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Recuperação do mercado de capitais proporciona oportunidades de captação

A recuperação do mercado de capitais após o impacto mais forte da crise da pandemia do novo coronavírus (COVID-19) já pode ser identificada como uma oportunidade para novas captações. No webinar Panorama para Captação de Recursos sob a Ótica das Empresas e do Mercado, promovido pelo IBEF-SP no dia 28 de julho, essas oportunidades foram debatidas e ressaltadas por especialistas do mercado, tanto na renda fixa quando no mercado de equities e de dívida. Rosangela Santos, líder da CT de Mercado Financeiro e de Capitais do IBEF-SP, mediou o painel.

Desde o início da pandemia até o atual momento, o cenário e percepção de risco das pessoas melhorou. Para Augusto Martins, diretor-executivo de Corporate & Investment Banking no Banco Alfa, de forma geral, o mercado vinha, antes da crise, operando de maneira positiva, com renda fixa caminhando bem, em níveis históricos de taxas baixas, e a expectativa era boa para renda variável também. “Com a crise, que foi mais estrutural, os mercados travaram, houve uma escassez de liquidez, as empresas e mercado sofreram, e uma série de atitudes começaram a ser tomadas para tentar ajudar empresas e pessoas saírem desse momento e evoluir”. Entre essas ações estão as medidas do Banco Central para tentar injetar liquidez no mercado, destaca Martins.

Para ele, a partir de agora, o panorama para as empresas tomarem recursos será mais razoável, com custos menores. “A cada dia devemos ter mais liquidez, os investidores estarão mais dispostos para tomar posições, e o panorama de captação será melhor. A nossa perspectiva é que essa retomada se mantenha daqui pra frente, a menos que o cenário reverta com uma nova onda da pandemia, ou um novo fator que mude o ambiente”, diz Martins.

Diante desse cenário, Ricardo Russo, sócio na Pinheiro Neto Advogados, avalia que a grande palavra que se vê hoje no mercado, especialmente de dívida, é resiliência. “O Brasil demonstra, mesmo diante da crise, um mercado com fechamento alto e sofisticação. E isso vem ganhando força nos últimos 10 anos. Temos R$ 200 milhões em média sendo captados por ano no mercado de dívida, mais de 300 ofertas públicas no ano passado, e um leque enorme, seja para investidores, seja para companhias. Se é operação para capital de giro, financiamento, transações de M&A ou capex, ou para projeto prioritário de infraestrutura, temos diversos mecanismos à disposição”, conta.

Russo diz ainda que entre 2003 e 2008, houve a edição e modernização de novas regras pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que permitiram acesso ao mercado de capitais pelas companhias locais. “Com essa evolução, vimos o uso e ressurgimento do mercado de capitais local a partir de operações de equity. Tivemos pouca operação de renda fixa, e isso passou a ser observado a partir de 2009, que permitiu as ofertas restritas, a partir das quais houve uma grande revolução do mercado. Começamos a ver, desde 2012, grandes operações de dívidas, acima de R$ 1 bilhão”. 

A partir de 2015, Russo nota que houve maior sofisticação do mercado. “Tínhamos operações bilaterais, depois uma otimização de ofertas restritas, e operações de longo prazo que começaram a ser mais sofisticadas através de pacotes de garantia. Hoje temos esse leque, e o mercado de capitais está pronto para oferecer diversos tipos de estrutura, seja para investidores, seja para companhias, adequados aos seus interesses específicos”, destaca. 

Mercado de ações – Para Daniela Anversa, sócia da área de mercado de capitais e financeiro na Veirano Advogados, o mercado de equities também está superaquecido. “Ninguém esperava que o mercado de IPO e abertura de capital voltasse tão cedo”, diz. Ela cita que há aproximadamente 30 empresas aguardando uma janela para poder acessar o mercado, sendo que algumas já estão em roadshow. “O mercado voltou pelo cenário da baixa taxa de juros, o que leva o investidor a procurar algo mais rentável ao seu portfólio. Há mais investidores na bolsa querendo investir em papéis novos, e muita liquidez”, diz.

Durante a pandemia, agências de fomento e bancos centrais injetaram dinheiro no mercado para estimular liquidez, o que gerou uma mudança estrutural, segundo Daniela. “Antigamente, quando começou a onda de IPOs, a gente via ofertas maiores na casa de bilhões, ou eventualmente acima de R$ 600, R$ 700 milhões, sendo que esse tipo de oferta sempre tinha um elemento de 70% a 75% de investidores estrangeiros participando. Isso mudou”. Ela destaca que há hoje no mercado mais ofertas de empresas menores acessando bolsos diferentes, incluindo a pessoa física no Brasil, e muitos investidores só brasileiros. “Tivemos um shift mais local. Algumas ofertas nem contarão com o elemento de esforço de venda no exterior, sendo somente no Brasil, com investidores locais, e isso é muito novo para o mercado de capitais brasileiro”, enfatiza.

Rosangela Santos também destaca a mudança cultural em relação ao acesso ao mercado de capitais por renda variável, saindo da renda fixa, o que leva um desafio de atração para esse mercado. Nesse sentido, Augusto Martins ressalta que agentes autônomos e corretoras acabaram pulverizando o mercado. “As empresas também começaram a olhar para isso, sentindo mais conforto em avaliar operações de equity, e os executivos da área de finanças aumentaram o contato com esse tipo de operação. Antes, esse mercado era mais restrito no Brasil”, pontua.

Para ele, a preocupação é o quanto o investidor tem conhecimento do que faz. “Muita gente pegou o boom da bolsa até 120 mil pontos, mas a nossa visão é positiva, pois as pessoas estão se interessando mais, e temos um componente fundamental que é a taxa de juros baixa. Quem quiser mais retorno sobre o capital e crescimento maior deve ir para renda variável, e tem um caminho para esse mercado como geração de alfa”, complementa.

IPO – O aumento recente de ofertas públicas, e consequente aquecimento do mercado de ações, também pode ser justificado pelos fundos de private equity, que começaram a chegar nos seus prazos de saída. “O que noto é muito fundo de private equity com investimento maturado e vendo uma oportunidade de começar a sair das empresas. Esse é um elemento importante a ser considerado”, diz Daniela.

Além disso, ela ressalta que a bolsa está há anos educando sobre o mercado de equity. “Contudo, uma empresa, ao fazer uma oferta, deve ter o cuidado de se preparar. A janela está aberta, e muitas companhias se sentem seduzidas pela possibilidade do IPO, mas é necessário um tempo de organização para fazer abertura de capital. É um turning point, um momento em que ela passa a ser vista por todo o mercado”, alerta, enfatizando que é preciso verificar se vale a pena trabalhar no disclosure das informações para sair na oferta mais preparado. “Isso é fundamental para uma empresa ao se pensar em acessar o mercado”.

Agenda ASG – Cada vez mais presente no dia a dia das empresas, a agenda ASG (Ambiental, Social e de Governança) ganhou força. Augusto Martins conta que gestores estão cada vez mais se atentando a esse tema, incluindo green bonds, emissões fora do Brasil que incentivam selo verde, e que essa é uma agenda que veio para ficar. “Há uma preocupação, devemos ver uma série de produtos nessa linha e benefícios para eles, seja na taxa de juros ou na taxa de administração, e é uma agenda muito forte que está em pauta, não é moda”, ressalta.

Do ponto de vista regulatório, do olhar da CVM, sempre existiu essa preocupação com disclosure ambiental, diz Daniela Anversa, mas antigamente, esses campos no formulário de referências eram menores, e hoje, ao se analisar o disclosure, é preciso estar mais preparado, com mais informações. “Inclusive, quando se acessa ao mercado e faz abertura de capital, os bancos tocam no assunto socioambiental como um ponto de venda, algo que não existia antigamente. Isso reforça a importância desse tema”, destaca.

Ricardo Russo ressalta que nas operações de crédito havia regras que se traduziram em declarações que as companhias tinham que dar com garantias sobre regras socioambientais. “Com o tempo, isso foi migrando para as operações de mercado de capitais de dívida. Quem participava como intermediário colocava na sua estrutura de operações as mesmas declarações nas escrituras. Raramente existe uma operação de crédito sem esse tipo de dispositivo na documentação”, comenta. 

O mercado conta, inclusive, com o selo sustentável e um projeto de lei para benefícios fiscais para quem tiver selo verde ao emitir títulos de renda fixa. “Já se tornou uma prática em alguns setores que precisam de funding, como empresas de saneamento, mobilidade urbana ou energia renovável. Quando estão estruturando uma oferta de renda fixa, já é quase obrigatório pegar o selo verde”, destaca Russo. Mas ainda há ainda um crescente para companhias obterem o selo verde, demandando projetos ou compromisso para alocação de recursos com respeito a políticas socioambientais. 

Do ponto de vista de geração e alfa, o impacto ainda não é grande, mas no que diz respeito à imagem das companhias, já há impacto na adoção de critérios ASG, e o mercado deve entender, no futuro, que essas emissões são benéficas, segundo Augusto Martins. “Não é de um dia para o outro que esse selo dará uma redução drástica nos custos, mas como consequência isso levará a uma redução nas taxas conforme haja uma conscientização dos investidores em olhar para isso”.

PMEs – A entrada de empresas de menor porte no mercado de capitais e captação de recursos foi um tema explicado no webinar. Segundo Rosângela, as fintechs podem auxiliar nessa captação. Já Ricardo Russo destaca que os FIDCs oferecem a grande vantagem de não impactar o endividamento da companhia. “As fintechs vêm preencher uma necessidade do mercado. Às vezes pequenas e médias empresas não conseguem fazer estruturas de FIDCs. E agora elas têm esse acesso a crédito nessa forma de captação”, explica.

Daniela destaca que há também muito trabalho da bolsa em desenvolver o Bovespa Mais e facilitar que as PMEs acessem o mercado de equity. “É uma educação para a companhia que se lista e começa a ganhar mais musculatura como companhia aberta, podendo fazer ofertas menores”, diz. “A CVM também está colocando outras formas de captação de recursos para PMEs, como o crowdfunding“, complementa. Augusto Martins ressalta, contudo, que há uma lição de casa para essas empresas, que é cada vez mais fazer um esforço de profissionalização da estrutura. “Isso que dá sustentação para uma emissão, mesmo que inicial, mas para quem olhar de fora possa perceber uma governança instalada e que passe conforto ao tomador de risco”. 

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