro fator de impacto para 2018 são os efeitos da reforma do ISS (Lei Complementar – LC nº 157/2016), que sujeitou à cobrança do tributo os serviços de armazenamento e hospedagem de dados, produção e comercialização de software e streaming de áudio e vídeo, como Spotify e Netflix, cuja natureza é polêmica.
A LC também estabeleceu punição aos Municípios que não respeitarem o recolhimento do tributo com base na alíquota mínima do ISS de 2%, inclusive na forma indireta de redução de base de cálculo e benefícios fiscais.
“A LC nº 157 foi publicada em 29 de dezembro de 2016, mas, em função do princípio da anterioridade, na prática, a aplicação efetiva será em 2018. Alguns municípios ainda estão quietos sobre a mudança na alíquota. Mas terão que aplicá-la, seja pelo lado positivo (para eles), aumento da arrecadação, ou pelo negativo, o risco de punição previsto na lei”, observou a advogada.
Nesse sentido, a Prefeitura de São Paulo sancionou em novembro de 2017 um pacote de medidas que fixa em 2,9% a alíquota do ISS a ser pago por serviços de streaming de áudio e vídeo, observou o advogado Bruno Henrique Coutinho de Aguiar, sócio do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados.
Risco de dupla tributação – Com relação à guerra fiscal, Bruno ressaltou que a mudança abre espaço para conflitos entre municípios e estados pela tributação das empresas que trabalham com bens digitais – que agora ficam sujeitas à dupla tributação por ISS e ICMS, a depender da interpretação de cada fisco.
O advogado acrescentou que, em 1° de abril de 2018, entrará em vigor o Decreto nº 63.099/2017, que regulamenta a cobrança do imposto sobre comercialização de jogos eletrônicos, softwares, programas e plataformas digitais no Estado de São Paulo. “As empresas terão que optar se farão a tributação pelo ICMS, com alíquota de 5%, ou migrar para a tributação por ISS. Contudo, se decidirem fazer a migração para ISS podem se expor a fazer o recolhimento do imposto retroativo aos últimos cinco anos”.
Bruno ressaltou que há questionamento se o Convênio ICMS nº 106/2017, cujos termos foram regulamentados pelo referido Decreto, teria legitimidade para definir essa tributação – o que deveria vir por Lei Complementar. “Aliás, se analisarmos essa questão sob a ótica do artigo 110 do Código Tributário Nacional, nossa visão é que não deveria haver cobrança de ISS nem de ICMS sobre boa parte dos softwares licenciados no mercado, que mais se assemelham a disponibilização de direitos ou locação de coisas. Agora as companhias vão ficar reféns dos fiscos de estados ou municípios – e eventualmente de grandes clientes – sobre o tipo de recolhimento que farão.”
A líder da Comissão de Tributos, Meily Franco, observou que mais uma vez a legislação parece não acompanhar a evolução dos negócios da nova economia, perdendo a oportunidade de criar um ambiente de fomento. Trata-se de mais um capítulo da guerra fiscal entre estados e municípios sobre a tributação de bens digitais.
Quer juntar-se à discussão? A Comissão de Tributos se reúne mensalmente, em um dia de sexta-feira, para debater temas relevantes para os executivos de finanças. Para mais informações, entre em contato com o IBEF SP pelo telefone: (11) 3016-2121 ou mande um email, acesse o formulário: ibefsp/comissoes-tecnicas/.