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Tomar decisão sem considerar os efeitos da inflação sobre o balanço pode colocar empresa em risco, alerta webinar da CT de Controladoria e Contabilidade

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“Os tomadores de decisão da empresa precisam saber se estão com as informações corretas. E hoje, infelizmente, a contabilidade pode não dar isso”. O alerta é de Eliseu Martins, professor emérito da FEAC-USP, sobre os riscos de não considerar os efeitos da inflação no balanço, o que pode gerar graves distorções. A empresa pode estar se descapitalizando sem perceber.

Eliseu foi um dos convidados do webinar “Efeitos da inflação sobre o balanço: o que poucos estão enxergando”, que contou com cerca de 100 participantes online e quase duas horas de duração, marcando um sucesso absoluto. O evento foi organizado e realizado pela Comissão Técnica de Controladoria e Contabilidade do IBEF-SP no último dia 6 de outubro. 

Participaram também do webinar como palestrantes Ariovaldo Santos, professor titular do Departamento de Contabilidade e Atuária da USP, e Paulo Roberto Gonçalves Ferreira, superintendente de Normas Contábeis da CVM.

O evento teve como host Antonio Coló, CEO da SCA Systema e membro da Comissão de Controladoria e Contabilidade. A apresentação foi realizada por Rosangela dos Santos, líder da Comissão de Mercado Financeiro e de Capitais, e o debate conduzido por Alexandre Staffa, líder da Comissão de Controladoria.

Problema global – Coló destacou que a inflação está entre as grandes preocupações dos executivos financeiros em todo o mundo. “De problema antes restrito a países menos desenvolvidos, ela tornou-se questão global comum aos países de economia mais sólida, como Estados Unidos, Inglaterra e nações europeias”.

Assim, a relevância do tema e as soluções apontadas podem se estender não só ao Brasil como a outros países, completou o executivo.

Efeitos sobre o balanço – O professor Eliseu Martins trouxe o olhar da lógica econômica acerca dos efeitos da inflação sobre os itens componentes de patrimônio, balanço e resultado. Segundo ele, utilizar o modelo da correção integral para esses itens ajuda a eliminar as “armadilhas” trazidas pela inflação. Isso diminui riscos para quem toma decisão, comparado a quem avalia apenas os resultados do balanço nominal (em moeda corrente).

Um dos exemplos citados é o das aplicações financeiras, do lado dos ativos monetários. Considere uma aplicação de R$ 100 milhões, a uma taxa de 7%, que ao final do período teve rendimento nominal de R$ 7 milhões. No modelo da correção integral, considera-se o quanto essa aplicação perdeu com a inflação no período. Se a inflação foi 5%, a aplicação sofreu uma perda de R$ 5 milhões e o rendimento real foi de 2 milhões.

“Calculamos a perda (com a inflação), deduzimos desse rendimento nominal, e na demonstração do resultado pela correção integral aparecerá a ‘receita financeira real’ ou ‘perda real’. Em 2021, muitas empresas tiveram receitas financeiras que não compensaram as perdas em suas aplicações financeiras”, explicou Eliseu.

Ativos não monetários, como estoques e imobilizado, também precisam ser corrigidos pela inflação, considerando desde a data que se formaram no balanço. Inclusive, as depreciações acumuladas, no caso do imobilizado. 


O balanço no modelo de correção integral também pode revelar que passivos monetários proporcionaram ganhos para a empresa, caso o passivo tenha crescido em taxa menor que a inflação. Assim, é importante fazer o cálculo considerando o efeito da inflação e realizar a dedução das despesas nominais.

“Em todas as contas que geram perda ou ganho e dizem respeito a despesas ou receitas operacionais, o efeito da inflação sobre os saldos de balanço tem que ser considerado diretamente como um ajuste na conta própria. Esse modelo da correção integral é o melhor conhecido hoje no mundo”, completou Eliseu.

Distorções no balanço e decisões equivocadas – O professor Ariovaldo dos Santos reforçou em sua apresentação os riscos de se considerar apenas os itens do balanço nominal como referência. Ele citou o exemplo das alíquotas de imposto de renda, calculadas sobre o valor do lucro nominal, em vez do ajustado pela inflação como no modelo da correção integral. Em muitos casos, pode haver um descolamento da realidade: a empresa estar pagando muito mais ou menos imposto do que deveria.

Mas será que o problema se restringe apenas aos impostos pagos? O docente da USP mostrou que as distorções geradas pela base do balanço nominal podem resvalar em outras questões, como distribuição de dividendos, participações nos lucros para empregados e administradores e todas as avaliações feitas considerando custo de capital próprio e custo de capital de terceiros.

O professor evidenciou com vários exemplos reais as diferenças encontradas nos resultados dos balanços nominais publicados versus seu comparativo pelo modelo da correção integral. Ao se considerar os efeitos da inflação no período, várias empresas com lucro no balanço nominal registraram perdas. Assim como empresas que registraram perdas nominais podem ter obtido ganhos com a inflação que melhoraram seus resultados.

Ariovaldo destacou que o objetivo é chamar a atenção do mercado. “Os números apenas em valores nominais, apresentados nas demonstrações contábeis, podem não ser confiáveis para a tomada de decisão dos administradores. E isso não pode ser generalizado por setor ou segmento: é preciso olhar cada empresa e ir ponto a ponto do seu balanço. Só assim se poderá fazer essa avaliação”.

Evolução regulatória – Paulo Roberto Gonçalves Ferreira, superintendente de Normas Contábeis da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), tratou da evolução regulatória referente à correção monetária de balanço nas demonstrações financeiras. Ferreira fez o disclaimer de que sua apresentação retratou opiniões pessoais e não institucionais do órgão.

Após o período hiperinflacionário no Brasil, a exigência da divulgação da correção monetária nos balanços foi revogada com a Lei 9.249/1995 (legislação tributária).  A norma vedou a utilização de qualquer sistema de correção monetária para demonstrações financeiras, inclusive para fins societários.

No ambiente do mercado de valores mobiliários brasileiro, a correção monetária integral foi introduzida na forma de demonstrações financeiras complementares pela Instrução CVM 64/1987, e avançou com a ICVM 191/1992. Contudo, em linha com o preconizado pela Lei 9.249, a ICVM 248/1996 retirou a necessidade de apresentação de demonstrações anuais e intermediárias com correção integral.

“Mas a ICVM 248 deu a possibilidade de se ter essas demonstrações com correção integral de forma facultativa. Ou seja, conforme a discricionariedade da empresa. Ou seja, ela não vedou a elaboração e divulgação das demonstrações contábeis com correção integral”, explicou Ferreira.

Riscos para as empresas – Entre os riscos e efeitos negativos de se tomar decisão sem considerar a correção monetária pela inflação nas demonstrações financeiras da empresa, estão: possibilidade de superdimensionar o retorno sobre o capital investido; decisões de investimento que podem destruir valor para o acionista ao invés de gerar valor; discussão sobre o cômputo do IR e da CSLL; equívocos na distribuição de dividendos, política de remuneração e outras, baseadas no resultado nominal da companhia.

Todo esse cenário foi considerado ao se fazer a revisão da ICVM 191, em linha com o Decreto 10.139/2019, que se transformou na Resolução CVM 157/2022.  “A solução possível foi emitir ato normativo, em caráter voluntário, que possibilitasse às companhias apresentar demonstrações complementares pelo método da correção monetária integral”.

CPC 42 e Resolução CVM 157 – Ferreira disse que, a seu ver, não há conflito entre a Resolução CVM 157 e o gatilho de que trata o CPC 42/IAS 29 (contabilidade em economia hiperinflacionária), pois a norma contábil internacional traz elementos como: não há taxa absoluta que se considere para o surgimento da hiperinflação; a necessidade de atualização monetária das demonstrações é uma questão de julgamento; a hiperinflação é indicada por uma série de métricas nas características do ambiente econômico do país.

O superintendente observou que há uma discussão recente sobre o CPC 42 de que ganhos ou perdas na posição monetária líquida devem ser incluídos no resultado e divulgados separadamente. Nesse sentido a Resolução CVM 157 manteve a essência da ICVM 191, para que esses ganhos e perdas pudessem ser apropriados nas contas de resultados a que se vinculam.

O debate ao final do webinar aprofundou o alerta aos gestores sobre o risco de se tomar decisão sem considerar a erosão dos ativos pelo efeito da inflação e derivar políticas a partir de uma base informacional distorcida. “Quantas empresas o país perdeu por que distribuíram lucros ou dividendos de forma incorreta? Quantas empresas quebraram porque as participações dos diretores foram altíssimas, a participação de investidores na forma de dividendos foi altíssima e ela foi se descapitalizando sem perceber?”, enfatizou Ariovaldo.

Alexandre Staffa, líder da Comissão de Controladoria e Contabilidade, resumiu o principal ponto para reflexão dos executivos: “Esse painel traz um alerta para os gestores: dá para fazer muita coisa dentro de casa, de forma gerencial, e melhorar a gestão da companhia, sem que se precise discutir obrigatoriamente a volta da correção monetária do balanço em lei. É a vontade do gestor, olhando para o negócio com essa atenção, o mais importante”.

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