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O que fica da visita de Dilma aos EUA?

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Marcos Troyjo é professor-adjunto de relações internacionais e políticas públicas da Universidade Columbia, em Nova York, onde dirige o BRICLab (Centro de Estudos sobre os BRICS).

 

A presidente Dilma Rousseff viajou a Washington no contexto de uma difícil situação econômica no Brasil. Os mais otimistas entendem que, com a visita da chefe de Estado brasileira, as relações econômicas com os Estados Unidos poderiam abrir perspectivas para mudar o pessimismo vigente.

Ao longo dos anos, o Brasil tem oscilado entre momentos de maior ou menor interesse em Washington. Estamos num daqueles períodos de “desapontamento” com o “no profile” da política externa brasileira e a percepção de que o sobe-e-desce recente de nossa economia configura mais um “voo de galinha”.

As relações governo-a-governo estão oceanos aquém das oportunidades. Isso é muito ruim. Em comércio, investimento ou defesa, hoje não há iniciativas de monta entre as duas maiores democracias do Ocidente.

Tal distanciamento representa um dos principais desperdícios de parceria do mundo contemporâneo. E, no potencial irrealizado, perde mais o Brasil. Precisamos, no mais alto nível, afirmar nossa predisposição a trabalhar por um tratado comercial com os Estados Unidos, seja bi ou plurilateralmente.

 Recuperar a confiança demanda tempo e inflexão de rumo por parte do governo brasileiro

Hoje, quando avaliamos o nível de interesse de investidores americanos no Brasil para participar, por exemplo, do Programa de Investimentos em Logística  ou de outras oportunidades em infraestrutura, percebemos que o Brasil passa por um “rescaldo”.

De um lado, há a continuação de investimentos por parte de empresas que decidiram estabelecer ou ampliar suas operações no Brasil naquele momento de “brasilmania” entre 2010 e 2011. Muitas delas programaram seus desembolsos numa escala de tempo que em certos casos dura uma década.

De outro, o subdesempenho da economia brasileira no último quadriênio e particularmente nos últimos 6 meses tem funcionado como freio a novo fluxo de IEDs (investimentos estrangeiros diretos).

Como resultado, os investimentos atraídos a novos programas de infraestrutura se darão de maneira menos impactante, e portanto mais gradual, do que o governo brasileiro supõe.

É um erro ver o aporte de capital com as concessões como panaceia. Intervenções recentes em políticas de preço na eletricidade, gasolina; o sucateamento político das agências reguladoras, e a inflexibilidade nas regras de conteúdo local continuam a desestimular investidores norte-americanos. Recuperar a confiança demanda tempo e inflexão de rumo por parte do governo brasileiro.

Nesses próximos 18 meses haverá, contudo,influxo significativo de capital norte-americano visando a transações de M&A (fusões e aquisições). Ele será motivado pela combinação de fatores como o tamanho comparado da economia brasileira (ainda o segundo maior mercado emergente) e o preço relativo mais baixo dos ativos no Brasil – resultante da desaceleração econômica e desvalorização do real. Se isso significa novos aportes, por outro representa transferência de titularidade acionária, e portanto desnacionalização, sobretudo no setor manufatureiro.

 Forças conjunturais podem empurrar Brasil e EUA a uma reaproximação

No nível político, depois dos atritos decorrentes da espionagem da NSA, o encontro Dilma-Obama deveria fechar o capítulo da desconfiança.  Infelizmente, o desperdício de potencial é a marca das relações Brasil-EUA. Na medida em que nenhum tema de relevo encontra-se na pauta bilateral, o peso relativo do episódio da espionagem foi hipertrofiado. O Brasil, em vez de aproveitar a barbeiragem americana para obter vantagens ante a maior economia do planeta, preferiu ficar de mal. O episódio atrasou o que poderia ser ambiciosa agenda de comércio e investimentos.

De agora em diante, no entanto, forças conjunturais podem empurrar Brasil e EUA a uma reaproximação. Apostas da política externa brasileira mostraram-se infrutíferas. O Mercosul está à deriva. O Acordo com os europeus (EU-Mercosul) ainda é incerto. O declínio do preço dos bens primários mundo afora compele o Brasil a alternativas comerciais. E é no mercado americano que o Brasil pode ancorar revigorada receita exportadora de produtos com maior valor agregado.

Para os EUA, é impossível subestimar o Brasil – segunda maior democracia do Ocidente e segundo PIB das Américas. Washington está “tomando um baile” da China na Ásia, para onde supostamente migraram seus grandes interesses estratégicos. A adesão de tantos aliados tradicionais dos EUA ao banco de infraestrutura liderado por Pequim convida Washington a olhar novamente para a América Latina, onde a China também estabeleceu forte cabeça-de-ponte. E daí ressurge a importância do Brasil.

Dilma tem pela frente a difícil implementação do ajuste fiscal e seus graves problemas de governabilidade. Obama precisa lidar com uma maioria republicana no Congresso que não lhe garante apoio automático em algumas de suas iniciativas em política externa como Cuba, Irã, ou mesmo as meganegociações comerciais no Atlântico ou no Pacífico.

A retomada Brasil-EUA é de construção longa e difícil, mas o mais importante agora é apertar o botão de “reiniciar”.

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