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10 aprendizados para salvar empresas com Claudio Galeazzi

O maior especialista em reestruturação de empresas do País foi convidado pelo IBEF Jovem para conduzir sessão de mentoring, realizada neste mês.

Há cinco décadas atuando como executivo e consultor, Galeazzi foi responsável por trabalhos de transformação em organizações como BRF, Pão de Açúcar, Vulcabras, Lojas Americanas, Artex, Mococa, dentre outras, nas quais exerceu a função de CEO.

Aos 77 anos de idade, Galeazzi prepara um livro a ser lançado em breve pela Companhia das Letras. Na obra, o sócio-fundador da Galeazzi & Associados, hoje também conselheiro do BTG Pactual, contará como ajudou a salvar renomadas organizações da falência.

Confira alguns dos principais aprendizados compartilhados pelo mentor:

1) O “fim” não é necessariamente o fim
Galeazzi iniciou sua trajetória profissional aos 21 anos de idade, como vendedor em uma multinacional de produtos químicos. Em apenas dois anos, tornou-se diretor geral para o Brasil. “Eu era muito focado e ambicioso.”

Abriu sua primeira empresa, e os aprendizados da amarga experiência de entrar em falência, nos anos 1970, mudaram sua vida profissional. “Cresci muito rapidamente e literalmente quebrei. Fui concordatário em uma época extremamente difícil para isso.”

Participantes do mentoring com Claudio Galeazzi

Foram dois anos para levantar a concordata e sete anos para recuperar a credibilidade da empresa no mercado.

“Aprendi que o fim não é necessariamente o fim. Foi a melhor experiência que poderia ter como reestruturador. As lições foram muito válidas”, contou aos jovens.

2) Se cair, lute para levantar
“Após a quebra da minha empresa, fui contratado como vice-presidente da British Petroleum – e eles fazem uma pesquisa grande na seleção”, disse bem-humorado. “Depois me tornei presidente de várias outras grandes empresas.”

Depois da queda, observou Galeazzi, é preciso ter coragem para lutar e se reerguer. “Você vai ter crises em algum momento da vida. Enfrente-as e mantenha a postura ética para recuperar a credibilidade no momento posterior”, ensinou.

3) O sucesso do passado não garante o futuro
“Alguns donos de empresa vivem do sucesso do passado. Mas o sucesso do passado não garante o futuro se você não transformar a companhia”, alertou o mentor. “Querer manter o status quo de uma organização permanentemente é suicídio”.

Ele lembrou que da primeira lista de companhias publicada pela Fortune 500, em 1955, apenas 13 existiam em 2013. Talvez menos da metade estará viva daqui a uma década. “Vocês, executivos de finanças têm um papel fundamental na reversão de uma crise e devem estar preparados para ajudar a repensar a empresa”.

4) Às vezes é preciso abandonar o futuro para consolidar o presente
O lado positivo da reestruturação, observou Galeazzi, é que essa situação força a empresa a se repensar todos os dias. O reestruturador – ou transformador, como diz Galeazzi – precisa rever todos os processos e operações da organização.

“Para o executivo tradicional é difícil abandonar o futuro, fechar uma divisão ou unidade. Precisaremos disso mais para frente, pensa ele, e será difícil repor as pessoas e equipamentos. Mas numa crise o foco é salvar a empresa. Cortar despesas e vender ativos aumentam o caixa. E quando a organização sair da crise, deverá repensar essas áreas com um novo projeto”, destacou.

5) A culpa não é de quem demite
Jacques “THE KNIFE” Nasser, da Ford, e Al “CHAINSAW” Dunlap, da Sunbeam, são exemplos dos apelidos pouco simpáticos dedicados aos reestruturadores, em referência ao seu trabalho de cortes – seja de custos ou pessoas. Galeazzi, por exemplo, recebeu a alcunha de “Mãos de Tesoura”.

¨Alguns donos de empresa vivem do sucesso do passado. Mas o sucesso do passado não garante o futuro¨, alertou o mentor

“Peguei fama de ser uma pessoa implacável. Talvez eu tenha sido quem mais demitiu gente no Brasil. Dizem as contas que foram aproximadamente 30 mil”, afirmou Galeazzi. “Mas é doloroso fazer demissões. Agir de forma dura é apenas circunstância do trabalho: alguém tem que fazê-lo.”

A culpa não é do autor dos cortes, observou, mas de quem contratou mais do que deveria. “Muitas pessoas acham as demissões injustas. Mas qual é a justiça certa: salvar a empresa e preservar os empregos da maioria, ou manter todos, a empresa quebrar e todo mundo ir para a rua?”

6) Respeite as forças envolvidas
Questionado sobre sua primeira experiência com demissões, Galeazzi responde sem papas na língua: “Foi um desastre. Teve greve, deu no jornal… Mas depois aprendi que é preciso respeitar as forças envolvidas nesse processo, a relação com os sindicatos, e, especialmente, a imprensa”.

Dentre os casos emblemáticos contados por ele, está o da crise da Vulcabras, no qual foi preciso fechar 4.500 postos de trabalho e 12 unidades para salvar a empresa. “Conversamos com os sindicatos, explicamos a situação e negociamos um pacote generoso para os funcionários demitidos”, contou Galeazzi. “Você tem que ser transparente, mostrar a cara. Às vezes, os sindicatos estão mais bem preparados para sentar na mesa de negociação do que o dono ou executivo da companhia”.

7) Seja corajoso para defender um ponto de vista diferente da maioria
Muitas vezes responsável por propor medidas radicais para salvar as empresas, Galeazzi não se intimida na mesa de discussão. “Se você acredita naquela ação e fundamentou bem a sua crença, tenha coragem para defendê-la.”

Quando liderou a reestruturação do Pão de Açúcar, por exemplo, propôs que a organização cortasse pela metade R$ 1,4 bilhão de CAPEX para novas lojas – cuja maioria apresentava orçamento estourado e dobro do tempo de maturidade. Enfrentou resistências no Conselho, mas a medida ajudou a aumentar o caixa da empresa.

Outra dentre as várias brigas que comprou foi propor a elevação do nível de endividamento quando os juros ainda estavam baixos. Quando a crise de 2008 estourou, o GPA estava gordo de dinheiro. Quando Galeazzi assumiu como CEO, em 2007, a convite de Abílio Diniz, as ações do GPA estavam no patamar de R$ 36,00. Quando saiu, estavam em R$ 65,00. “Enéas (Pestana, ex-CEO) manteve a política de custos e elevou para R$ 120,00”.

Na reestruturação da BRF, onde atuou como CEO entre 2013 e 2014, enfrentou críticas por demitir 2 mil funcionários – entre os quais sete vice-presidentes e 40 diretores -, fechar fábricas e vender operações de frigoríficos e a área de lácteos. Fez uma grande transformação na área industrial. Quando entrou, as ações da empresa estavam em R$ 44,00, e quando saiu, estavam em R$ 65,00.

No BTG Pactual, onde é conselheiro, também enfrentou resistências por trazer uma visão de economia real divergente de profissionais do mercado financeiro. Ajudou o banco a superar a crise despontada após a prisão do executivo-chefe pela Operação Lava Jato.

Galeazzi: Líderes devem aprender a delegar para evitar a ¨Síndrome de Branca de Neve¨

A instituição fez um downsizing brutal, vendeu vários ativos, como o BSI, garantiu a liquidez para sobreviver a saques em massa e fuga de clientes, e fundou um comitê de compliance. “Hoje o banco está extremamente sólido, embora tenha diminuído de tamanho. Qualquer outro banco médio teria quebrado.”

“Fluxo de caixa é o grande segredo. Para todas as empresas e a vida particular de qualquer pessoa”, repetiu o mentor.

8) Escolha as pessoas certas
Questionado pelos jovens se teria o “dom” de reestruturar empresas, Galeazzi resumiu que se trata de suor – trabalhar muito – e contar com as pessoas certas.

“Se eu disser que entendia tudo de cada companhia onde fui CEO seria mentiroso. O dom é escolher as pessoas certas, conhecedoras da empresa e comprometidas com a transformação. Ninguém faz nada sozinho. O sucesso das reestruturações devo muito mais às pessoas que me ajudaram do que à minha capacidade de gestão.”

“Pessoas certas” não são necessariamente os gênios, alertou. Muitas delas, inclusive, estão no segundo escalão. “As pessoas certas conhecem o negócio, sabem o que precisa ser feito, têm carisma e liderança. São multiplicadoras e convencem outras das medidas necessárias. Busco gente comprometida, com propósito e ética”.

Galeazzi disse ter pavor dos “insubstituíveis”. “É aquele camarada em que ninguém pode tocar na empresa, porque tem a história da organização. Só que ele tem as informações e segura. E às vezes, ele é responsável por parte dos problemas. Não existe ninguém insubstituível. O insubstituível precisa ser substituído”.

9) Aprenda a arte de delegar
Outro conselho do mentor é “escutar”. “Em muitas reuniões, eu sou mudo. Levo o problema e fico quieto. Muitas vezes, entro certo de que sei a solução. E às vezes constato que estava errado e a equipe conseguiu encontrar uma bem melhor”.

Na visão de Galeazzi, o empresário Jorge Paulo Lemann está entre os mais brilhantes com os quais já trabalhou. Quando Galeazzi foi CEO das Lojas Americanas, na época em que havia sido comprada por Lemann, juntamente com Marcel Telles e Beto Sicupira, propôs eliminar as áreas de estoque, e trabalhar com reposição just in time, baseado em amplo estudo feito pela McKinsey.

“Apresentei o projeto para o Conselho, e o Jorge ficou mudou. Depois perguntou se eu tinha certeza. Eu disse que sim e eles me delegaram a missão. Implantei o projeto de uma vez, em todas as lojas. As vendas caíram em um primeiro momento, não me acovardei, e em 30 dias voltaram. Ficamos com quase 12 mil metros quadrados de área disponível, fora a economia de não ter mais estoque imobilizado.”

¨Ninguém faz nada sozinho. O sucesso das reestruturações devo muito às pessoas que me ajudaram¨

Para Galeazzi, a maioria das pessoas não sabe delegar. “Como definiu Júlio Ribeiro (publicitário), é a Síndrome da Branca de Neve. Tudo recai no líder e os liderados viram anões, em termos de potencial, pois ficam apenas no entorno. Delegar é uma arte difícil, mas necessária para não criar anões na empresa”.

10) Busque o equilíbrio e não tire o olho do caixa
“Se você tem ambição e quer crescer, se dedique, se mate de trabalhar, mas não esqueça de ter tempo para a família e para cuidar de si mesmo “, aconselhou Galeazzi.

“Na juventude, fui um fanático trabalhando – sábado, domingo e feriado. Perdi muitos momentos das vidas dos meus filhos, que hoje só lembro através das fotografias. Olho para trás e penso – sim, dava tempo para ter participado mais. Hoje aproveito o máximo da infância das minhas netas. Isso é um alerta para vocês que são jovens.”

Ao comentar suas perspectivas para o Brasil, Galeazzi disse ter dúvidas sobre a recuperação da economia real em curto prazo, especialmente com a atual situação política e escândalos de corrupção. “A reversão só deve começar mesmo no final de 2018. Mas tomara que eu esteja errado”, opinou.

“Se eu voltasse a ser presidente de empresa, a primeira coisa que eu faria é verificar se a empresa tem caixa. Depois, daria um jeito de fazer mais caixa. E aí engoliria a chave”, arrematou bem-humorado.

(Reportagem: Débora Soares / Fotos: Débora Soares e Raisa Soares)

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