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Tributos: Especialistas debatem desdobramentos da decisão do STF sobre a exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS

Em reunião técnica, membros da Comissão de Tributos do IBEF-SP debateram os desdobramentos, preocupações e incertezas das empresas após a conclusão do julgamento da “tese do século” pela Suprema Corte. 

A Comissão de Tributos do IBEF-SP tratou sobre os “Desdobramentos do julgamento do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS” em sua reunião técnica, realizada em 31 de agosto. Participaram do debate a líder da Comissão, Gersoni Munhoz, Managing Director da Goldman Sachs; Valdirene Lopes Franhani, especialista em direito tributário e sócia-fundadora na Lopes Franhani Advogados; Adriano Correia, Assurance Clients & Markets Leader na PwC Brasil; Liliane Guerreiro, membro do Comitê de Controladoria e Contabi’lidade e do Comitê Tributário do IBEF-SP; Mariana Carneiro, PwC Tax Partner; Marcelo Roncaglia, sócio na Pinheiro Neto Advogados;  Fernanda Ramos Pazello, advogada da área tributária na Pinheiro Neto Advogados; e Meily Franco, vice-presidente de Comissões Técnicas do IBEF-SP e Tax Director Latam na Alstom. 

“Tese do século” – Mariana Carneiro contextualizou a importância do julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS para as empresas, além das atuais interpretações e movimentos a respeito do tema. O STF concluiu, em 13 de maio deste ano, o julgamento dos embargos de declaração opostos pela União Federal no RE 574.706 (tema 69 da repercussão geral) que tramitava desde 2007, e no qual havia sido fixada, em março de 2017, a tese de que o ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. O caso ficou conhecido no direito tributário como a “tese do século”, em razão de seu possível impacto bilionário para os cofres públicos. 

O STF decidiu que a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS passa a valer a partir de 15/3/2017. Contudo, os posteriores posicionamentos da Coordenação Geral da Tributação da Receita Federal do Brasil – pareceres Cosit nº 13/2018 e nº 10/2021 – frente à consulta formal sobre a interpretação da legislação tributária são impasses que a Receita traz para a temática, trazendo mora às empresas que deverão aguardar posicionamento definitivo sobre aa ‘decisão do século’. “O grande ponto de ter que aguardar é que se tem uma questão contábil envolvida, pois temos uma decisão de mérito – que o ICMS não está na base de cálculo do PIS e da COFINS –, mas um parecer Cosit colocando um ponto de dúvida”, ressaltou Mariana. 

Desdobramentos – Em 13 de maio de 2021, em julgamento de embargos de declaração com repercussão geral, o Plenário do Supremo decidiu que o ICMS – destacado em nota fiscal – não compõe a base de cálculo do PIS e da COFINS, sendo a decisão válida a partir de 15 de março do mesmo ano, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que foi proferido o julgamento, ou seja, 15 de março de 2017.  

Destaca-se que – antes da referida decisão da Corte – o tratamento contábil adotado para cada empresa dependia de uma análise da situação. Porém, com a recente decisão, foram esclarecidas as principais dúvidas que permaneciam em aberto desde 15 de março de 2017, tais como o período de direito ao crédito, assim como a base de cálculo dos valores. 

Mariana Carneiro então destacou que em 26 de julho de 2021 o IBRACON divulgou a  circular nº 07/2021 com o objetivo de esclarecer os principais procedimentos contábeis a serem avaliados pelos auditores em decorrência da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS. Entre os pontos ressaltados estão: 

1) Entidades que não possuem ação judicial, nem pedidos administrativos: têm o direito de excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS a partir da data do julgamento do STF (caso não o tenham feito a partir de 15 de março de 2017) e de realizar a compensação ou pleitear o ressarcimento dos valores pagos a maior a partir de 15 de março de 2017.  

2) Entidades que possuem pedidos administrativos e ações judiciais iniciadas após 15 de março de 2017 têm o direito de excluir o ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS a partir da data do julgamento do STF e pleitear a compensação ou o ressarcimento dos valores pagos a maior a partir de 15 de março de 2017, com o trânsito em julgado.  

3) Entidades que possuem pedidos administrativos e ações judiciais iniciadas antes de 15 de março de 2017 e que não tiveram o trânsito em julgado: têm o direito de excluir o ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS a partir da data do julgamento do STF e aguardam o trânsito em julgado de seu processo de forma consistente com a decisão do STF de maio de 2021, para iniciar os procedimentos para pleitear a compensação ou o ressarcimento dos valores pagos a maior, no período de abrangência de seu processo.  

4) Entidades que possuem pedidos administrativos e ações judiciais e que já tiveram o trânsito em julgado para excluir o ICMS das bases de cálculo do PIS e da COFINS: devem avaliar se os esclarecimentos relacionados à determinação da mensuração com base no ICMS destacado resultam em uma nova estimativa dos valores aos quais obtiveram o direito. 

5) O entendimento técnico referente ao tratamento contábil a ser dispensado à matéria deve ser avaliado por administradores das entidades, acompanhado de seus auditores independentes, à luz do que prescreve o CPC 25 – Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes. 

6) Com a decisão do STF com repercussão geral, em muitas circunstâncias, a compensação ou o ressarcimento dos valores pagos a maior, referentes aos créditos tributários mencionados, é uma questão temporal, mesmo nos casos em que as entidades aguardam o trânsito em julgado de seu processo individual, uma vez que a matéria já está definida, o que torna sua realização praticamente certa, à luz do parágrafo 33 do CPC 25. 

7) Nesse sentido, se for praticamente certo que ocorrerá uma entrada de benefícios econômicos, o ativo e o correspondente ganho devem ser reconhecidos no período em que ocorrer a mudança de estimativa e eventuais provisões reconhecidas devem ser revertidas, desde que observado o que prescreve o parágrafo 59 do CPC 25. 

Documentação – Liliane Guerreiro afirmou que uma das preocupações do mercado diz respeito ao levantamento interno das informações, dos documentos para conseguir entrar com a habilitação do crédito. “Temos uma regra interna que não nos permite descartar nenhum documento e precisamos levantar a documentação necessária a partir de 1991, data limite que podemos requerer os créditos que nos competem.”

Para “Valdirene Franhani, o temor quanto ao novo cálculo exigido com base na Solução de Consulta 10 não pode impedir ouretardar o exercício do direito da empresa de pleitear o seu crédito integral, sob pena da empresa perder seu direito pela prescrição. Ela lembrou que o prazo para habilitação ou execução da decisão é de 5 anos após o trânsito em julgado.”   

Fernanda Ramos disse que como advogada também tem sido envolvida pelas empresas nas tomadas de decisões com relação ao aproveitamento do crédito. “Nos casos em que a empresa está em dúvida com relação à documentação, se existe alguma mínima confiança em relação aos documentos, se as empresas de auditoria ao analisar a situação conseguem fazer uma conciliação das obrigações acessórias – ainda que não tenha, por exemplo, notas fiscais –, é possível defender a posição da empresa caso a Receita Federal faça algum tipo de questionamento, desde que obviamente exista esse trabalho em conjunto com as auditorias”, frisou. 

Para Valdirene Franhani, a Solução de Consulta 10 vai além do que foi decidido pelo STF, porém não há dúvida de que ela poderá ser utilizada pela RFB para dificultar ou postergar o reconhecimento de créditos habilitados, não homolando por exemplo, compensações que já tenham sido efetuadas, ou, ainda, exigindo documentação além da tese discutida. Para ela tal postura da RFB poderá ser discutida pela empresa, inclusive, levada ao CARF ou, ainda, ao Judiciário, em face dos limites do administrativo que analisa a habilitação e homologação do crédito, o que não pode ir além da decisão transitada em julgado.

Problema comercial – Luis Scallet relatou que na indústria farmacêutica as empresas têm se deparado com um problema comercial vinculado à questão do ICMS. Apesar dos preços nesse setor serem publicados, alguns clientes – grandes redes e distribuidores – estão pedindo desconto. Algumas empresas do setor estão efetuando o cálculo dos indébitos, mas ainda não mudaram os processos internos, pois aguardam o pronunciamento da própria CMED – Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos.  “Não é possível simplesmente mudar o preço praticado, do contrário há risco de autuação. Enfrenta-se, assim, um grande impasse pois a maioria dos clientes está pressionando para passar a receber os produtos com desconto”, relatou.  

Adriano Correia destacou que tem visto, de fato, aumentar a frequência de discussões comerciais sobre o preço, com empresas buscando obter algum benefício comercial atrelado à questão do crédito e da exclusão do ICMS na base de cálculo de PIS/COFINS. Todavia, ressaltou que “nesse momento é importante analisar os contratos e como o preço era formado. Em muitos casos, o contrato define que o preço é líquido de impostos e algumas empresas buscam mesmo assim a redução desse preço, o que é algo totalmente sem sentido”.  

A única possibilidade de revisão de preços possível, segundo Meily Franco, são os contratos que possuem uma cláusula de eficiência tributária que prevê a repartição – em forma de benefício financeiro – de qualquer benefício tributário posterior à assinatura do contrato. À parte essa situação, “é descabido algum cliente pedir desconto. É como se a empresa rasgasse o contrato que firmou”, pontuou. 

“Depois da decisão do Supremo, a questão se tornará uma briga comercial muito forte a partir de agora”, complementou Mariana

Divulgação e mercado – Sobre a mensuração do crédito, Adriano Correia disse acreditar que a grande preocupação do regulador é que não exista uma postergação do registro contábil quando a empresa já conhece ou tem alguma segurança sobre o valor que terá de benefício. Se não tiver essa segurança, a norma contábil ampara em não reconhecer algo inseguro.  

Trata-se, portanto, de um assunto que precisa ser avaliado com extrema cautela. Segundo Correia, seria ruim, aos olhos do mercado, reconhecer um crédito para posteriormente estorná-lo ou ajustá-lo. “Especialmente no caso das companhias abertas, é super relevante a divulgação adequada desse assunto, o porquê de eventualmente não estar sendo contabilizado algum valor e justificar quais são os impedimentos ou dificuldades. Na visão da CVM, não ter um número pode implicar uma deficiência significativa de controles internos.  Essa divulgação é importante para que o regulador e o mercado saibam que está sendo feito um trabalho para estimar o valor e contabilizá-lo assim que for possível”, alertou. 

Decisões favoráveis ao contribuinte – Mariana apresentou três processos nos quais a decisão judicial foi favorável ao contribuinte, a última muito recente – semana passada – relacionada a empresa Pfizer. 

Marcelo Roncaglia afirmou que o caso Pfizer foi muito interessante e relatou os passos e entendimentos levantados. Trata-se de um mandado de segurança ajuizado pouco antes do julgamento de 2017.  O argumento da ação é a tese padrão de que não se inclui ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS. Na sentença – que foi parcialmente favorável – o juiz de ofício afirmou que o contribuinte teria razão em não incluir o ICMS na base do PIS/COFINS. Entretanto, baseando-se no princípio da não cumulatividade do PIS/COFINS, ele entendeu que o contribuinte tem de excluir o crédito na entrada sob pena de ter enriquecimento sem causa.  

“O tribunal acolheu nossos argumentos e entendeu que uma coisa é a exclusão do ICMS na saída, baseado no conceito de faturamento que foi interpretado pelo Supremo sem o ICMS, outra coisa é o direito a créditos que se baseia no custo de aquisição das mercadorias, pois as regras não se comunicam e são absolutamente independentes.  Esse é o motivo de se ter mantido o direito a crédito full. A Fazenda entrou com embargos de declaração – específico sobre esse ponto do crédito – que foram rejeitados no acórdão da semana passada. A Fazenda já apresentou recurso especial, ou seja, esse caso pode chegar ao STJ, ao Supremo. Vamos ver quais serão os próximos capítulos desse caso, que tem chance de ser um leading case”, elucidou Roncaglia. 

Para Valdirene Franhani, “embora tenhamos aí um novo leading case para tratar da constitucionalidade da Solução de Consulta 10 (caso Pfizer), exceto nos processos emq eu esta SC foi prequestionada, trata-se de novo expediente que não pode contaminar a tese definida pela STF (tema 69), sobretudo para os processos que já possuem trânsito em julgado. Eventual cobrança ou questionamento sobre o crédito somente poderia atingir os últimos cinco anos com base em lançamento específico.

Próximas reuniões – A líder do colegiado, Gersoni Munhoz, destacou que a próxima reunião da Comissão de Tributos será realizada muito em breve, dia 8 de setembro, abordando assuntos interessantes dentro dos pilares do IBEF-SP e de relevo para os CFOs e demais profissionais do ecossistema de finanças.  

Para os próximos eventos estão no radar da Comissão os seguintes temas:  tax transformation e seus principais elementos da inovação e seus impactos na indústria, decisões recentes do STF, planejamento tributário e blindagem patrimonial, administração de dívidas tributárias e ASG com uma visão tributária. Enfim, Gersoni destacou que o ICMS ainda pode ser tema de discussões da Comissão, além do da nova questão do ISS como base de PIS/COFINS, uma das “teses filhotes” do julgamento do STF. 

O vídeo da live, com todos os assuntos abordados e as discussões técnicas, ficará disponível para acesso exclusivo dos associados do IBEF-SP.    

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