Av. Pres Juscelino Kubitschek 1726, Cj. 151 São Paulo / Itaim bibi +55 11 3016-2121

O que o CFO tem a ver com a área jurídica da empresa?

Conforme levantamento realizado pelo FDJur – Fórum de Departamentos Jurídicos, que conta com mais de 300 associados, entre vice-presidentes e gerentes, boa parte das áreas jurídicas corporativas são diretamente subordinadas à diretoria financeira das organizações.

Diante desse fato, constata-se que muitos dos CFOs delegam totalmente a gestão da área jurídica, sob o argumento de que não detêm o conhecimento específico para gestão de uma área tão técnica. Dessa forma, muitos departamentos jurídicos têm uma equipe tecnicamente especializada, do ponto de vista jurídico, mas em muitos casos deixam a desejar do ponto de vista de gestão, seja no alinhamento estratégico, seja em retenção de talentos, ou mesmo em outros pontos fundamentais na gestão do dia a dia de um departamento.

Os profissionais do Direito possuem como uma de suas principais características a capacidade de adaptação. Para observar a veracidade dessa afirmação basta que uma nova lei ou orientação jurisprudencial sejam expedidas ou modificadas pelos órgãos competentes. O movimento pela procura da informação, do posicionamento doutrinário, de pareceres e instruções normativas será grande e poderá durar até um tempo razoável, mas logo a nova realidade se imporá e os profissionais da área jurídica, pelo menos em sua grande maioria, já terão assimilado as alterações, agindo conforme as novas coordenadas.

Todavia, nem sempre essa adaptabilidade ou versatilidade é encontrada nos mesmos profissionais quando reunidos em departamentos jurídicos, especialmente quando o tema não é estritamente ligado ao Direito, mas à gestão ou ao segmento empresarial como um todo.

O panorama empresarial que vem se descortinando tem a necessidade de um corpo jurídico diferente do que se tem atualmente. A antiga imagem de que o departamento jurídico ou o terceirizado não passam de um mal necessário, sendo dignos da acusação das demais áreas de atravancar os processos internos e externos, tendo sempre um “não” na ponta da língua, não pode mais subsistir nem encontrar base na realidade.

A importância dada ao jurídico na nova visão empresarial é cada vez mais evidente, devendo a área jurídica da empresa assumir um papel estratégico dentro do negócio, deixando de ser apenas um departamento de apoio.

Para assumir essa nova função, o CFO responsável, mesmo que indiretamente, da gestão dos serviços jurídicos, tem pela frente pelo menos dois grandes desafios: primeiro, mudar a mentalidade interna dos profissionais que compõem o jurídico a fim de extrair destes o melhor desempenho possível; já o segundo desafio seria o de modificar a imagem do jurídico dentro da corporação.

Do ponto de vista do gestor, para superar esse desafio, o uso de ferramentas não é só recomendável, é necessário. A realização, por exemplo, de integração de áreas é procedimento dos mais úteis.

Não é muito dizer que os operadores do Direito, especialmente os advogados, possuem uma resistência natural em se inteirarem das outras atividades desenvolvidas na empresa que não sejam jurídicas – como o marketing, a contabilidade, a gestão estratégica, a gestão de pessoas, etc. –, seja por preconceito ou por mera ignorância, ao não entenderem de que forma tais conhecimentos multidisciplinares poderão ajudá-los no dia a dia.

Por outro lado, o apego dos profissionais ao Direito, ou ainda pior, à rotina meramente jurídica (cumprimento de prazos, preenchimento de guias, audiências, etc.), gera uma perda de material humano bastante grande para a empresa, tendo em vista que tais profissionais possuem como característica a intelectualidade, e seu potencial poderia ser muito melhor explorado pela empresa.

Todavia, nenhuma ação parece mais necessária para remodelar a mentalidade do jurídico como a de estimular que seus profissionais interajam com os demais departamentos, fazendo-os entender que fazem parte de um todo.

O gestor, nesse caso, poderia fomentar pequenas explanações de alguns profissionais dos outros departamentos a fim de apresentar suas atividades, tornando possível a interação entre os setores.

Outra ferramenta seria a aplicação de avaliações de desempenho aos profissionais da área jurídica, por meio de índices de desempenho próprios para essa área. Essas informações darão ao CFO uma noção mais clara do desempenho de seu departamento jurídico, mesmo que este detenha apenas conhecimentos superficiais quanto à questão técnica jurídica.

Por se tratar de uma área com características próprias, os índices de desempenho da área jurídica poderão ser diferentes de índices aplicados a outras áreas, mas sem dúvida apontarão os pontos fortes e fracos da equipe responsável pelas questões legais da corporação.

Em alguns casos o jurídico não gera renda ou lucro, mas pode diminuir muito o percentual das perdas da organização, o que nem sempre é reconhecido pelos demais setores empresariais. Por isso mesmo é que a avaliação correta do desempenho pode ser tão útil: pode revelar um jurídico eficiente que, apesar de não atrair valores, poupa a empresa de desembolsá-los; ou pode revelar um jurídico gastador e ineficiente, sem capacidade ou interesse em evitar custos desnecessários.

Outro ponto interessante é a aplicação de ferramentas de gestão no contencioso de massa. A utilização de técnicas de O&M para lidar com o contencioso em uma empresa de abrangência nacional pode auxiliar em muito no desempenho do departamento. Poderão ser introduzidos meios de alcançar informações confiáveis sobre os processos, assim como melhorar o controle exercido sobre os escritórios terceirizados. Tais processos administrativos poderão otimizar o trabalho burocrático e evitar a perda de informações fundamentais à área financeira da empresa.

Muitas outras ferramentas de gestão poderiam ser implantadas, como controle de qualidade dos escritórios, planejamento financeiro e provisões, apoio da tecnologia no provisionamento de passivos, entre outras. Todavia, é importante verificar a real necessidade de cada caso, aplicando, assim, as ferramentas corretas.

Quanto ao segundo desafio – o de modificar a imagem do jurídico dentro da corporação –, que é interligado ao primeiro, só poderá ser vencido quando os profissionais do jurídico tiverem profundo conhecimento do negócio em que estão inseridos.

Entender a missão do cliente, sua visão de curto e longo prazo e suas maiores dificuldades podem tornar o jurídico mais útil, não apenas nos temas de sua área, mas em todos os setores da empresa, melhorando, por conseguinte, a imagem da área jurídica junto aos demais departamentos.

Para iniciar esse processo, as respostas a algumas perguntas devem estar claras na mente dos membros da área jurídica corporativa, por exemplo: Quais os objetivos da empresa? Como são feitos os produtos ou prestados seus serviços de nossa empresa? Quais são os maiores desafios da organização? Quais são seus maiores problemas? Que perfil de advogado a empresa procura? Que tipo de imagem gostaríamos de ter, junto aos nossos clientes internos?

É praticamente certo que as respostas, ou a busca por elas, gerarão uma reflexão positiva no sentido de que, como profissional, preciso participar mais da vida da empresa.

Com esse conhecimento a atuação do jurídico poderá ser mais preventiva que emergencial. O departamento jurídico poderia, por exemplo, auxiliar o departamento pessoal mapeando os principais riscos, auxiliando nas negociações com empresas de benefícios, corrigindo posturas impróprias e ilegais.

A mesma contribuição poderá ser dada à contabilidade, onde o jurídico poderia auxiliar na gestão patrimonial, elaborar pareceres, orientar as diversas áreas da empresas quanto à postura que deverão ser adotadas para a correta contabilização.

As possibilidades são inúmeras, mas para sua execução é indispensável, como já apontado, que o CFO apresente aos membros do jurídico um novo cenário e uma nova necessidade por parte da empresa.

Outro exemplo é o marketing empresarial. Por mais distantes que o marketing e o Direito possam parecer estar, é inegável que uma empresa pode gastar milhões de reais tentando melhorar sua imagem junto aos consumidores de seus produtos/serviços, mas pode fracassar em seu intento se for alvo de grande número de demandas nos órgãos de proteção ao consumidor ou até mesmo perante os tribunais. O jurídico pode ser determinante para diminuir o índice de insatisfação do consumidor, mapeando as deficiências e mitigando os riscos.

O mercado tem incentivado os profissionais do Direito a serem mais flexíveis, mais atuantes e mais interligados e, por enxergar seu potencial, as corporações têm investido no jurídico como nunca. Em recente pesquisa realizada pela consultoria Hay Group, a média salarial dos gestores jurídicos aumentou 113%, percentual maior do que o aumento dos diretores de recursos humanos (92%), marketing (88%) e finanças (85%).

Vale a pena direcionar o jurídico para alcançar esses novos horizontes. A transição poderá ser difícil, mas seu resultado certamente trará benefícios a todos, inclusive aos próprios profissionais.

Compartilhe: