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Por Sergio Volk*
A decisão da Conferência do Clima das Nações Unidas (COP 28), sediada nos Emirados Árabes Unidos, desencadeou uma série de reflexões sobre a transição energética e a sustentabilidade financeira em meio ao desafio global das mudanças climáticas. A confirmação de Belém, Pará, como sede da próxima COP 30, em 2025, e Baku, Azerbaijão, como sede da COP 29, em novembro de 2024, evidenciou a importância da cooperação internacional na busca por soluções ambientais.
No entanto, o acordo final da COP 28, apesar de seu progresso significativo na redução gradual do uso de combustíveis fósseis para diminuir as emissões de gases de efeito estufa, levantou questões cruciais sobre a transição energética e os recursos financeiros necessários para sua implementação.
A falta de detalhes sobre a transição energética e os recursos financeiros na COP 28 indica a complexidade das discussões que ocorreram durante a conferência. Este aspecto é especialmente evidente quando consideramos o contexto em que o evento foi sediado: os Emirados Árabes Unidos, um dos maiores produtores de petróleo do mundo.
Neste cenário, as discussões sobre a redução do uso de combustíveis fósseis e a transição para fontes de energia mais limpas e sustentáveis enfrentaram desafios particulares. Os Emirados Árabes Unidos têm uma economia altamente dependente do petróleo, o que pode ter influenciado a falta de detalhes sobre a transição energética no texto final da COP 28. Além disso, a questão dos recursos financeiros necessários para apoiar essa transição também pode ter sido complexa devido às preocupações com o impacto econômico em países produtores de combustíveis fósseis.
Portanto, a ausência de informações detalhadas sobre esses temas reflete a dificuldade de alcançar um consenso em uma conferência climática sediada em um grande produtor de petróleo, onde interesses econômicos podem estar em conflito com objetivos ambientais de longo prazo.
A necessidade de uma transição energética global para fontes mais sustentáveis é uma urgência imperativa diante dos desafios das mudanças climáticas. As emissões de gases de efeito estufa provenientes da queima de combustíveis fósseis estão exacerbando os efeitos do aquecimento global, levando a fenômenos climáticos extremos, elevação do nível do mar, acidificação dos oceanos e perda de biodiversidade.
Para enfrentar esses desafios e garantir um futuro sustentável para as gerações futuras, é essencial reduzir drasticamente a dependência de fontes de energia não renováveis, como o petróleo, carvão e gás natural, em favor de fontes mais limpas e renováveis, como a solar, eólica, hidrelétrica e outras energias renováveis.
No entanto, os desafios financeiros representam uma barreira significativa para essa transição energética. A implementação de infraestrutura para energias renováveis, como a instalação de parques solares e eólicos, a expansão da rede elétrica para integrar essas fontes de energia intermitentes e a modernização das redes de transporte para veículos elétricos exigem investimentos substanciais. Além disso, o custo inicial de tecnologias sustentáveis muitas vezes é mais elevado do que as alternativas baseadas em combustíveis fósseis, o que pode desencorajar investimentos e retardar a transição.
Os desafios financeiros também incluem a necessidade de repensar os modelos de negócios e os sistemas financeiros globais para incentivar investimentos em energia limpa e sustentável. Isso pode envolver a reforma de políticas públicas, como a implementação de incentivos fiscais para energias renováveis, a precificação do carbono para internalizar os custos ambientais das emissões de carbono e a criação de instrumentos financeiros inovadores, como títulos verdes e fundos de investimento sustentáveis.
É crucial, também, garantir o acesso a financiamento para países em desenvolvimento, que muitas vezes enfrentam restrições financeiras para investir em infraestrutura sustentável.
O conceito de financiamento sustentável propõe uma abordagem inovadora para enfrentar os desafios financeiros associados à transição energética para fontes mais limpas e renováveis. Uma das propostas mais promissoras é transferir a externalidade do consumo de combustíveis fósseis dos consumidores para os produtores, criando assim uma fonte adicional de recursos financeiros para impulsionar a transição energética. Essa abordagem inovadora busca responsabilizar os produtores pelos danos ambientais causados pela queima de seus produtos, internalizando os custos ambientais associados às emissões de carbono e outros poluentes.
Ao transferir a externalidade para os produtores, essa abordagem não apenas cria um incentivo econômico para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, mas também direciona recursos financeiros para investimentos em projetos sustentáveis e de baixo carbono. Além disso, ao internalizar as externalidades ambientais, as empresas são incentivadas a adotar práticas mais responsáveis, como a redução da pegada de carbono e a incorporação de princípios ESG (ambientais, sociais e de governança) em suas operações. Isso não só promove a responsabilidade corporativa, mas também pode gerar recursos adicionais para financiar projetos sustentáveis e impulsionar a economia verde.
Essa abordagem também tem o potencial de catalisar a inovação e o desenvolvimento de novas tecnologias sustentáveis, à medida que as empresas buscam soluções mais eficientes e de baixo carbono para minimizar seus impactos ambientais. Em última análise, o financiamento sustentável representa uma oportunidade única para alinhar os interesses econômicos com os objetivos ambientais, promovendo assim uma transição energética justa e sustentável para um futuro mais verde e resiliente.
Embora promissora, essa não é uma alternativa nova. O princípio 16 da Declaração do Rio, estabelecido durante a Cúpula da Terra de 1992, ressalta a importância crucial de internalizar os custos ambientais como parte integrante do desenvolvimento sustentável.
Essa declaração reconhece que as atividades econômicas muitas vezes geram externalidades negativas para o meio ambiente, e os custos associados a essas externalidades devem ser internalizados pelas partes responsáveis. Ao fazê-lo, as empresas e governos assumem a responsabilidade total pelos impactos ambientais de suas atividades, levando em consideração não apenas os custos diretos, mas também os custos ambientais indiretos associados à degradação dos recursos naturais e à poluição.
Um levantamento encomendado pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura estima custo entre R$ 31 bilhões e R$ 52 bilhões para recuperar a cobertura vegetal removida da Amazônia destaca a magnitude do desafio enfrentado na restauração desses ecossistemas vitais. Essa cifra expressiva reflete não apenas a extensão do desmatamento na região, mas também os custos associados à implementação de projetos de recuperação ambiental em uma escala tão vasta.
A formação de profissionais e o aprimoramento de técnicas de restauração são componentes essenciais para o sucesso desses esforços de recuperação da cobertura vegetal. Investir na capacitação de técnicos, engenheiros florestais e outros profissionais envolvidos na implementação de projetos de restauração é fundamental para garantir a eficácia e a sustentabilidade dessas iniciativas.
Adicionalmente, o desenvolvimento e aprimoramento contínuo de técnicas de restauração, incluindo métodos de plantio, manejo do solo e monitoramento de ecossistemas, são essenciais para maximizar os resultados e minimizar os custos associados à recuperação da cobertura vegetal.
À medida que avançamos em direção a um futuro mais sustentável, é crucial reconhecer o papel fundamental das finanças sustentáveis na promoção da transição energética e na conservação ambiental. Incorporar os custos de externalidades, investir em projetos de restauração e explorar fontes de energia alternativas são passos essenciais na construção de um mundo mais ecoconsciente e resiliente.
Por meio de uma abordagem colaborativa e inovadora, podemos enfrentar os desafios das mudanças climáticas e criar oportunidades para um desenvolvimento sustentável em todo o mundo.
• Sergio Volk, economista, é presidente do Conselho Fiscal do IBEF-SP. Possui ciclo de doutoramento em economia pela EPGE-FGV/RJ, é mestre pela PUC-SP em Contabilidade, Finanças e Auditoria, Conselheiro Fiscal e professor no MBA da FEI.