Para associados / Portal

Somos o maior Instituto de Finanças do Brasil

O impacto do blockchain nas empresas

Getting your Trinity Audio player ready...

Por Bruno França, membro da Comissão Técnica de Instituições Financeiras do IBEF-SP e Coordenador de FP&A, Tesouraria e Controladoria na iFinance

Se pensarmos nas últimas décadas, o que protege nossos ativos e estabelece nossos limites no sistema econômico? Contratos, transações e registros. São eles os responsáveis por determinar e verificar identidades e eventos crônicos. É com base neles que indivíduos, comunidades, organizações e nações interagem. Essas ferramentas burocráticas se perpetuam por muito tempo e se mantêm mesmo após a transformação digital na economia. É o mesmo que possuirmos dentro de um porta-aviões, com seus caças supersônicos, o famoso 14-bis (avião construído pelo inventor brasileiro Alberto Santos Dumont). No mundo digital, a forma de controle e a maneira como regulamos nossa administração precisa mudar. E, nessa direção, o blockchain pode resolver esse problema.

Tecnologia que nasceu junto às moedas virtuais, de forma simples, o blockchain é um livro aberto no qual pode-se gravar transações entre duas partes com eficiência e de forma verificável e permanente. Através do blockchain é possível sonhar com um mundo onde os contratos são armazenados e compartilhados em bancos de dados transparentes, em formatos de códigos, protegidos de exclusão ou alteração. Todo contrato, tarefa e pagamento possuem um registro e assinatura digital que podem ser identificados, validados, armazenados e compartilhados.

O mercado já está trabalhando com blockchain e muitas pessoas já ouviram que haverá uma revolução nos negócios, trazendo redefinição de empresas e economias; que muitas barreiras tecnológicas, de governança e até sociais serão quebradas. Porém, há um ponto de atenção antes de qualquer empresa implementar o blockchain: o fato de que é preciso entender melhor sua dinâmica.

Ainda é muito cedo para acreditarmos que negócios e governos, liderados por blockchain, conseguirão uma transformação em curto prazo. Isso porque o blockchain não é uma tecnologia disruptiva, que pode transformar um modelo de negócio tradicional em um negócio com solução a baixo custo, fazendo com que as empresas atinjam a liderança em seu segmento. Blockchain é sim uma tecnologia primordial para o futuro das empresas, pois cria funções para o sistema econômico e social, mas esse impacto levará décadas.

O processo tende a ser gradual e constante, porém não repentino. Isso porque há algumas implicações estratégicas possíveis com base na história:

  • O processo de transformação típico de outras tecnologias fundamentais. Por exemplo, para termos a velocidade atual de informações, através da internet, houve a necessidade de distribuição de redes de transmissão. Ao contrário do que a maioria imagina, a internet não foi criada nos anos 1990. Ela teve sua origem em 1972, pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos, que criou um mecanismo para transmissão de informações entre os pesquisadores da ARPAnet. Depois de muito tempo e bilhões de investimento pelas empresas de Telecom, fornecedores e fabricantes de equipamentos, conseguimos chegar à tecnologia que temos hoje. Só após a infraestrutura ganhar amplitude, as empresas aproveitaram o baixo custo de conectividade para criar serviços de internet e substituir os modelos de negócios existentes.
  • O blockchain é uma rede peer-to-peer que fica acima da internet e foi introduzida em outubro de 2008 como parte de uma proposta de bitcoin. Bitcoin foi a primeira aplicação da tecnologia blockchain. Os paralelos entre blockchain e a transformação da internet são claros. Assim como um e-mail é habilitado para envio de mensagens bilaterais, o bitcoin permite transações financeiras bilaterais. O desenvolvimento e a manutenção do blockchain são abertos, distribuídos e compartilhados, assim como a internet. Uma equipe de voluntários em todo o mundo mantém o software principal. E, assim como o e-mail, o bitcoin pegou pela primeira vez uma comunidade entusiasmada, mas relativamente pequena.
  • Se o bitcoin é como o e-mail no passado, serão necessárias décadas para que o blockchain atinja todo o seu potencial? Não podemos prever exatamente quantos anos essa transformação vai demorar, mas podemos entender quais tipos de aplicativos ganharão tração primeiro e como a ampla aceitação do blockchain eventualmente virá. Com base na história, podemos identificar duas dimensões que demonstram como uma tecnologia de base e seus casos de uso de negócios evoluem:
    1. A primeira é a novidade. O grau em que um aplicativo é novo para o mundo. Quanto maior for sua aceitação, maior será o esforço necessário para garantir que os usuários entendam como usar essa aplicação;
    2. A segunda dimensão é a complexidade, representada pelo nível de coordenação do ecossistema envolvido (o número e a diversidade de partes que precisam trabalhar juntas para produzir valor com a tecnologia). Por exemplo, uma rede social com apenas um membro terá pouco uso; uma rede social só vale a pena quando muitas conexões interagem.

Mas como os executivos devem pensar sobre blockchain para suas organizações? Para a maioria, o melhor lugar para começar é o uso de aplicações próprias, que minimizam os riscos porque não envolvem coordenação com terceiros. Uma estratégia, por exemplo, é adicionar o bitcoin como mecanismo de pagamento. A infraestrutura e o mercado de bitcoins já estão bem desenvolvidos e adotar a moeda virtual forçará uma variedade de funções, incluindo TI, finanças, contabilidade, vendas e marketing, para construir as capacidades do blockchain.

Outra abordagem de baixo risco é usar blockchain internamente como um banco de dados para aplicações de gerenciamento de ativos físicos e digitais, registrando transações e verificação de identidades. Isso pode ser uma solução especialmente útil para as empresas que lutam para reconciliar vários bancos de dados internos. Testar aplicações de uso único ajudará as organizações a desenvolver as habilidades necessárias para aplicativos mais avançados.

Além de fornecer um modelo para o blockchain, a internet suavizou o caminho para isso. A rede se tornou onipresente e aplicações de blockchain estão sendo construídas em cima da infraestrutura digital de dados, comunicação e computação, o que reduz o custo da experimentação e permitirá que novos casos de uso surjam rapidamente. Os executivos podem descobrir por onde iniciar a construção de suas capacidades organizacionais para blockchain, mas para isso é preciso garantir que suas equipes aprendam sobre essa tecnologia, para desenvolver a empresa e investir em infraestrutura de blockchain.

Dados os horizontes temporais, barreiras à adoção e pura complexidade envolvida em chegar aos níveis de aceitação da internet, os executivos devem pensar cuidadosamente sobre os riscos envolvidos na experimentação de blockchain. Claramente, começar pequeno é uma boa maneira de desenvolver o know-how para pensar maior. Mas o nível de investimento deve depender do contexto da empresa e de setor. Companhias de serviços financeiros são as mais propensas a adotar o blockchain, já as indústrias ainda não. Não importa qual seja o contexto, há uma forte possibilidade do blockchain afetar seus negócios. A questão mais importante é quando.

 

As opiniões e conceitos emitidos no texto [acima] não refletem, necessariamente, o posicionamento do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (IBEF) a respeito do tema, sendo seu conteúdo de responsabilidade do autor.

Para Associados

Para ter acesso ao demais conteúdos, você precisa ser Associado IBEF-SP

×
Pular para o conteúdo